SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

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sexta-feira, 25 de maio de 2012

ESTÓRIAS DOS QUATRO VENTOS: ALI O SILÊNCIO, ALI A SOLIDÃO... (30)


                                                           Rangel Alves da Costa*


Assim que se preparou pra deitar começou a lembrar de algo que agora era verdadeiro tormento. Não podia ter feito isso de jeito nenhum. Sabia que não tinha ido lá apenas para saber sobre a venda.
Saiu disposta também a ter notícias sobre o menino e saber se os seus pais ainda estavam à sua procura ou se já tinham seguido estrada. Verdade é que no nervosismo com a situação inesperadamente criada, acabou esquecendo.
Amarrou um laço de fita vermelha no dedo que era pra não esquecer assim que o homem chegasse ali com suas compras. Demorou a dormir, e muito mais demoradamente ainda chegou o sonho, parecendo que vinha andando lentamente.
Era sonho mesmo vagaroso, igual a vento preguiçoso. Ela estava no imenso campo florido, toda contente e cheia de alegria, dançando, cantarolando, erguendo as mãos para o alto, quando repentinamente a noite chegou.
Mas não era noite feia não. Era bonita, com luar imenso e céu estrelado. E olhando para o alto viu uma estrelinha se aproximar e dizer bem pertinho do seu ouvido que se olhasse bem muitas estrelas mudam de lugar, correndo feito raios, e indo procurar os seus amores em outras distâncias, pois estrelas também amam e sentem solidão.
E que ela, se quisesse, poderia se sentir também como uma estrela, a mais brilhante e radiante. Bela era já era, bastava querer voar para onde quisesse e na hora que desejasse. E o que dizia não servia apenas para buscar o amor de sua vida, mas também para encontrar outras situações desejadas no viver.
Acordou com uma estrela no coração, encantada com o sonho. Assim que levantou fez as orações ao pé do oratório e em seguida foi até o quintal passar o olho por cima do lugar onde o dinheiro estava enterrado. Vendo que tudo estava normal, foi pra porta da frente e abriu os braços para o abraço na manhã.
Não percebeu nada estranho nem diferente ao redor. Foi até o carro de bois e não viu qualquer sinal que alguém estivesse passado a noite ali debaixo. Caminhou mais adiante e depois retornou. Ficaria sem tomar nada naquela manhã porque não havia mais uma só colher de pó de café na cozinha.
Varreu a casa, tirou a poeira juntada por todo lugar e depois foi catar água para tomar um banho de cuia. Quase não encontra nada, apenas um restinho amarelado lá no fundo da cisterna. Teria que pedir outro favor ao homem, que era providenciar um carregamento de água. Cobravam caro demais, mas não tinha outro jeito a dar.
E não demorou muito pra uma voz gritar na malhada da casa. Pelo som, Crisosta logo conheceu que era o homem com suas compras. Chegando já àquela hora era sinal que havia ido à feira da cidade logo cedinho.
“Umas coisas fui comprar ontem mesmo, mas outras, como carne e verdura, achei melhor deixar para comprar assim que a feira começasse, pois mais fresquinhas e a gente pode escolher com maior vagar. Está tudo aqui e ainda acrescentei alguma coisa que achei que a moça ia precisar”.
Disse o homem enquanto entregava o troco. Crisosta agradeceu pela ajuda e em seguida perguntou a quem poderia encomendar uma carrada de água. O homem disse que se ela quisesse ainda naquele dia falaria com um alguém que transportava água para vender. E então ficou acertado assim.
Mas antes que ele botasse o pé do retorno, ela olhou pra fita amarrada no dedo e perguntou o que tinha de perguntar sobre o menino e seus pais. O homem então começou a dizer tudo o que sabia, com aspecto entristecido:
“Coisa mais estranha aconteceu, dona moça. O pai dele procurou tanto que achou que se encontrasse até ia matar o bichinho de tanta raiva que tava. Entrava no mato gritando e com arreio de couro cru na mão. Acho que se ele não fosse com tanta violência, até que o menino ia retornar. Mas daquele jeito que tava só espantava. Menino algum vai voltar pra casa sabendo que vai sofrer muito. Mas não conseguiu encontrar ele não...”.
“Então, será que a família vai viajar deixando o menino assim à toa, jogado ninguém sabe onde?”. Perguntou Crisosta, ao que ouviu como resposta.
“Mas a família já pegou o pau de arara e foi embora, moça. Se o menino ainda tiver por aqui pode ter certeza que é cão sem dono”.
Continua...



Poeta e cronista
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