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sexta-feira, 6 de abril de 2012

EX - E AGORA? (Crônica)

                                              Rangel Alves da Costa*


Principalmente para os que estão acostumados ao poder, ao mando, ao estar por cima, ser ex é uma situação extremamente complicada, dolorosa, difícil de se resolver. Até porque ninguém aceita de hora pra hora sair de uma situação privilegiada pra ficar pra trás, no escanteio. Ter e ser, mas de repente apenas tinha e era é difícil de engolir.
Realmente não é nada fácil ser apanhado por tal prefixo significando êxodo, saída, expatriação, afastamento. Ser apenas o que já não é ou ser visto pelo que era. No mesmo sentido, ganhar uma qualificação muitas vezes negativa em razão daquilo que não é mais; ou ainda ser lembrado não pelo que passou a ser, mas exatamente em função do que era ou exercia.
Segundo os dicionários, o prefixo ex-, de origem latina, exprime a ideia de isolamento, saída, banimento; expressa movimento para fora de alguma coisa, saída de algum lugar, embora de onde estava. Como anteposto e ligado por hífen a certos substantivos, designa cargo, profissão ou estado que se deixou de exercer. Enquanto redução, utilizando-se apenas o termo ex, pode significar um estado modificado por uma ação. O substantivo que se lhe segue significa aquilo que alguém foi mas já não é.
Daí que se falar tanto em ex-presidente, ex-jogador, ex-namorado, ex-amante, ex-amigo, ex-aluno, ex-presidiário, ex-companheiro, ex-sócio e daí por diante. Como visto, alguém deixou o poder, deixou um relacionamento, deixou uma situação, deixou uma profissão. Contudo, dependendo do substantivo daquilo que deixou de ser, tornar-se ex é processo de rompimento com consequencias nebulosas.
Se ainda houver resquícios de amor, de paixão, de querer, não é nada fácil se tornar ex-namorado, ex-noivo, ex-amante, ex-companheiro, ex-marido ou mulher. A quebra do vínculo pode até ser compreendida e aceita por um, mas nem sempre pelo outro. Daí que ser ex também pode se transformar em sinônimo de ausência, de perda, de dor, de incompreensão do fato ocorrido.
Se para alguns ser ex, ou não ser mais, é algo bom, até desejado e esperado, pois possibilita um reencontro consigo mesmo e uma busca de recomeço – e agora totalmente livre de diversas amarras -, o mesmo pode não ocorrer com o outro. Não apenas se sentirá rejeitado, abandonado, enganado e desiludido, como também será alvo dos comentários quase sempre maldosos dos outros.
O escritor Roberto Gomes, em texto intitulado “Todo ex- é definitivo” (www.criaredicoes.com.br/robertogomes/textos_cronicas), defende que a verdadeira situação de ex é aquela que nunca deixa de ser como tal, vez que aquilo que se tem como um passado bom não pode nem deve ser esquecido. E assim defende seu argumento:
“Poucas palavras são mais enganosas do que a pequenina ex. Dizem os dicionários que desde o século XIX este prefixo tem sido usado para indicar, sempre com hífen, que alguém deixou de ocupar cargo, função etc. É uma definição inofensiva, mas perigosa. Ela implica que se trata de algo que um dia foi, mas passou. Terá passado? Acho que não. Alguém ou algo referido por um ex está sempre presente. Por exemplo: ex-mulher. Nada mais definitivo, inacabável, incontornável, colado para sempre ao ex-marido do que uma ex-mulher – e vice versa. O ex é algo (lugar, cargo, profissão) ou pessoa (mulher, marido, sócio, colega de escola) para sempre dependurados em nossa vida e não em nosso passado. O ex é aquilo que fica para sempre. Tanto é verdade que nunca indicamos com o prefixo ex aquelas coisas que efetivamente deixamos para trás como parte de um passado que se foi”.
Dependendo da situação, também creio que ser ex significa continuar ligado umbilicalmente ao que estava acostumado a ser. Veja-se o exemplo de uma criança recém nascida, um ex-feto, ex-nascituro que mesmo após vir à luz continua ligado à mãe. Cortar o cordão umbilical não significa rompimento. E no amor também é assim, pois circunstâncias existem que forçam o afastamento, porém jamais esse rompimento total, profundo e logo definitivo.
Ora, até mesmo não havendo mais possibilidade de aproximação ou reatamento, ainda assim as marcas boas daqueles tempos idos e de convivência permanecerão. Ao menos nos outros.



Poeta e cronista
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