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sábado, 11 de dezembro de 2010

O ROUBO DO SORRISO DA MENINA – Final (Conto)

O ROUBO DO SORRISO DA MENINA – Final

Rangel Alves da Costa*



Sem dar a mínima importância para a reação indignada dos presentes, o jardineiro continuou:
"...Então quando as rosas descobriram os meus planos resolvi me vingar delas, fosse como fosse. Eu estava disposto a tudo, e elas estavam merecendo. Aproveitei um dia de mudança inesperada no tempo e matei uma a uma, sem perdão. Contudo, até o instante que dei cabo da vida delas eu não sabia que as rosas, por ciúmes da amizade de Lucinha com as outras flores, haviam soprado um pólen da tristeza no rosto dela. Fizeram isso certamente como coisa passageira, de raiva momentânea, mas deu no que deu, pois elas morreram sem reparar o malfeito. Eu sabia como trazer a alegria de volta, mas não fiz nada porque achava que ela continuando triste os seus pais se mudariam daqui, iriam para um lugar onde a menina retomasse seu prazer pela vida. E como eu sempre tive ciúmes de todos eles por causa do jardim, resolvi não fazer nada e deixar a menina triste como estava. Além disso, para fazer a menina ficar ainda mais triste eu pegava as rosas mortas e jogava dentro do quarto dela ou fazia com que elas aparecessem na vidraça do quarto. Eu ficasse por baixo balançando elas com as mãos. Até achava engraçado. E para despistar contratei uma planta para investigar a morte das rosas. Mas eu tinha certeza que essa maldita não viveria muito, e deu no que deu, como vocês bem sabem...".
"E o sorriso de minha filha, seu desgraçado, como pode voltar o sorriso de minha filha, seu desgraçado?", perguntou Paulo caminhando raivoso em sua direção.
"Sobre isso eu não posso fazer nada, até porque as rosas morreram". Respondeu o jardineiro com a cara mais cínica do mundo, até deixando sair um leve sorriso pelo canto da boca.
"Mas não precisa fazer mais nada, pois eu também estava mentindo seu bobão". Era Lucinha, que se aproximou do pai e de repente começou a sorrir, a cantar e a bailar no jardim, para alegria e lágrima de todos os presentes. E a menina parou os festejos por um instante e prosseguiu:
"As rosas que morreram me apareceram de verdade para pedir perdão pelo que fizeram e me deram um pozinho dentro desse saquinho aqui, olhe - E tirou do bolso um saquinho minúsculo de pano -. Bastou que eu espalhasse um pouquinho do pó sobre o meu rosto e a minha felicidade voltou em dobro. Agora sou duplamente alegre, duplamente feliz, duplamente sorridente, duplamente brincalhona, duplamente tudo de bom. Mas restou ainda um pouquinho de pó que eu não posso mais usar, senão voltará novamente a tristeza. E é por isso que vou agora mesmo derramar o resto desse pó no chão e pronto, e ninguém ficará mais triste, nem eu nem ninguém".
E quando segurou a bolsinha na mão para derramar o pó, surgiu um passarinho e tomou pelo bico o objeto de sua mão e deu um voo rasante em direção ao jardineiro, pairando sobre sua cabeça e despejando o restante da poeira enfeitiçada agora pela angústia. No mesmo instante a tristeza se abateu para sempre no desventurado homem. Nunca mais ninguém o veria feliz.
Mas a felicidade existia e mostrava todas as suas faces ali na festança que se fez no jardim durante o resto do dia.
Uma semana depois um dos visitantes publicava num jornal do País das Lendas uma reportagem com a seguinte manchete: "A incrível história da menina triste que voltou a sorrir".


FIM




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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