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sexta-feira, 9 de julho de 2010

QUANDO O AMOR É DEMAIS (Crônica)

QUANDO O AMOR É DEMAIS

Rangel Alves da Costa*


Não sou eu que afirmo, mas os apaixonados dizem e a ciência do amor comprova que quando a relação amorosa é demais tudo se torna demasiadamente visível, imensamente explícito, enormemente gritante e dolorido. De repente, e tudo é dito e sentido adjetivando-se, no superlativo, acentuando a intensidade do sofrimento, do amor, perdido, da angústia, da solidão, do abandono.
A primeira coisa que os outros dizem é que não pode ser, é tudo mentira, que aquilo não poderia ter acontecido de jeito nenhum, pois os dois já namoravam há muito tempo, nunca demonstraram que andavam brigando, viviam sempre felizes e sorridentes, andando sempre abraçados ou de mãos dadas, trocando carícias e beijos, parecendo dois pombinhos prontos para voar rumo à plena felicidade. Não, de jeito nenhum, isso só pode ser mentira, invenção de quem não tem amor e não pode ver a união amorosa dos outros.
Quando está tudo bem na relação, nem a poesia, nem a natureza, nem nada na vida pode ser comparado ao amor demais. São os momentos do eu te amo tanto, eu te quero tanto, você é tudo é minha vida, não penso noutra coisa a não ser em ti, meu coração bate marcando os minutos para você chegar, meu deus na vida, minha deusa em pessoa, tudo o queria na vida, sonho maior do meu viver, benção do céu sobre a minha solidão, amanhecer e anoitecer dos meus dias, incomparável ser, tudo, mais, muito mais, porque o nosso amor é invencível, imortal, nem mesmo um sozinho entre nos dois poderá destruí-lo. Com efeito, nesse estágio mil coisas poderiam se dizer ainda sobre o amor, pois este é realmente expressado desta maneira. O problema é saber se é verdadeiro ou não.
Quando as primeiras crises começam a abalar o amor e alcançar bem no ponto de sua maior fragilidade, que é na palavra que lhe sustenta até mentirosamente, eis o momento de surgirem as reticências, o talvez, o duvidar. E surgem os momentos do temos que pensar melhor nossa relação, temos que conversar mais, acho que estamos errados em alguma coisa que não sabemos ainda, sinto em você cada vez mais frieza, parece que não está se sentido bem ao meu lado como costumava ficar, vejo em você uma certa distância e em mim algo que impede que me aproxime mais, acho que desse jeito não vai dar, temos que mudar ou seremos forçados a dar um tempo. E o amor demais já não é mais o mesmo, comprovado que está a fragilidade dos sentimentos.
Numa bela tarde, que para os dois mais parecia um entardecer de velório e tristeza, enfim surge a realidade, cai de vez o pano e a boca se abre para explicar o fim do amor que um dia era indestrutível e desabou na brisa. E são os instantes de surgirem palavras trêmulas dizendo que aquilo não poderia ter acontecido com eles, ontem o amor era tanto e nada explica essa separação agora, que é forçada a dizer que não dá mais porque sente que ainda ama, que o tempo poderá ajudá-los a compreender os motivos e talvez fazer com que se reencontrem, que não fique triste não porque amanhã é outro dia e poderá encontrar alguém bem melhor, que a vida é para ser seguida e o amor pra ser amado quando realmente existe, mas como entre eles não existe mais, então que seja feliz, um beijo, um abraço e boa sorte. Não era pra chorar de jeito nenhum, mas chorou, por dentro, mas chorou.
E depois da despedida, quando a solidão surge no dia seguinte, a poesia, a natureza e as belezas da vida retomam seus lugares nos corações doloridos. E cada um, na sua agenda, no caderninho ou na folha seca, começa a escrever: te amo ainda e tanto, não consigo te esquecer, o que farei agora nessa solidão e tristeza sem os teus beijos e abraços, volte meu amor, me perdoa se eu errei, não sou ninguém sem você, minha vida é vã e meu dia escuridão, tenho apenas alguma coisa por dentro que se chama coração e agora vive às portas do abismo e da desilusão. Volta meu amor, te amo. Volta meu amor, pois juro que jamais nos distanciaremos até que a morte nos separe.
Nesses momentos, um montão de coisas inexplicáveis surgem para ajudar. São as preces, a fé, os céus olhando, o desejo, os deuses do encantamento, as magias, as forças superiores, tudo pactuando para que se dê uma chance. Esta veio ao acaso, como sempre opera o que tem de acontecer, numa tarde em que os dois se encontraram por aí. E bastou um olhar nos olhos um do outro e entre beijos e abraços o amor renasceu causando inveja à própria Fênix.
Não demorou nem dois meses e casaram no maior amor do mundo. E no primeiro desentendimento que houve se ouviu: Vá-se embora seu filho do cabrunco, seu filho da peste, sua gota serena, você não presta, não vale nada mesmo, pra tá com você só tendo sido feitiço, seu corno safado. E teve que ouvir: Quem não presta é você, sua nojenta, imprestável, cobra de rabo e perna, maldição da natureza, mulherzinha vulgar e vagabunda. Só mesmo coisa feita pra aguentar esse trubufu em minha vida. Arrume suas malas e pode ir embora, sua desgraçada, pois seu caminho é na sarjeta e na miséria, sua rampeira.
Não há mais nada a dizer, pois tudo isso é amor.




Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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