SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



sábado, 9 de março de 2019

Palavra Solta – quando sou água, quando sou rio...



*Rangel Alves da Costa


Já faz algum tempo que escrevi um conto que intitulei de “O menino que nasceu verde”. Neste, uma criança nasce num sertão tão conhecido por nós e tem que suportar, desde o primeiro instante que aflorou do útero da mãe, as mesmas agruras de seu berço de nascimento. E simplesmente por que o seu organismo, diferentemente do que ocorre com as demais crianças, é igual ao próprio sertão: se o tempo está seco demais, a criancinha parece murchar, e vai definhando mesmo, mas se chove e tudo verdeja, então o menininho logo vai retomando suas forças até se encher de saúde e vida. Síntese da história: o menino é a representação do próprio sertão em suas angústias e alegrias. Acaso a mesma história fosse contada em relação a mim enquanto pessoa, certamente que a analogia seria feita com relação às águas de um rio, e não outro rio senão o São Francisco. Isso mesmo, pois sou como as águas deste Velho Chico que ora estão caudalosas e noutro momento já está numa magreza de dar dó. Igualmente ao rio, às vezes estou cheio, transbordante, imenso, caudaloso, bonito, espelhado e espelhando alegria e felicidade. Noutras vezes, apenas um resto de rio que vai despontando todo entristecido e feio, todo estreito e raso. Às vezes, encharcado vivo dessa felicidade. Noutras vezes, nada além de um beiral de vida que clama por dias melhores. Mas creio que todas as pessoas são também iguais a este rio. Um dia a fartura, a imensidão, e de repente já o leito em secura. Um rio somos. Aqui, ali, além.


Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

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