SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



quinta-feira, 1 de julho de 2010

EVANGELHO SEGUNDO A SOLIDÃO – 32

EVANGELHO SEGUNDO A SOLIDÃO – 32

Rangel Alves da Costa*


Mesmo temeroso pelo significado prático daquelas palavras, Lucas se comprazia de alegria íntima pela oportunidade de ouvir ensinamentos tão significativos e importantes e vindo de uma pessoa que já estava firme em apreciar e respeitar. Na voz carregada daquele senhor vinha o alento que tanto necessitava para o enfrentamento das mais nebulosas situações. Tinha uma igreja no coração sim, mas precisava de um amigo que compartilhasse desse encantamento que é o reconhecimento do homem a partir de sua própria fé. E Padre Josefo era esse amigo, descortinando o apenas imaginado para proveito do solitário no seu caminho.
E Lucas perguntou ao sacerdote o que achava que ele deveria fazer dali por diante, a partir daquele instante, até mesmo porque tinha uma vida para ser vivida e não podia ter os seus momentos totalmente tomados por preocupações daquela ordem. Então o padre respondeu:
- Viver Lucas, plena e totalmente viver, é o que você deve fazer, pois somente o fraco se deixa levar por ameaças do inimigo. Ademais, quanto mais vivemos e construímos mais ganhamos forças para vencer as forças negativas. As forças ruins vivem à espreita da fragilidade do homem, principalmente da fragilidade espiritual deste. Não devemos nos descuidar, é verdade, mas devemos agir como se cada instante nos chamasse a viver mais, a produzir mais, a realizar mais, pois a soma disso tudo chama-se felicidade e não há inimigo que não sucumba diante da fé e da felicidade do outro cristão consciente. Mas vamos confirmar isto através das palavras do Senhor. Pegue aquela bíblia ali e abra no segundo livro de Samuel, capítulo 23, versículos 2 a 7, depois leia, por favor.
"O Espírito do Senhor fala por mim, sua palavra está na minha língua. Deus de Israel falou, o rochedo de Israel me disse: O que governa com justiça, o soberano temente a Deus é como a luz da manhã quando se levanta o sol, manhã sem neblina, que faz cintilar de orvalho a relva da terra. Sim, minha dinastia é estável diante de Deus; ele fez comigo aliança eterna, a ser observada com absoluta fidelidade. Minha salvação e inteira felicidade não é ele quem faz germinar? Os homens maus são como espinhos, que todos evitam e ninguém pega com a mão; que se recolhem com um ferro ou com o cabo da lança, e são queimados no fogo". Lucas leu para que ouvissem, e em seguida Padre Josefo falou:
- A dinastia estável de um coração virtuoso é rochedo que inimigo algum consegue transpor. Tens um coração assim meu rapaz, mesmo que esteja mais para uma montanha onde se elevará a voz do Senhor. Tua voz ainda será ouvida por muitos e quiçá o inimigo estivesse presente para arrepender-se, mas não, pois ele já estará recolhido ao fogo e queimado pelas chamas do bem, pelas chamas que brotarão do teu coração glorioso.
Verdade é que Lucas se despediu do Padre Josefo muito mais animado do que quando chegara à igreja. As palavras do amigo, além do conforto essencial naqueles momentos, proporcionaram um encorajamento muito maior e a tomada firme da decisão de que enfrentaria sem nenhum temor todas as ameaças que, de quem quer que partissem, fossem intentadas e levadas adiante.
Retornando para casa, agora caminhando cheio de disposição e alegria, encontrou o menino Paulinho, e este dizendo logo que não fazia meia hora que havia estado em sua casa para deixar um recado. Então Lucas perguntou o que seria de tão importante para que tivesse ido lá. E o menino explicou:
- É que eu ia passando pelo beco das araras quando seu Sebastião e dona Marieta me chamaram. É aquele casal já idoso que mora por lá. Fui até lá meio espantado sem saber o que era, mas assim que entrei na taperinha eles me ofereceram um pedaço de cocada de frade, com os dois sempre envergonhados e meio que sem jeito. Assim, de cabeças baixas pela vergonha, me pediram para falar com você se tinha como eles dois irem até o barracão, nos dias que você puder, pra ver se aprendiam ao menos a ler, pois já estão naquela idade e dizem que a coisa mais triste pra eles é não saber nem ler nem escrever. E aí eu disse que tinha certeza que você aceitaria ensinar com maior prazer, mas primeiro tinha que falar e depois voltaria para dar a resposta. Chegaram até a chorar quando eu disse isso. E então Lucas, o que posso dizer a eles?
- Ora, Paulinho, mas que coisa boa. Até que enfim as pessoas tomaram consciência de que não há idade para aprender a ler e a escrever, para buscar alfabetização, e que bom se existisse aqui dezenas, centenas de pessoas com esse mesmo objetivo. Vamos até lá que eu quero conversar pessoalmente com eles. Mais que coisa boa Paulinho... – E os dois amigos seguiram conversando alegremente.


continua...




Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

Nenhum comentário: