*Rangel Alves da Costa
A quaresma, ou os quarenta dias que antecedem
a sexta-feira santa, sempre é lembrada como um período onde os bichos estranhos
começam a ser avistados nas estradas, nos labirintos escurecidos, nos quintais,
nas curvas e nos tufos de mato. Não se sabe bem o motivo de aparecerem assim é
maior profusão, mas dizem que muito tem a ver com pecadores, com padres que
tiveram filhos, com filhos que batiam nos pais, com adultérios escandalosos,
com amaldiçoamentos. Seja como for, a verdade é que a partir da quarta-feira
santa os bichos se soltam na noite, para assustar, para atacar, para
amedrontar. São lobisomens, fogos-corredor, mulas-sem-cabeça, fantasmas
arrastando correntes, assombrações de todo jeito. Nos sertões, após a boca da
noite muita gente fecha janela e porta. De vez em quando aparece uma galinha
destripada no quintal. Ninguém é doido pegar estrada em noite fechada, muito
menos onde haja curva. Nem crucifixo e rosário os bichos respeitam, muito menos
arma de fogo. Não adianta atirar em coisa do outro mundo. Nem o sangue escorre
nem ele deixa de avançar. Somente a luz para fazê-los fugir. Uma boa lanterna
na mão é a arma mais potente em noites assim. Ou, ao invés de chamar bicho feio
chamar bicho lindo. Nenhum bicho feio quer ser chamado de lindo. Então foge em
busca de um espelho para se enfeiar mais ainda.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
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