SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



quarta-feira, 7 de setembro de 2011

O MAIS PERIGOSO DO MUNDO (Crônica)

O MAIS PERIGOSO DO MUNDO

                                 Rangel Alves da Costa*


O cabra não pensava noutra coisa senão em saber a opinião dos outros sobre quem era a pessoa mais perigosa do mundo. Ele mesmo já havia chegado a uma conclusão desde muito tempo e depois de muito pensar, sopesar e enfim concluir que estava com a razão.
Sabia quem era a pessoa mais perigosa do mundo, mas ainda assim queria ouvir mais e mais pessoas para ver se realmente estava com a razão. Pelo que havia concluído, não havia como a sua escolhida não ser reconhecida também pelos outros, vez que tinha provas suficientes da periculosidade extrema do indivíduo.
O problema é que quanto mais perguntava mais obtinha respostas diferentes daquelas que queria ouvir. Nenhum pé de pessoa apontava o seu escolhido como o mais perigoso, nem passava por perto, e o pior é que até parecia que ninguém lembrava da existência desse tipo de pessoa tão ameaçadora e verdadeiramente exterminadora.
Perguntou ao padeiro e este disse ter a certeza que a pessoa mais perigosa do mundo era o juiz de direito, pois numa canetada só podia acabar de vez com a vida de qualquer um, mandando apodrecer numa prisão, ainda que reconhecidamente inocente.
Indagou ao carteiro e este respondeu que o perigo em pessoa chamava-se Tonho Cabreúva, um matador de aluguel que já havia tocaiado mais de vinte e que não errava um tiro sequer, bem no meio dos olhos que era pra não deixar dúvidas de ter feito o serviço bem feito. E mais perigoso ainda porque acabava com a vida de qualquer por ninharia, por coisa de dois contos de réis.
Quis saber do professor e desse ouviu que a pessoa mais perigosa do mundo era o homem consigo mesmo, pois se fazia inimigo da própria vida quando procurava fazer tudo que não prestava, mesmo sabendo que aquilo lhe traria graves consequencias e colocaria em risco a própria vida. Daí que os outros inimigos podem ser evitados e combatidos, mas ele próprio não consegue se domar e se precaver dos próprios atos e atitudes.
Perguntou ao jardineiro e este respondeu que não havia gente mais perigosa no mundo do que o coronel Adolfinho. E justificou dizendo que não podia ter gente mais perigosa do que um ricaço que vivia cercado de pistoleiro, de jagunçada e gente da pior espécie, e que não aceitava um não de ninguém, não aceitava desfeita de nada, já havia mandado dar fim a todos os inimigos da mesma estirpe e até a família tratava na base do medo, do grito e da pancadaria.
Quis saber a opinião do velho sacerdote e este, após se benzer mais de dez vezes, disse que o verdadeiro imprestável que vivia nas sombras querendo destruir todo mundo, todos os lares e todas famílias era o coisa ruim. Esse coisa ruim, dizia ele, é quem está por traz de toda desgraça, de toda violência, de tudo ruim que há no mundo. E o pior é que age tomando os espíritos fracos e através deles se emana por toda a sociedade de modo aterrorizante.
O aluno disse que o mais perigoso do mundo era o professor de matemática; o líder da oposição afirmou quase num discurso que o mais perigoso, cruel e até assassino de pessoas pobres era o atual prefeito; o doente não titubeou em dizer que o médico que iria lhe operar na próxima semana tinha fama de ser perigoso demais; a mãe preocupada disse quase chorando do perigo que o filho mais velho representava; já o ajudante nem pensou duas vezes para dizer que ninguém era tão perigoso quanto o dono da mercearia, pois se a pessoa não abrisse o olho pagava por aquilo que nunca comprou.
Tantas e tão diversificadas respostas, porém nenhuma agradava o homem, vez que tinha certeza que a razão estava com ele ao achar que a pessoa mais perigosa do mundo era o barbeiro, e não só pela navalha bem afiada que usava junto ao pescoço de todo mundo, mas também pela língua mais afiada ainda e que não deixava a vida de ninguém sem ser jogada na lama.
E tão perigoso é o barbeiro que certa vez um juiz de direito sentou na sua cadeira para ser barbeado e ele, já conhecendo a dureza do homem nas suas decisões e sentenças, começou a esculhambar com a justiça e o judiciário, e toda vez que o homem ia responder ele colocava o fio da navalha bem diante dos olhos e dizia: só vai passando a navalha em coisas assim!
E o doutor ficava quietinho, medroso, em tempo de se sujar todinho.




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com   

Nenhum comentário: