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quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

A SOLIDÃO E A ÁRVORE - 4 (Conto)

A SOLIDÃO E A ÁRVORE - 4

Rangel Alves da Costa*


Mãe, meu segredo é simples, é coisa de menina, é quase sem segredo. É segredinho de nada, que dá até vergonha de contar.
Minha filha, sou sua mãe e entre a gente não tem segredo. Você já devia saber bem disso. Não esconda nada não, diga tudo minha filha. Se for coisa de ser guardada a sete chaves é mais um motivo pra confiar em sua mãe.
Na verdade são vários segredos dentro de um segredo. Eu contando um já estarei contando o segredo de todos.
Que seja milhões, minha filha. Conte-me, confie em sua mãe.
O primeiro é que eu queria ter um amigo. Quando digo amigo pode ser menino ou menina.
Qual o outro, minha filha?
O segundo é que eu queria poder passear, sair por aí sem ter meu pai me olhando ou me chamando, caminhar bem muito até me cansar e depois sentar embaixo de uma árvore bem bonita, com muita sombra, num lugar bem bonito, parecendo o paraíso.
Tem mais segredo, minha filha?
O terceiro é que de vez em quando me dá vontade de voar, bater asas naquela janela e subir pelos ares e alcançar as nuvens, e alcançar o céu, e visitar a lua e conhecer o sol, voando junto com a ventania mais forte que houver.
Ainda tem segredo, minha filha?
O quarto segredo é que eu queria ser menina como as outras meninas, crescer como as outras e me tornar mocinha, como já sou, como as outras. As outras meninas fazem coisas de meninas e eu só posso fazer coisas de crianças.
Não tem mais segredo não, ou tem?
Só mais um minha mãe. Eu queria ter um espelho novinho, bem bonito, pra que eu pudesse me olhar quando eu quisesse. Um velhinho que eu tinha guardado aqui sumiu não sei como.
Mas que segredos bonitos minha filha, que lindos segredos são os seus. Não lembro se já tive algum segredo, mas certamente jamais se comparou com esses que me contou.
E o que a senhora pode dizer deles, minha mãe?
Imitando você, em primeiro lugar, o que me contou nem posso considerar como segredos. Verdadeiros segredos, minha filha, são questões que atormentam de morte as pessoas...
Mas essas coisas me atormentam.
Explico Melhor. Essas coisas que você me contou estão mais próximas de serem sonhos do que de segredos. Tudo isso que você falou são desejos, são coisas que você gostaria de conquistar.
Mas os sonhos que moram nas pessoas são como segredos, minha mãe.
Sim, minha filha, tem plena razão. Mas o que quero dizer é que os seus segredos não são coisas que os outros precisam saber para conhecer alguma coisa séria e importante, mas que são sonhos que os outros precisam conhecer para poder ajudar a realizá-los.
Tá bom, mesmo que sejam sonhos, o que posso fazer agora?
Procurar realizar os seus sonhos, pois nada do que falou está no mundo do impossível.
Como, minha mãe?
Os amigos não são buscados, eles acontecem, aparecem. Com sua inteligência você pode sair pra passear quando quiser, basta ter cuidado com seu pai.
E sobre a vontade de voar?
Você pode agora mesmo ir até aquela janela e fazer o voo mais alto do mundo, bastando fechar os olhos e sair voando.
E sobre os outros sonhos?
Você já é mocinha e igual a todas as outras, basta sentir nos seus sonhos. E quanto ao espelho, tenho um segredo pra lhe contar...


continua...



Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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