Rangel Alves da Costa*
Não há dúvida no acerto de Terêncio, dramaturgo e poeta romano, ao sentenciar: “O mais próximo de mim sou eu”. E até acrescentaria: “No meu ser sou tudo, e mais ainda se me reconheço e sou o que quero ser”.
E por diversos motivos e vastas razões. É a própria pessoa que tem de se autorreconhecer, gostar de si mesma, compreender seus erros e virtudes. Não é outro senão o próprio ser que deve desejar o melhor para si. Não é sem razão que se diz que primeiro amar a si mesmo para depois conhecer a realidade.
Cabe ao indivíduo refletir sobre o que é, o que sente e como poderia ser, para depois se situar no mundo. Ele é quem primeiro conhece os anseios e as necessidades, é quem instantaneamente sente a tristeza e a alegria, é quem, estando em si mesmo, abre os olhos para enxergar adiante.
O espelho apenas reflete o indivíduo. Contudo, ali não estará refletido o íntimo, o âmago, o sentimento. Reflete uma feição disposta e jovial porque o indivíduo assim se permitiu, um rosto brilhante e alegre porque internamente assim se constata, uma feição triste e rancorosa porque assim a pessoa quis.
Por isso é essencial conhecer-se a si mesmo, como bem consta do Oráculo de Delfos: “Conhece-te a ti mesmo”. A mesma inscrição que foi tomada pelo filósofo Sócrates com base para toda sua construção filosófica. O que, em síntese, quer significar que o indivíduo, sem pressupor egoísmos, deve valorizar a si mesmo acima de tudo. O que somente é possível se conhecendo íntima e interiormente.
O indivíduo que conhece a si mesmo logo perceberá que é ele próprio o seu maior amigo, em quem deve sempre confiar, quem estará ouvindo e respondendo a todo instante que precise dialogar sobre a realidade. Ora, se há conhecimento de si mesmo também haverá ciência das possibilidades e dos limites, evitando tantos erros cometidos por querer ir além do que é capaz prosseguir.
Conhecendo a si mesmo, será também muito mais fácil de conhecer o outro. Quem se conhece enxerga no outro aquilo que não quer ser e, por consequência, evita espelhar-se em determinadas atitudes e ações. Basta sentir no outro aquilo que não lhe fará para se ter uma resposta do quanto procura preservar-se das influências negativas.
Conhecendo a si mesmo verá o quanto está presente consigo mesmo em cada situação da vida. Dessa importância que se proclama, dessa amizade que intimamente se permite, desse amor que convive em paixão, nascerá o ser que não planta e cultiva para o outro nem para satisfazer o mundo, mas para si mesmo e o seu bem-estar.
E haverá de ser assim porque inevitavelmente o ser humano se depara com a realidade dizendo que “O homem é o lobo do homem”, na amarga expressão hobbesiana, buscada em Plauto tal assertiva. Porque nunca se sabe ao certo do que esperar do próximo, vez que o amigo de agora mora ao lado do inimigo presente, é que o indivíduo deve crer acima de tudo que ele mesmo deve ser o seu próprio amigo de sempre.
Muitas vezes se torna doloroso demais, mas não raro a pessoa se amargurar profundamente porque se viu traída, desconsiderada ou simplesmente irreconhecida por outra em que tanto confiava. Quando mais precisa mais se vê sem apoio, quanto mais deseja mais lhe é negado, quanto mais busca um favor no amigo mais se sente renegada. E mais doloroso ainda se confiou demais sem ouvir a voz da própria razão, pedindo sempre para não confiar demais.
Porque não se deve confiar demais – e muitas vezes nunca confiar – no outro, é que o indivíduo deve sempre buscar auto-valorização para não ser surpreendido quando mais precisa e sentir-se capaz de enfrentar e vencer, sem implorar por ninguém, os desafios da vida.
E depois será a si mesmo que agradecerá. E não haverá reconhecimento mais justo, pois como diria Rudyard Kipling, no poema “Se”: “Tua é a Terra e tudo o que nela existe e mais ainda, tu serás um Homem, meu filho!”.
Poeta e cronista
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