Rangel Alves da Costa*
- De onde você vem assim, tão cabisbaixo, triste, parecendo que está com algum problema? Onde estava que voltou desse jeito?
- Do alto da ponte...
- Mas o que fazia lá na parte mais alta da ponte. Se a pessoa cair dali é certeza de morte. E o que foi fazer lá?
- Morrer. Fui me jogar de lá...
- Mas você está brincando. Então vou brincar também. E por que não se jogou?
- Estava cheio de gente. Mais de dez pessoas na minha frente querendo se jogar para morrer...
- E por que não se jogou logo, assim mesmo, cortando a fila?
- Não quero que ninguém veja minha morte, eu me atirando de lá de cima para morrer...
- Então decidiu que viver é bem melhor e resolveu voltar?
- Viver deve ser bom para os outros, mas pra mim não. Agora me deixe ir que vou procurar outro lugar ou outro jeito pra dar logo fim nessa vida de tristeza e sofrimento...
- Mas onde você pensa ir?
- Vou subir no último andar de um prédio, procurar um penhasco bem alto, tomar chumbinho de matar rato ou tomar uma corda emprestada pra me enforcar. Uma corda e um telhado também...
- Mas por que tomar emprestado uma corda e um telhado?
- Porque não tenho nem sequer uma corda pra me enforcar e muito menos uma casa que tenha telhado. Não tenho mais nada...
- Nada, mas como nada?
- Nada, não tenho nada. Perdi o emprego, tive de deixar o barraco que alugava, tive de vender o que tinha para me sustentar, e depois que não tinha mais nada fui abandonado pela namorada...
- É, então o problema é sério mesmo, mas nunca tão desesperador para pensar fazer besteira, e logo esse negócio de se matar. Você tem família por aqui?
- Nem aqui nem em lugar nenhum. Se tenho desconheço e nem sei onde posso achar qualquer parente...
- Mas você deve ter amigos. Todo mundo tem amigos, então você deve ter alguns amigos também não é?
- Desculpe a pergunta, mas amigos pra que?
- Mas ora, pra que possam ajudá-lo nesse momento difícil. Um bom amigo jamais deixaria você numa situação dessas. Já pensou em procurar algum?
- Mas o único amigo que tenho é você...
- Eu? Ah, sim, eu. Por que você acha que sou seu amigo?
- Você mesmo me dizia, tanto na mesa de bar ou em qualquer lugar que a gente se encontrasse. Por diversas vezes você me apresentou aos outros como o seu melhor amigo. Lembra?
- Melhor amigo, melhor amigo? Não sei o que anda acontecendo comigo, mas acho que ando meio esquecido. O que foi que você falou mesmo?
- Eu não falei nada, mas foi você que disse que eu bem poderia encontrar um amigo que me ajudasse nesse momento difícil. E o único amigo que tenho é você, não é mesmo?
- Sim, acho que conheço você de algum lugar, mas agora não me recordo. O que você dizia mesmo?
- Já que não quer lembrar do quanto já precisou de mim, do quanto dizia que era meu amigo, então deixe eu ir cumprir minha sina. Sei que de você não posso mesmo esperar ajuda nenhuma...
- Posso ajudar sim. Logo adiante tem uma linha de trem. Deite lá que seu problema tá resolvido.
O desempregado, triste e disposto a se despedir dessa vida, saiu caminhando e considerando a possibilidade de reverter a situação. Continuar vivendo era o melhor a fazer, pois procuraria reconstruir a vida e reconquistar tudo.
Caminhando e pensando, nem olhou pra trás e ver o seu ex-amigo caído, esparramado no chão. Deu um piripaqui no coração e ali mesmo caiu mortinho da silva.
Poeta e cronista
e-mail: rac3478@hotmail.com
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