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terça-feira, 17 de abril de 2012

ESTÓRIAS DOS QUATRO VENTOS: FAZENDA TERRA DOURADA (9)

                                       
                                                           Rangel Alves da Costa*


Ora, decidir sobre a melhor ou a pior forma de morrer era assunto desastrado demais para o Sinhô Badaró naquele momento. Por isso mesmo que puxou o velho sacerdote pelo colarinho e disse que lhe daria uma fortuna se arranjasse um jeito melhor para resolver o problema.
Encantado com o que ouviu, e já como se estivesse vendo o cheiro de notas graúdas ao seu alcance, coisa que aliás lhe fazia demasiadamente pecador, o religioso mudou a feição no mesmo instante. Reanimou-se, respirou fundo, colocou meio copo de aguardente pura e virou numa talagada só. Depois de passar a língua nos beiços disse:
“Pra tudo se dá um jeito amigo Sinhô Badaró, pra tudo se encontra uma saída. Dizem que menos para a morte, mas ainda assim tenho minhas dúvidas. Tenho minhas dúvidas...”.
Noutro canto da casa a conversa era também sobre morte. Não só a morte do velho Badaró, da gorducha esposa Graciosa, bem como do próprio sacerdote. Mas também sobre ouro, riqueza, bonança, gastos infindáveis, uma vida regada a luxos e regalias. E quem falava sobre isso não eram outras pessoas senão os dois filhos do coronel, as crias que dali em diante não se dariam por satisfeitas enquanto não colocassem a mão no ouro escondido na igrejinha.
Com a canalhice peculiar aos filhos que desonram os pais, Permínio perguntou ao irmão Licurgo o que poderiam fazer para colocar as mãos naquela fortuna dourada. E o outro respondeu que era coisa pra se pensar cuidadosamente, pois seria verdadeiramente uma operação muito arriscada.
E disse ainda que para tudo dar certo teriam que passar por cima de muita coisa, inclusive de gente, incluindo-se aí a própria família. Mas em primeiro lugar tinham de dar cabo da vida do sacerdote, matá-lo sem piedade e o mais rapidamente possível. Se o velho padre sabia da existência do ouro e estava mancomunado com o pai, então teriam que tirá-lo do caminho o mais rápido possível. Depois dariam um jeito no resto, um a um, até que não restasse mais ninguém para falar sobre a existência do ouro. E este, evidentemente, já teria recebido outra destinação.
Depois de ouvir as estratégias maldosas do irmão, Permínio disse que se tinham de dar logo fim ao homem da igreja então teriam que arrumar alguém de confiança para fazer o serviço, e bem feito, pois seria muito perigoso que eles mesmos se encarregassem de tal empreitada de sangue. E acabou afirmando que não conhecia pessoa melhor para tocaiar o homem e matá-lo do que o jagunço Celestino, pessoa de demasiada confiança.
Como Celestino não saía dos arredores, bastou um grito e o pistoleiro riscou nos pés dos patrõezinhos, como já os havia chamado tempos atrás. Logo foi mimado pelos dois, com conversas amigueiras para depois ser perguntado como fazia para tocaiar um inimigo e matar. De cara, sem pensar muito, este respondeu que bastava escolher o lugar e a hora. E foi quando Licurgo aproveitou para dizer:
“Estamos precisando de um trabalho assim. O lugar será numa dessas estradas da saída da fazenda, ou talvez mais adiante para não levantar suspeitas. A hora é aquela que o homem passar montado no seu animal. E o resto você já sabe fazer, que é algo assim como arranjar a moita ideal pra se esconder e esperar a vítima, ter a arma carregada e em pontaria e depois mandar bala. E bala certeira, na testa, de modo que com apenas um tiro o desatinado já tenha sido liquidado. Não é assim mesmo?”.
Então Celestino respondeu: “É quase assim mesmo, mas tem de ter um inimigo. E tendo o inimigo tem de ter o motivo, a causa pra que ele seja morto. E tendo o inimigo e o motivo certo pra que ela deva morrer, ainda falta uma coisa, que é a ordem do patrão pra que o serviço seja feito, pois sou jagunço de outro e não matador por conta própria...”.
“E se a ordem for dada pela gente, por nós dois, eu e Permínio, em troca de dinheiro graúdo, você topa fazer o serviço?”. Celestino pigarreou, ajeitou o chapéu e respondeu com uma pergunta: “Que conversa é essa homem, mas já tem o inimigo, quem é o inimigo que querem ver derrubado?”.
“O sacerdote que tá lá no quarto com meu pai. É ele que você tem de tocaiar e matar”. Disse friamente Licurgo.
O jagunço olhou nos olhos dos dois, baixou a cabeça e disse em seguida: “Aceito!”.
Continua...  



Poeta e cronista
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