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segunda-feira, 19 de setembro de 2011

OS SEGREDOS E SOFRIMENTOS DE L. H. (Crônica)

OS SEGREDOS E SOFRIMENTOS DE L. H.

                                    Rangel Alves da Costa*


Viver na corda das imposições sociais não é nada fácil. L. H. sabia muito bem disso. Não era difícil perceber que a sociedade cobra demais dos outros, quer monitorar as atitudes e ações do próximo, mas ela mesma permanecendo na cegueira proposital, pois não era outra que vivia corrompida sem querer aceitar, totalmente desmoralizada sem querer acreditar.
O pior é que ser contra os ditames da sociedade da época é logo merecer a pecha de antiga, conservadora, ultrapassada. Seguir os modismos, mesmo que absurdos e aflitivos, é estar na crista da onda, viver o seu tempo, ser pra frente. Mas todo mundo tem que ser assim para viver, meu Deus? Esta indagação dolorosa não saía da cabeça de L. H. E mais, pois, sempre se perguntando: Será que temos sempre que estar mentindo sobre o que somos para sermos aceitos perante os outros?
Diante de tais aspectos e circunstâncias é que L. H. procurava sobreviver como podia, porém sofrendo, sempre angustiada, muitas vezes verdadeiramente sem saber o que fazer. O problema é que para continuar existindo socialmente ela tinha que estar mentindo, mostrando aquilo que não era e que não gostava. Muitas vezes tendo que pactuar com coisas que não admitia de jeito nenhum.
L. H., moça bonita, no êxtase da juventude, tão bela quanto a janela que se abre para o jardim, vivia entre dois mundos que se contradiziam: o mundo do seu íntimo, do seu desejo e da sua percepção, e o mundo dos outros, como os outros quisessem, como os outros achavam que tudo deveria ser. Essa situação era tão dolorosa que pensava que iria enlouquecer qualquer dia, pular do penhasco e dizer que aquele mundo nojento a acolhesse como quisesse.
Mas por que acontecia tudo isso com L. H., vez que bonita, inteligente, saudável e com as melhores perspectivas de vida? Simplesmente pelo fato de ser diferente das outras meninas de sua idade, possuir um pensamento muito mais responsável do que as outras de sua idade, não admitir tantos erros e ações absurdas cometidos com a desculpa da idade. Contudo, o que mais lhe angustiava era conhecer suficientemente bem os limites desses dois lados: o lado que se quer ser e o lado que se tem de ser.
Ora, o mundo de L. H., aquele em que se firmava com consciência e paixão, era o mundo desacreditado e até criticado pela maioria das pessoas, inclusive as mais velhas e com maior experiência de vida. E, usando um termo imperfeito para ilustrar, não era um mundo do outro mundo. Mas, como já dito, apenas um mundo onde ainda havia lugar para os sentimentos, para o enternecimento com as coisas belas da vida, para o agradecimento por tantas dádivas divinas, para a alegria e o prazer ao encontrar coisas simples e significativas.
Para muitos seria um enorme absurdo que uma mocinha naquela idade fizesse isso, mas L. H. gostava de passear pelos campos ao alvorecer, ler diariamente sua Bíblia e conversar com Deus, os santos e os anjos, assistir missas, brincar com os passarinhos e com a criançada, pular corda e cantar cantiga de roda, ouvir as lições dos mais velhos, visitar e procurar dar conforto aos enfermos que conhecia, respeitar as pessoas e principalmente a vida.
Porém, aquilo que certamente mereceria mais crítica era o fato de não ter namorado, não andar pelos cantos aos beijos e abraços com um e outro, não gostar de viver nas noitadas e baladas, batendo ponto pelas passarelas dos shoppings, não usar qualquer tipo de droga, estar sempre e irreconhecivelmente enfeitada. Aliás, uma sandália de dedo lhe bastava, uma roupa simples lhe vestia, uma flor no cabelo lhe enfeitava.   
Se quem estivesse de fora e ouvisse falar dessa angústia de L. H. logo daria explicações acabadas e proporiam soluções imediatas. E diria sem titubear que ou a moça mudava para acompanhar o seu tempo ou acabava uma solteirona de janela amaldiçoando a sorte amorosa dos outros. Mas nada disso abalaria L. H. Quer dizer, nada mais abalaria do que ter de deixar bem claro aos outros qual a sua única e verdadeira opção de vida.
E o que fez deixou bem claro o seu caráter. Não mudou um dedinho assim do que sentia, agia ou pensava, apenas resolveu não fazer mais nada disso sozinha, para si mesma, de forma intimista. Começou a mostrar abertamente o que pensava da vida e logo foram forçados a reconhecer que era possível ser uma linda mocinha sem ser absorvida pelos pecados mundanos.



Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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