*Rangel Alves da Costa
Por ser
territorialmente o maior município de Sergipe, com uma extensão que vai além
dos 1.200 km², as chuvas que caem em Poço Redondo, no sertão sergipano, podem
ser tão dispersas que, muitas vezes, os aguaceiros num lugar sequer são
chuviscados noutro lugar.
Pode
chover muito nas Areias e nada na Barra da Onça, por exemplo. Igualmente pode
chover nas Queimadas e não cair sequer uma gota pelas bandas da Queimada
Grande. Recentemente, as chuvas foram tão fortes em Bonsucesso que até postes
foram derrubados, enquanto que noutras localidades apenas chuviscos mais
alentados.
O
pé-d’água caído na sede municipal após as duas tarde desta sexta-feira pode ser
tido como outro exemplo das repentinas e localizadas precipitações. Em local
específico, as nuvens carregadas se despejam de forma inesperada e espantosa.
Principalmente no sertão, ninguém espera que repentinamente isso possa
acontecer.
Mas aconteceu,
e com voracidade. De repente o pé-d’água começou a cair que quem estava na rua
teve que se molhar. Mesmo estando perto de casa, não houve tempo suficiente de
correr para se proteger. Corria sim, mas a cada passo sentindo por cima a
molhação desenfreada.
Conceitualmente,
pé-d’água é a chuva forte, repentina e de pouca duração. E foi exatamente assim
que aconteceu. Depois do calor de vulcão e de sol de mil brasas, o clima
abafado logo trouxe a formação de nuvens escuras, bem localizadas acima das
proximidades da cidade.
Quando as
nuvens se aproximaram mais, então as torneiras foram abertas de vez e o
aguaceiro começou a cair. É chuva chegada de modo tão inesperado que nem dá
tempo de a dona de casa espalhar baldas e bacias embaixo de goteiras, cobrir
móveis e proteger espelhos e vidros.
Pé-d’água
acompanhado de vento ainda pior. E assim também aconteceu. Água respingando
pelas frestas, a ventania forçando aberturas, os pingos grossos querendo chegar
até a cozinha. Água levada pelo ventania e adentrando em qualquer canto que
tivesse ou forçasse passagem.
Dona
Gerôncia teve que gritar após ter seu vestido levantado até a cabeça. O chapéu
de Queromildo foi parar longe. Certamente nunca mais será alcançado. Timotinho,
cabra magro que mais parece uma vara, até pensou que seria levado na força da
sopração. Teve que correr para se agarrar a um poste, e ainda assim com medo de
ser despregado de lá.
Na feira,
lonas de barracas foram pelos ares e muita folha de verdura mais parecia folha
seca de mato, subindo e subindo, sendo levada pela ventania. Dizem que até os
telhados seguros das casas se sentiram ameaçados pelos repentinos açoites. A
verdade é que até passarinho tinha que redobrar o voo para não ser domado pelo
vento.
Não se
sabe como, mais Titó engoliu o cigarro de palha. Tava colocando no bico quando
uma lufada o fez engolir o cigarro aceso, e inteirinho. Coitado. Dizem que,
aperreado, soltava fumaça enquanto pedia ajuda. O jeito que teve foi abrir a
boca debaixo de uma biqueira e deixar o cigarro apagar lá dentro.
Mas não
durou nem vinte minutos e a chuvarada foi embora. Os trovões, contudo,
continuam, e acaso mais tarde chova, então certamente será mais constante,
compassada e sempre bem-vinda ao sertão. Eu mesmo quis tomar banho de biqueira,
mas depois lembrei que a gente vive noutros tempos.
E
certamente eu corria o risco de ser chamado de doido quando, no passado, era
visto apenas como menino mesmo.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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