SERTÃO - A TERRA PROMETIDA
Rangel Alves da Costa*
A saga da civilização sertaneja, com seus inúmeros sacrifícios em meio a um mundo hostil e praticamente desconhecido, tem muito do relato bíblico do povo israelita em busca da terra prometida. Como o Senhor dizendo a qualquer Josué sertanejo, o desbravador daqueles longínquos tempos, “levanta-te e passa o Jordão, tu e todo o povo contigo, entra na terra que eu darei aos filhos de Israel. Todo lugar onde pisar a planta do vosso pé, eu vo-lo darei, como disse a Moisés”.
Josué, o conquistador bíblico, aquele que conduziria o povo de Israel à terra prometida, naquele mundão sertanejo se transformara no Josué caboclo, atrevido, também valente e lutador, e do mesmo modo conquistador vestido de sonhos, ornado de sol e de lua, levando a foice e o facão na mão para abrir veredas, tendo no alforje tudo que precisava para formar a nação sertaneja, fazer erguer a terra sertaneja prometida.
E quando é ordenado que o conquistador atravesse o Rio Jordão, ali se enxerga o São Francisco com suas águas servindo como verdadeiros caminhos na procissão de pessoas tomando o seu norte, fugindo das rebeliões e revoltas coloniais, em busca de um novo mundo, trazendo consigo seus animais e deixando para trás tudo aquilo que somente seria buscado quando a terra fosse conquistada, erguida a moradia e estabelecida de vez a nova realidade.
Está escrito em Gênesis 12: 1,3: “Ora, o Senhor disse a Abrão: Sai-te da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai, para a terra que eu te mostrarei. E far-te-ei uma grande nação, e abençoar-te-ei e engrandecerei o teu nome; e tu serás uma bênção. E abençoarei os que te abençoarem, e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; e em ti serão benditas todas as famílias da terra”.
E no Livro de Josué 21: 43,45: “Desta maneira deu o Senhor a Israel toda a terra que jurara dar a seus pais; e a possuíram e habitaram nela. E o Senhor lhes deu repouso de todos os lados, conforme a tudo quanto jurara a seus pais; e nenhum de todos os seus inimigos pode resisti-los; todos os seus inimigos o Senhor entregou-lhes nas mãos. Palavra alguma falhou de todas as boas coisas que o Senhor falou à casa de Israel; tudo se cumpriu”.
Assim foi feito também com relação ao sertão. A força divina na sua sabedoria, num dado momento tornou difícil a vida do homem no seu arraial, na povoação colonial onde era submetido pelas forças insurgentes ou quase escravizado pelas forças reinantes, e fez com com que saísse daquele lugar rumo a novos horizontes, novos caminhos onde pudesse se estabelecer futuramente com a família.
E foi assim porque o Senhor disse sai desse lugar que lhe aflige e maltrata, amedronta sua paz e a tranquilidade dos seus, põe em risco tudo que possuis e tende a arruiná-lo completamente. E como naqueles tempos coloniais as estradas eram quase inexistentes e não levavam além de poucos quilômetros, ele colocou a imagem caudalosa do rio em frente do seu olhar e disse que colocasse nas embarcações as criações que possuía e seguisse adiante.
E eis que o Velho Chico, o Jordão daquelas distâncias áridas e desoladas nordestinas, mais tarde chamado também de Rio dos Currais porque acolheu nas suas margens aquele viajante e o seu rebanho, foi o caminho mostrado para que, aos poucos, ao sabor de tantas lutas e privações, fossem sendo erguidos os pilares da terra prometida e mais tarde uma grande nação, a imensa nação sertaneja.
E o sertão prometido por Deus aos seus filhos foi se desenvolvendo na mesma medida que o homem tinha vontade de construir para si. As tantas dificuldades existentes para se formar uma grande nação não estavam também esquecidas na profecia. A desolação, a luta do homem contra a natureza bravia, as persisitentes negativas do meio em fornecer água para matar a sede, para molhar a terra e nela ver semeada a sobrevivência, tudo isso já estava previsto para esse novo homem, o homem sertanejo.
Mas por que doar tanto e nessa doação impor tantas dificulades e sofrimentos? Eis que o homem sertanejo também nasceu outro homem, adequado à sua terra, com sua mesma feição. Se fosse diferente, se tudo fosse fácil demais de se conquistar, aquelas vastidões se perderiam no seu destino e o homem e o seu mundo não seriam tão sertão.
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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