DILEMAS DO POVO
Rangel Alves da Costa*
Será que o povo, tão civilizado e consciente de suas ações, tão conhecedor da vida e suas situações que não aceita nem mais conselhos, é tão autossuficiente para não recair em dilemas?
No jogo do tanto faz, que é o jogo preferido pela maioria da população, será que haveria espaço para indagar se a decisão tomada está certa ou errada?
O povo, que se julga correto demais nas suas escolhas, por que mais tarde sempre reclama da escolha feita e se perguntado se voltaria atrás, ainda assim não sabe se repararia o erro?
Será que o povo vive em constante dilema e não sabe ou o dilema existe como chance de escolha e o povo só se vê em conflito depois da escolha errada feita?
Dizem que dilema é uma situação embaraçosa entre duas soluções fatais, ambas difíceis ou penosas; é uma circunstância problemática para a qual há duas saídas, contraditórias e igualmente insatisfatórias, gerando indecisão; é um problema que oferece duas soluções, sendo que nenhuma das quais é aceitável.
Toda difícil escolha provoca um dilema. Ao menos deveria ser assim. Mas com o povo não, pois sempre escolhe o improvável, o pior, o que mais tarde vai se revelar como tal.
Na sua escolha, a sociedade parece não valorizar o significado de uma balança nem as consequencias de optar pelo lado que sabe mais corrompida.
Se souber que daquele lado da balança está mais pesado, pendendo pra um lado porque justamente tomada pelo peso de coisas erradas, ainda assim será o lado escolhido, pois tornou-se cultural a coletivização do erro e do seguimento pelo caminho tortuoso.
Ora, seria dilema escolher entre políticos aquele que preste, que fala a verdade, que seja reconhecidamente probo e moralmente inatacável? Não, principalmente porque todos são praticamente iguais na percepção da imprestabilidade.
O dilema na verdade estaria na escolha daquele político mais ou menos corrupto, desonesto, mentiroso, ladrão, capaz de barganhar com o mandado outorgado pelo povo. O que seria dilema se transforma numa escolha fácil: o voto vai pra o ladrão mesmo!
Ora, um povo civilizado e que ao longo dos anos vem lutando pelo reconhecimento e aquisição de direitos, deveria ao menos conhecer seus direitos e deveres de cidadão. E não conhece o alcance e os limites de sua cidadania porque é um povo histórica e culturalmente conformado com qualquer situação que lhe seja imposta, mesmo que seja uma afronta à sua dignidade e integridade física.
E eis que surge o dilema: reclamar de que, se assino embaixo para que seja assim mesmo? Daí que não pode se indignar com nada, se insurgir diante de qualquer absurdo, bradar com todas as forças diante de tantos absurdos.
É triste, mas um povo que não tem o poder de se indignar não merece ter seus direitos reconhecidos. E verdadeiramente nãos os tem, pois ninguém nas esferas de poder vai se preocupar se a dignidade do povo está sendo ultrajada. Se o povo se indignasse, reclamasse, batesse na mesa, exigisse respeito, tudo seria diferente. Mas...
Mas deixa tudo acontecer, tudo ao deus-dará, exatamente pelo conformismo absurdo que se impõe enquanto cidadão ultrajado. Reclamar do que e para que, se está bom, está ótimo, está tudo divinamente maravilhoso?
E tudo será confirmado na eleição seguinte, pois sairá de bandeira erguida defendendo político, militando pela continuidade, dizendo que o ladrão deve continuar legislando em nome e para o bem do povo. Passada a eleição, os mesmos eleitos, a mesma roubalheira, o espanto e momentânea revolta. E depois?
Depois surge o maior dilema, que é saber se essa sociedade que aí está é fruto do seu declínio ou do seu progresso. Ouso afirmar que cada um povo bebe do veneno que derrama no próprio copo. Ninguém o força beber aquilo que não lhe dá prazer, mesmo que seja para se destruir.
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário