SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



terça-feira, 30 de julho de 2019

NUM TEMPO DE GALINHAS, TERREIROS E QUINTAIS



*Rangel Alves da Costa


Galinha gorda, nascida e criada na engorda dos quintais, dos monturos, dos terreiros e na solta do meio do mundo.
E galinha muita, pois muitos quintais e nestes sempre os poleiros, recantos e estrados apinhados da cacarejante.
Mas também meio mundo de pintos, galos e outros ciscantes. Hoje, a verdadeira galinha de capoeira é raridade, está praticamente sumida.
Nos afastados da cidade, nas fazendolas e moradias, ainda é possível encontrar a cacarejante engordando logo após a porta da cozinha, quintal arriba e pelos arredores.
Milho, xerém, restos de comida, basta jogar adiante e a correria está feita. A galinhada come de tudo, bastando jogar uma mão de qualquer coisa e a festa está feita no quintal, terreiro ou malhada.
Puxar o pescoço de uma dessas é ter a certeza de panela cheirosa e comida boa, gorda, oleosa pela banha da própria ave, de osso duro e carne saborosa sem igual.
Mas nem todo sertanejo gosta de colocar uma galinha no fogo. Coisa estranha acontece, mas mesmo com o quintal cheio das penosas, não raro a panela estar completamente vazia.
Muitas vezes cria só por criar, para ter ovos ou para vender, porém não se encoraja de puxar o pescoço de uma de jeito nenhum. E isso é uma verdade.
Conheço gente interiorana, com galinha ciscando por todo lugar, mas não tem coragem de lançar mão de uma quando o tiquinho de carne da feira acaba.
Fica sem a mistura do feijão ou da feira, mas a galinha fica. Procura qualquer naco de outra coisa, mas a penosa fica ciscando, cacarejando, em riba do poleiro, sujando o quintal inteiro.
Na região sertaneja, tantos nos afastados como na cidade, havia tanta galinha de capoeira que certa feita aconteceu um episódio interessante. E bote interessante nisso.
Nos anos 70, quando da chegada da energia elétrica na cidade de Poço Redondo, a noite de primeira iluminação foi mais surpreendente do que se poderia imaginar.
E não só pelo número de pessoas nas ruas, mas principalmente pelas galinhas que tomavam todos os recantos da cidade.
Acostumadas a deitar logo ao escurecer, ainda antes da boca da noite, as galinhas confundiram a luz da energia com a luz do dia e foi um problema sério pra ser resolvido.
Imaginando ainda ser dia, de repente deixaram os quintais e começaram a passear pela cidade. Nem subiram aos poleiros e já estavam passeando pelos becos, ruas e avenidas.
Pra cada dez pessoas havia vinte galinhas dividindo o mesmo espaço. E demorou tempo até se acostumarem.
Contudo, não só as galinhas ficaram desnorteadas pela chegada da luz elétrica. Muita gente também. E muita coisa estranha começou a acontecer, e fatos ainda hoje recordados por muitos.
Menino não queria dormir de jeito nenhum. Uma velha senhora chorava de se acabar porque não sabia mais a hora de rezar seus credos e orações. Um maluquinho, reclamando que a noite não chegava mais, então começou a jogar pedras nos postes e nas lâmpadas.
Mas o pior aconteceu com Leotério: oito da noite e ele deitado na calçada pra tomar sol. E quando o galo cantava na madrugada, então ele dizia: O mundo tá doido. Nunca vi dizer que galo cantasse com o sol já saído.


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Lá no meu sertão...


Rangel Alves da Costa, eu mesmo...



Porto Caymmi (Poesia)



Porto Caymmi


Quando ao sul do espelho das águas
canoas e barcos adentravam o cais
trazendo cestos de frutas maduras
e frutos verdosos dos coqueirais
as vozes negras em peles escuras
cantavam dolentes um canto torto
remansados nas vagas daquele porto

“Iayê, iayê, ê ê, iaiô, ê ê iaiô
ô ô oni onã, iaiê onã iaiê, oni onã
iayê, iayê, ê ê, iaiô, ê ê iaiô
ô ô oni onã, iaiê onã iaiê, oni onã...”

perante aquele canto de mar
suave canção de areia e de pedras do cais
as águas bailavam com suas sereias
enquanto senhorinhas bonitas demais
deixavam seus passos nas nuas areias
ouvindo a canção como de mar morto
daqueles negros nas beiradas do porto

“Iayê, iayê, ê ê, iaiô, ê ê iaiô
ô ô oni onã, iaiê onã iaiê, oni onã
iayê, iayê, ê ê, iaiô, ê ê iaiô
ô ô oni onã, iaiê onã iaiê, oni onã...”

Rangel Alves da Costa


Palavra Solta - uma estranha narrativa



*Rangel Alves da Costa


“Seu moço eu nem te conto cuma tudo aconteceu. E num conto pruquê difici demai de aquerditá. Mai ansim mermo vou dizê um bocadim. Era boca da noite quano eu vi uma luz alumiano pra banda daquele arto. Na hora nem pude imaginar o que era. Ora, seu moço, cuma posso diferençar logo uma luz alumiano tom forte no breu da noite? Quano me dei conta já vi uns homi diferente atrais de eu. Cada um artão, cum os oio pareceno faiscano. Falr num falava não, apena eu ouvia uma coisa estranha saino como um dizer. Eles oiaram pa eu de riba a baixo, mandaro eu me virar de lado, de costa, e adespoi balançaro a cabeça, cuma tava dizeno não. Entonce o pió aconteceu. Minha muiá, menina nova, apareceu pela porta com roupa apretadinha, chega mostrava as anca. Num sei pruquê mai eles se animaro na hora. Mai adespoi acunteceu uma coisa que foi de me cortá o coração. Minha muié foi puxada e levada, sumino cum eles. O pió que a danadinha inté parecia sastifeita e sorrino quano sumiu pelo meio do mato. Adespoi a luz sumiu, ouvi um barulhão, gritei pela muié, mai nada dela aparecer. Hoje vivo só de arecordação de minha Tuquinha, que tina umas anca larga e o resto todo bom. E eu aqui oiano pro arto dia e noite que é pa ver se ela é jogada de riba”.


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segunda-feira, 29 de julho de 2019

NO EVOLUCIONISMO HUMANO, MUITA GENTE CONTINUA SENDO CACHORRO, SERPENTE...



*Rangel Alves da Costa


Sou adepto da teoria criacionista, aquela que prega ser o homem fruto do sopro divino, criado por Deus, portanto.
Contudo, ante o que observo em algumas pessoas, de vez em quando sou obrigado a ter uma pontinha de crença na teoria evolucionista da espécie, ou seja, que o homem foi evoluindo de outros animais até alcançar o status atual.
E justifico o porquê da caidinha pelo evolucionismo. Ora, gente há que só pode ter sido originária dos caninos e, como não evoluiu suficientemente, cachorro continua sendo.
Outros existem - e em maior quantidade do que se imagina - que surgiu dos ofídios e serpente continua sendo, pois em nada a evolução lhe ajudou a ter normalidade humana.
Mas tais aspectos são muitas vezes confirmados pelo próprio povo. Quando se diz: “Eita mulher cachorra!”, “Aquilo é um cachorro, mas nem pra latir presta!”, “Isso é cachorrada, de gente cachorra, e não atitude de gente que se respeita!”.
Tudo isso como um reconhecimento da espécie não bem evoluída - ou evoluída de forma deplorável - para justificar a cachorreira existente em muitos.
Com as serpentes não é diferente, ainda que as cobras, muitas vezes, sejam bem menos venenosas que muitas pessoas. As venenosas rastejantes sofreriam com o veneno humano.
Vejam o que se costuma dizer: “Vixe, aquilo é uma serpente, e pior que cascavel!”, “Cobra perde feio pra fulana, daquela boca peçonhenta só sai veneno mortal!”, “Não passo nem perto dela. Aquilo ali já anda de bote armado, Deus me livre!”.
Realmente, muita gente não nasceu para dignificar a espécie humana de jeito nenhum. Pelo contrário, parece tudo fazer para se rebaixar perante os demais. Gente que age pelo erro e vive pelo erro.
Gente que passa e deixar atrás marcas de patas ou de riscos tortos no caminho. Há, nestes aspectos, a demonstração de uma degenerada evolução humana.
Gente que nasceu pra ser gente, para ter dignidade, pra se respeitar e respeitar os demais, pra ter caráter e honra, mas não: continua sendo cachorro, serpente e coisa ainda pior...
Conheço cobras perigosas. Conheço serpentes famintas (também por dinheiro). Conheço peçonhentas de beira de estrada.
Conheço cachorros sarnentos, raivosos, cuja baba é mais que mortal. Conheço cachorro que é pior que o mais ladino dos cachorros de rua.
Com mil desculpas aos verdadeiros cães e serpentes, mas é assim que acontece no reino animalesco humano.
Eita mundinho de gente desacertada!


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Lá no meu sertão...


Sertão... um mundo lá longe!



Quando o amor acontece (Poesia)



Quando o amor acontece


O amor é destino
e como doce destino
nada diz nem avisa
simplesmente acontece

ela que apenas passava
quando novamente passou
o meu olhar brilhou diferente
e um desejo amoroso nasceu

e feito surpresa do destino
aconteceu...

Rangel Alves da Costa


Palavra Solta - o olhar do homem, a percepção da mulher



*Rangel Alves da Costa


Pelas ruas, praias, shoppings e demais passarelas, dificilmente o homem olha para a mulher que passa sem intenções “pecaminosas”. A sensualidade aflora em erotismo, o erotismo da mulher redunda em desejos “impróprios” do homem. É o olhar do homem que fala, que diz, que até grita. “Eita mulher gostosa da porra!”, “Pedaço de mau caminho!”, “Que piteuzinho tesudo”, “Esse rabo é demais!”, e por aí vai. Não eco de voz, não palavra claramente dita, mas a mulher a tudo percebe e, na percepção, prontamente dá sua resposta, diz o que gostaria de dizer. Então rebola mais, erotiza mais o caminhado, sensualiza mais os trejeitos, como se dissesse “fique com água na boca”. Ou faz de conta que não está nem aí. Ora, a mulher - e com razão - gosta de ser apreciada. A maioria não gosta - e também com razão - de cantadas ridículas ou declarações desrespeitosas, mas geralmente apreciam ser olhadas, admiradas e desejadas. E surgiu-me agora aquela história da mulher nua de vestido longo. Ela passou de vestido tão longo que chegava aos pés. Roupa decente, bem comportada, mas que, aos olhos de muitos, seguia completamente nua. E assim por que o olhar quer e o desejo imagina.


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sábado, 27 de julho de 2019

FOLHAS E OUTONOS



*Rangel Alves da Costa


As folhas morrem no outono... Tudo parece morrer no outono. E o que não morre é simplesmente levado pela ventania como um fim ainda em vida, como um exaurimento ainda com esperança de mais existir.
Já final de outono, paisagem desoladora, folhas ressequidas, tons lancinantes, entristecimentos. Quase todas as folhas já haviam desfalecido e levadas pela ventania, ou simplesmente caído no chão de leito ocre, marrom, acinzentado. Sem cor.
As árvores nuas choravam suas ausências. Mas a mesma dor da perda de toda estação. As folhas que ainda restavam dependuradas davam seus últimos suspiros. Frágeis demais, sem mais seiva alguma nas veias, sentiam-se estalando até no sopro da brisa.
Uma árvore onde só restava uma folha, já conhecendo que naquele mesmo dia ficaria totalmente despida, tomou coragem e falou: Minha querida folha, eis que nosso tempo é curto aqui na terra. Nas mãos do homem não durarei muito tempo. E você, tão jovem, e tendo de partir ao entardecer de hoje.
A folha estava fraca demais para expressar qualquer sentimento ou demonstrar reação. E por isso mesmo foi buscar, lá no fundo da alma, um restinho de força para perguntar por que partiria ao entardecer daquele dia. Foi quando a árvore respondeu que o vento passaria ali para levá-la bem alto, juntinho às portas do jardim do céu. Só isso.
A árvore viu a folhinha chorar pela última vez. Neste momento nem pensou duas vezes em proporcionar-lhe um pouco de força nos seus últimos instantes. E avisou-lhe que antes de partir teria seiva suficiente para conversar tudo que quisesse com o vento. Se o seu argumento fosse bom, talvez ele nem a levasse consigo naquele dia.
E, por dentro do tronco, adentrando as galhagens e chegando até o seu corpo esquálido e quebradiço, fez chegar o tanto suficiente de seiva que durasse até os últimos raios avermelhados do entardecer. Sabia que este era o momento de o vento, tal qual trem na estação, apitar e partir. Era assim, todo outono e o trem da estação chegava para as tristes partidas.
Sem saber o que a árvore havia providenciado, ao receber a seiva a folha ficou espantada com a súbita energia que se viu tomada. Sentiu até encorajamento para gritar; cantaria uma ária se houvesse ali outra folha para ouvi-la. O corpo enrijeceu-se, ganhou outra cor no semblante, os olhos brilharam e começou a enxergar melhor. E assim pôde ver quando o vento se aproximava.
Percebeu que era o vento do entardecer que vinha chegando por causa das árvores agitadas e de folhas e restos de folhas esvoaçando pelo ar. Sentiu arrepios, uma frieza por todo o corpo. Fechou os olhos e orou. Despediu-se dessa vida sem querer partir. Ao abrir os olhos viu a face do vento à sua frente.
O vento era bonito, porém parecia cansado e tristonho. Daí que seu rosto quase não se movia, não se agitava como todo vento faz. Com os olhos fixos naquela que levaria naquele momento, espalhou uma leve e perfumada aragem pela boca ao dizer: Está pronta para partir? A folha não conseguiu responder. Não queria partir de jeito nenhum. E se perguntou por dentro: Por que toda folha tem de morrer no outono?
Sentindo que ela não respondia, e entendendo muito bem os motivos daquele silêncio, o vento continuou a falar: Consigo enxergar sua dor e seus sentimentos. Mil lenços não enxugariam as lágrimas que chora por dentro. Também choro por dentro quando faço assim, quando levo pelo ar essas sombras do outono. E choraria muito mais se não soubesse que para vocês, talvez para todos os seres, a partida não significa morrer completamente.
A folha, gélida, continuava em silêncio. Mas o vento continuou: Com a partida, a chegada de outras vidas; com a morte, a ressurreição. Há um renascimento em tudo. Não demorará muito e novas folhas nascerão aqui mesmo nesta árvore. E no outono seguinte também terão de partir. Mas vou lhe contar um segredo que nunca revelei a ninguém.
Fale, fale. A folha conseguiu dizer. E ouviu: As folhas que levo simplesmente ficam espalhadas pelo ar. Depois não sei o destino que tomam. Mas com você farei diferente. Conheço um caminho onde as folhas entram novamente na fila para retornar já na próxima estação. E assim você poderá partir agora e depois voltar para o mesmo lugar. Aceita?
A folhinha jogou-se aos braços do vento, feliz e contente porque retornaria ao mesmo lugar. E o vento soprou forte, rumando sem destino. Estava desnorteado, angustiado demais, gritando e chorando por dentro. Havia mentido para a folhinha. Não haveria retorno, senão noutra folha, noutra vida.
Eis que as folhas simplesmente morrem no outono. As folhas também morrem. Também. Mas tudo como uma fábula para a compreensão da existência e seu significado, da vida e sua transitoriedade, do caminho e da curva adiante. Eis que o humano é folha. E o vento sempre o chamado ao final da estrada.


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Lá no meu sertão...


Sertão, entardecer...





De lágrima e chão (Poesia)



De lágrima e chão


Um dia
eu fiz uma fonte

outro dia
eu fiz um tanque

depois
eu fiz um riacho

e depois
eu fiz um rio

e mais tarde
eu fiz mar

e por último
eu fiz um oceano

quando as lágrimas
enfim secaram

então caminhei
no leito aberto da solidão.

Rangel Alves da Costa


Palavra Solta – os retratos do casarão



*Rangel Alves da Costa


O passado e o casarão. O passado no casarão. Histórias, memórias, baú do tempo, lembranças, tristezas, alegrias, saudades, tudo no casarão. Casarão suntuoso, paredes de quase um metro de largura, portas e janelas imponentes e um dia feitas na madeira de lei e que cupim não rói. Quartos, salas, cozinha, dependências espaçosas para acolhimento de relíquias, móveis antigos, louças, cristais, oratórios, cristaleiras, mesinhas e objetos antigos por todo lugar. Tudo tão belo e grandioso, tão triste e tão perfeito, tão enaltecedor e tão nostálgico. Mas nada igual aos retratos do casarão, as velhas molduras, as fotografias amareladas e suas faces distantes. Pelos corredores, nas salas, nos quartos, por todo lugar a presença daqueles retratos antigos. Olhares imponentes, gestos firmes, posturas de uma nobreza indescritível. Tudo assim num livro aberto perante o olhar. Mirar a fotografia é como sentir o diálogo com o passado. Olhar atentamente para o retrato é como estar perante alguém presente. E com palavras e vozes: talvez assim um dia será... Ou talvez não. O passado distante soube guardar suas memórias. E o presente apenas passa.


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sexta-feira, 26 de julho de 2019

VOCÊ JÁ BRINCOU DE ENVELHECER?



*Rangel Alves da Costa


Você pode até querer avistar-se, agora, com o rosto envelhecido de setenta ou oitenta anos. E ao enxergar-se dizer que espera que seja assim mesmo, pois de feição ainda bonita e sem grandes transformações, ou logo se preocupar com a aparência indesejada, ou mais castigada, na imagem apresentada. Tudo uma questão de querer decifrar o amanhã. Contudo, resta saber se a pessoa, no passo da vivência, pode confirmar se o futuro será assim mesmo. Daí necessário não se iludir muito com a aparência de amanhã se ao longo da caminhada as coisas nem sempre acontecem como desejadas.
Mas a verdade é que pelo mundo inteiro, milhões de pessoas andam envelhecendo seus rostos através do aplicativo FaceApp. Um modismo que se tornou verdadeira febre nas redes sociais. Por meio da ferramenta tecnológica, utilizando uma fotografia atual, o internauta obterá uma imagem como se já envelhecido estivesse. Eis o denominado envelhecimento virtual que viralizou pelo mundo. Contudo, indaga-se: será que a imagem captada será a mesma ou parecida com aquela do envelhecimento natural?
Eu jamais me submeteria a tal brincadeira. E não apenas pelo perigo da exposição de dados e imagens pessoais, os quais ainda se duvidam sobre sua transparência e finalidades, mas principalmente pelo fato de que eu jamais iria me enganar comigo mesmo. Ora, minha feição futura, com mais rugas ou menos rugas, com aspecto de folha outonal ou primaveril, somente o tempo e a idade poderão captar. E tudo se transforma de tal modo que sempre será impossível imaginar sequer a proximidade da feição de amanhã.
Errôneo imaginar que mais adiante as pessoas estarão apenas mais envelhecidas. Errôneo pensar que o envelhecimento vai acontecendo apenas num percurso de normalidade. As estruturas vão fragilizando, o vigor vai perdendo potência, a pele vai perdendo seu viço e as rugas mapeando o quanto se caminhou. Nada acontece como uma brincadeira de como será. Tudo acontece numa junção de fatores: o que foi feito, o que está sendo feito e o que talvez aconteça. Assim por que a velhice é também como uma resposta ao que se foi e o que se foi no passado. E principalmente a resposta imediata ao instante da velhice, atenuando ou diminuindo suas características e consequências.
Há envelhecimento que não envelheceu pelo tempo, mas pela dor, pelo sofrimento, pela carência, pelo abandono. Há envelhecimento que não envelhece apenas pela idade, mas pela perda dos planos, dos sonhos e das esperanças. Há envelhecimento profundo em quem ainda sequer ao período próprio da velhice. Há envelhecimento onde a velhice é mais jovial que a própria juventude. Há envelhecimento que se interioriza de tal forma que uma face sem rugas já está totalmente desvalida por dentro. Há envelhecimento onde a velhice já forçou tanto sua entrada, já produziu tantos efeitos negativos, que a simples presença causa espanto e dor.
E vejam o seguinte. Nas curvas da vida, de repente o percurso normal é desviado por surpresas indesejadas. Aquele que trabalhou a vida inteira objetivando ter uma velhice amparada e segura, de instante pra outro sente que o seu futuro não será nada promissor. Sabe que sua aposentadoria o fará empobrecer, a pobreza se tornar em aflição e sofrimento, e o padecimento ir tomando todas suas forças, desde o ânimo de viver ao encorajamento para seguir adiante. Acaso assim não fosse, certamente que suas rugas não aparecerão mais cedo, seu semblante não definhará tão rápido, seu organismo não se mostrará um celeiro de enfermidades.
Tem-se, assim, que a velhice não é representada apenas no aspecto ou na imagem física. O desamparo aos envelhecidos é dramático no Brasil. As políticas de diminuição de seus direitos, como no caso das aposentadorias, são verdadeiras punhaladas naqueles que tanto lutaram. A saúde, a economia, a política, as regras do jogo de apertar ainda mais o cinto de todo mundo, são atitudes até criminosas tomadas contra a velhice. Na verdade, até mesmo os direitos constitucionais são negados aos idosos. E como saber a feição da velhice perante tamanho aviltamento?
Ante a chegada da velhice, o que se deseja apenas é que a mesma seja respeitada e que o idoso possa viver com consideração e dignidade. Não adianta o idoso maquiar sua feição se sua fragilidade será imposta por forças externas. Sua capacidade de ter um belo envelhecimento depende muito também do outro. Daquele outro que não pode, mas negligencia seus direitos. Daquele outro que diminuindo seus parcos valores de aposentadoria, também diminui sua capacidade de existência e dignidade.
Há, assim, que se encarar a velhice como realidade futura bem diferenciada de uma mera brincadeira de envelhecer. O envelhecimento virtual não consegue captar a velhice interior. O aplicativo FaceApp não mostra o histórico de vida, o percurso para se chegar àquela feição. Como dito, o amanhã depende do ontem, do agora e, principalmente, de fatores que fogem ao desejo humano.


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Lá no meu sertão...


Sertão



Canção de chegada e partida (Poesia)



Canção de chegada e partida


Oi de casa
oi de fora

senhora
dona da casa

senhor
assim forasteiro

dê-me água
tô com sede

dou água
e dou um pão

e agora
já me vou

Deus te guie
no sertão

inté mais
dona senhora

bata na porta
algum dia

porta fechada
poeira adiante

assim a vida
lá longe...

Rangel Alves da Costa


Palavra Solta – não me arrependo de ter amado



*Rangel Alves da Costa


Não me arrependo de ter conhecido a menina que depois se tornou minha namorada. Acaso meses e anos voltassem no tempo, eu jamais queria estar noutro lugar senão naquele do inusitado primeiro encontro. Não me arrependo de amar e tanto amar a mulher que se fez minha namorada. Eu precisava desse amor, eu precisava amar assim. E nela encontrei um sorriso grandioso e belo bem dentro do coração. Não me arrependo de nada junto a ela, dentro dela, em tudo nela. Nela encontro carinho, afeto, afago, amor. E não há que se arrepender de ter encontrado aquela que o destino já havia, desde muito, me reservado. Não me arrependo, pois, que o destino me tivesse levado até onde ela estava, colocando-me perante ela e mostrado a mulher que eu não demoraria a amar. Coisa mais estranha. Não conheço, nunca troquei uma só palavra, e de repente o despertar do amor. Não me arrependo de tê-la avistado ao longe e mesmo distante achado tão bela. Também não me arrependo de ter caminhado até onde estava e, ao seu lado, calmamente esperar que prestasse atenção à minha presença.Não me arrependo de ter gostado dela desde aquele momento, mesmo sem qualquer aproximação, mesmo sem qualquer diálogo, mesmo sem a esperança do sorriso. Ora, já não podíamos fugir de nós mesmos: o destino quis, o destino assim fez!


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terça-feira, 23 de julho de 2019

RECORDANDO DOUGLAS, O FUSCA



*Rangel Alves da Costa


Já tive carro. Um Baja de vermelho forte, chegando ao vinho, com pneus potentes, grandes e todo reformado para embelezamento. Meu fusca tinha até nome: Douglas. Ai se meu fusca falasse!
A verdade é que Douglas fez moda em Poço Redondo, no sertão sergipano, e região. Muitos amigos ainda recordam das peripécias e aventuras naquele carro. Eles mesmos - os amigos - muito aprontaram com o meu carro e dentro dele.
Festeiro que só, não havia festança em Monte Alegre, Glória ou Porto da Folha, pra que o turbinado não riscasse por lá. E chegando era logo reconhecido pela imponência do carango possante.
Mas o motorista não era muito bom não. E não era bom porque era eu o tal do motorista. Na verdade, eu nunca fui bom de volante, de freio, engrenagem, marchas e coisa e tal.
Certa feita eu até virei um Fiat (de Givaldo) bem no local mais perigoso da ladeira de Canindé, município vizinho a Poço Redondo, descendo em direção ao rio. Ladeira tão perigosa que o seu histórico de tragédias se avolumava.
O volante não me atendeu e foi virar bem do lado da serra, pois se fosse para o outro lado só Deus sabe o que teria acontecido. Sem saber o que fazer, apenas coloquei toda a força nas mãos tentando levar o carro na direção do pé da serra.
A direção atendeu, mas no impacto virou. O carro de pneus para cima e eu - ainda sem sentir qualquer dor - simplesmente sentado ao lado e à espera que algum veículo passasse. Lá mesmo o carro foi vendido para o ferro velho.
Mas com Douglas foi diferente. Andei saindo fora da pista, mas nada grave. Andei dando barbeirada que só. Tinha gente que se soubesse que eu era o motorista não entrava nele de jeito nenhum.
Nunca foi bom de volante mesmo. Ser motorista é algo que não combina comigo de jeito nenhum. Outra vez, parei o carro no meio da rua, numa parte mais descida, e já ia saindo quando percebi o fusca em movimento.
E olha só a besteira que fiz: tentei para o carro com o pé. Isso mesmo. Coloquei o pé esquerdo embaixo do pneu que ainda hoje tenho marcas do estrago efeito. Só parou no meio-fio.
Era o carro seguindo sozinho e eu com o pé machucado olhando e sem poder fazer nada. Mas sinto saudades dele. Era um amor de verdade. Ainda recordo que dormi dentro dele assim que o adquiri. Dormiria novamente acaso ainda estivesse comigo.
Hoje é apenas uma boa recordação. Mas logo estarei com outro carro. Não um fusca, e sim outro carro que seja como um cavalo bom, pois todos os finais de semana estará cortando estradas e veredas em busca do melhor que há no sertão: as pessoas simples, humildes, e suas vivências nos afastados da cidade.
É pra isso que quero e tanto preciso de um carro, um meio de me aproximar e conviver ainda mais com o sertanejo do campo, porteira adiante, debaixo da varanda, bebendo água de moringa e me deliciando do doce da palavra. Mas aviso: não serei o motorista.


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Lá no meu sertão...


Uma digna senhora...



Um velho num velho entardecer (Poesia)



Um velho num velho entardecer


Quando o entardecer chega na estrada
quando os horizontes cintilam fogueiras
quando o sol poente chameja vermelho
quando as folhagens aquietam em silêncio
quando passarinhos procuram seus ninhos
quando a brisa sopra uma velha canção
quando os canteiros sem enchem de ocres
quando os sinos se preparam para ecoar
quando toda a vida é mais silenciosa
então o velho senhor se põe a conversar
conversa com o vento e com a ilusão
de ter um bom amigo de tão fiel coração

e conta sua vida e toda sua saudade
rumina as queixas e brada os queixumes
fala baixinho quando o dizer é amargo
quando relembra os seus e suas saudades
quando revive a estrada e suas passagens
quando lacrimeja os segredos guardados
quando chora a dor de tantos adeuses
até que a noite chega trazendo a lua
e naquela face a frágil luz da existência
a lâmpada da vida que já tão calejada
sabe que sua estrada é de curta jornada.

Rangel Alves da Costa


Palavra Solta - o dono do rio e o tubarão



*Rangel Alves da Costa


Raí é um moço de Poço Redondo, no sertão sergipano, que inventou ser o dono do Rio São Francisco, naquela parte que margeia a povoação ribeirinha de Curralinho, seu berço de nascimento. Achando-se dono, também se arvorou no direito de proibir muita coisa. Avisou que se eu chegar por lá, imediatamente manda me deportar pro outro lado do rio, pras bandas do Pontaleão. Mas a culpa é de Belarmino, que inventou ter encontrado um documento onde Raí é reconhecido como Régio Senhor do Rio e seus Arredores, El-Rey das Beiradas e das Serras, Imperador das Águas e Guardião das Carrancas Perdidas. Quer dizer, dono de tudo, de Curralinho e seus arredores. É por isso que RAÍ faz da calçada da Igreja do Conselheiro um trono e vai repetindo: “Tudo isso é meu, meu, meu...”. E quem quiser ir até lá tem de pedir autorização com antecedência. Menos eu, que estou perpetuamente proibido. E tudo isso porque certa feita eu postei uma fotografia com ele correndo por medo de uma piaba. E gritando: “Socorro, socorro, o tubarão quer me pegar!”.


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segunda-feira, 22 de julho de 2019

SER APENAS O QUE SOU



*Rangel Alves da Costa


Ser apenas o que sou. E apenas isso. Ser minha própria imagem e semelhança. Ser apenas o que gosto de ser, o que gosto de fazer, o que me traz praz e contentamento.
Eu bem que poderia estar pisando no asfalto, passeando pelos shoppings ou pelos calçadões, mas eu estou aqui.
Eu bem que poderia ser adorador do terno e da gravata, devoto do anel no dedo, abnegado ao termo “doutor”, mas eu estou aqui do jeito que você é e como você está.
Eu bem que poderia chegar, fazer o que eu tenho a fazer, e depois simplesmente partir, mas eu vou onde você está.
Eu bem que poderia simplesmente passar por você, fazer que nem lhe reconheço mais e seguir adiante, mas eu lhe conheço sim, falo sim, abraço sim.
Eu bem que poderia caminhar pelas rodas de um carro, avistar o mundo atrás de um vidro fumê, sequer buzinar perante sua presença, mas eu vou caminhando e sorridente até onde você estiver.
Eu bem que poderia não me esforçar para lembrar o seu nome, mas sinto necessidade de lhe chamar como é conhecido e relembrar sobre tudo o que sei.
Eu bem que poderia não ir além do centro da cidade, não adentrar em ruelas, não visitar o chão batido, não avistar a pobreza, mas de nada disso eu sou distante.
Eu bem que poderia dizer além do que sou, subir estrelas em pedestais, mas bem sei que à escada sobe-se através do chão.
Eu bem que poderia não ser como sou e forjar ser outro, mas outro eu não sei ser. E principalmente ser diferente daquele em mim tanto gosta de povo, gente, de terra e de chão.
Eu bem que poderia negar minhas origens, omitir minhas raízes, ocultar de onde vem e por onde escorre o meu sangue, mas meu orgulho é ser sertanejo.
Eu bem que poderia aprender a dizer sempre não, mas não sei, mas não sei fazer assim, e tudo faço para dizer sempre sim.
Eu bem que poderia não estender minha mão à mão calejada de luta, fingir que não conheço o de roupa rasgada ou de pés descalço, fazer de conta que não é do meu mundo aquele mais desvalido, mas eu já não seria eu, e em mim eu já não estaria.
Eu bem que poderia pedir cardápios, conhecer as cartas de vinhos, mas prefiro o sabor e o prazer de uma comida de cozinha simples, principalmente se feita em panela de barro e saboreada na gulodice.
Eu bem que poderia escolher um perfume importado, de nome difícil, mas sei que o seu aroma não se compara ao cheiro da pele do jeito que a pele é.
Eu bem que poderia não ter muito tempo nem para a lua nem para o sol, bem como não dar muita atenção às flores dos beirais das estradas e aos calangos em cima das pedras, mas converso e dialogo com tudo isso.
Eu bem que poderia ser diferente. Mas eu sou apenas eu. E um igual a você.


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Lá no meu sertão...


Tempo, tempo...



Uma casa velha (Poesia)



Uma casa velha

                                               
Era uma vez
uma casa velha de portas fechadas
de janelas fechadas e sem voz ecoando

era uma vez
um silêncio e uma solidão na casa velha
que fazia entristecer quem ela olhava

era uma vez
uma ventania querendo entrar
pelas portas e janelas da casa fechada

era uma vez
um graveto de pau e uma folha seca
querendo morar naquela velha casa

era uma vez
uma moça bela ao entardecer na janela
e cheiro de café torrado vindo da cozinha

era uma vez
o meu amor que um dia se foi embora
e minhas mãos fechando a casa e partindo.

Rangel Alves da Costa


Palavra Solta - olhe a bunda dela



*Rangel Alves da Costa


Creio ser indiscutível que a maioria das mulheres brasileiras gosta de expor seus atributos físicos. Desde muito que o Brasil, lá fora, é reconhecido e lembrado pelas dadivosas ancas femininas. Diga-se, de antemão, não ser exagero ou tara masculina, vez que, como se diz, muitas fazem por onde. Exemplo disso está em grande parte das fotografias postadas nas redes sociais. A mulher esconde tudo, mas não a bunda. A mulher se retorce toda para empinar a bunda. A mulher se posiciona perante o espelho para dar um melhor ângulo ao tamanho da bunda. E, muitas vezes, posta só o formato da bunda mesmo. Quer dizer, a bunda parece ser aquilo que mais se deseja mostrar. E mostra mesmo, à vontade. Algumas até fazem enchimentos para que o bumbum pareça ser mais volumoso e atraente. A cultura da bunda. Apenas isso.


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domingo, 21 de julho de 2019

AMIGOS E AMIZADES



*Rangel Alves da Costa


Amigos e amizades são temas que possuem aparência compreensível demais, mas cujo aprofundamento revela feições bem mais delicadas. Ter um amigo não significa ter sua amizade. Amizade é interior, enquanto o amigo pode estar apenas exteriormente. Por consequência, a amizade é algo muito mais difícil de ser conquistado do que um amigo.
A amizade se mantém, não se detém. Mas só se consegue manter amizade quem também sabe manter uma necessária distância do amigo. Amizade em demasia acaba provocando expectativas que nenhum amigo poderá sempre retribuir. E na falta da sempre esperada retribuição, logo o desgaste e o distanciamento.
Erroneamente, pessoas confundem amizade com cumplicidade, com confessionário, com revelações de toda a sua vida e todo o seu viver. Nem sempre confiam em familiares ou em pessoas de mais idade que estejam aptas a ouvir e aconselhar, mas tudo revelam às amizades, principalmente àquelas mais recentes. Ora, as recentes amizades mais parecem descidas do céu. Um erro. Um grande erro.
Amizade não se contenta em apenas fofocar, em revelar segredos amorosos, em dar as mãos para farras, bebidas, noitadas. Pessoas assim até se tornam íntimas, mas não amigas. Isso ocorre muito nas novas amizades. E amizades novas geralmente surgem entre pessoas que não tinham proximidade, pouco se falavam, pouco se conheciam. E por que, de repente, essa pessoa se torna a pessoa mais acreditada no mundo?
Logicamente que mais um erro no que se tem por amizade. Na verdade, determinadas amizades surgem como entrega absoluta entre pessoas praticamente desconhecidas. E se já conhecia, por que não nutriu amizade? É algo surgido como fantasia, como encantamento, como verdadeira magia. E logo será dito que Deus no céu e a amiga na terra. Uma pessoa conhecida de poucos dias e já tornada a mais importante do mundo. E não raro que logo vem o coice e a queda.
Toda amizade vai sendo construída no tempo e mantida na confiança. Não existe amizade de momento. O amigo sempre é, sempre está, sempre permanece. Por isso mesmo que é fácil perceber o que motiva uma amizade duradoura. As pessoas não se traem por que se confiam, as pessoas não se usam por que se respeitam, as pessoas já se conhecem de tal modo que cada uma conhece muito bem os limites.
Não é necessário que a todo instante a amizade vá sendo demonstrada. Ótimas amizades existem que até pouco se encontram, pouco se falam, mas cuja força é percebida em determinados e difíceis momentos da vida. O bom amigo chega na hora da necessidade, da precisão. Mas a amizade nutrida na intimidade não tem esse compromisso. A intimidade apenas busca um proveito pessoal, de segredos e revelações, mas não de estender a mão e até fazer sacrifícios quando o outro necessitar.
A amizade nutrida apenas na intimidade é de fragilidade tamanha que amanhã poderá se tornar em inimizade de fogo a sangue. Por quê? Ora, pelas fofocas, pelas conversinhas, pelas revelações, pelas traições. E bem feito que assim aconteça. Há gente que prefere acreditar no desconhecido a ter confiança naquele que sempre esteve ao lado, que já conhece seus atributos de caráter e honra.
Tudo pode acontecer. Pessoas existem que não são amigas nem de si mesmas. E estas não servem para fazer amizade com absolutamente ninguém. Contudo, não é fácil perceber. Resta ler as muitas ou poucas páginas de sua história e observar se prefere andar com lobos ou cordeiros.
Nunca espere, contudo, que sua vida dependa de um amigo. Nunca se sabe o que virá. Aquele que se mantem oculto de repente chega para servir muito mais que o outro ali ao lado, que sempre se disse à disposição. Assim acontece pelo fato de ser sempre mais fácil dizer do que fazer. Na hora da necessidade, então se pergunta aonde foi aquele que estava ali.
Contudo, é preciso acreditar nas pessoas. Também necessário que as pessoas creiam na existência de grandes e verdadeiros amigos. Ao menos para fazer valer a beleza dos versos da canção: “Amigo é coisa pra se guardar debaixo de sete chaves, dentro do coração...”.


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Lá no meu sertão...


Mas sempre sertanejo...



Apenas você (Poesia)



Apenas você


Tua voz
apenas uma palavra
o teu mar
apenas um teu olhar
a tua pétala
apenas a pele tua
um carinho
apenas o teu abraço

nestas noites frias
queria apenas você
apenas você.

Rangel Alves da Costa


Palavra Solta – vaqueiros e drogados



*Rangel Alves da Costa


Ontem, sábado, foi dia de festa grande no Parque de Vaquejada União Santa Fé. Mas já na manhã deste domingo, através de pessoas confiáveis de Poço Redondo, no sertão sergipano, acabei tomando conhecimento de uma situação deveras preocupante. Segundo os relatos presenciados na Santa Fé e arredores, o uso de drogas está sendo feito de modo indiscriminado e por todo lugar. Jovens se deixam avistar prontos para cheirar pó, jovens se embrenhando pelos escondidos para fazer uso de todo tipo de droga. E tudo feito em meio a famílias, idosos, adolescentes e até crianças. Certamente que por ali também transitando traficantes e outras pessoas perigosas demais. Pelo que vem acontecendo, significa dizer que aquela arena esportiva está sendo utilizada para fins outros, totalmente ilícitos, e bem diferentes de seus reais objetivos. Ora, a vaquejada é esporte de garra, de valentia e de encorajamento, e não comunga com as práticas viciantes destes acovardados. Necessário se faz que a direção do parque, a Associação dos Vaqueiros e os demais que não comungam com tal situação, tomem imediatas providências. Necessário também se faz que a força policial passe a ter forte presença a cada evento esportivo. E mais necessário ainda que o Ministério Público local seja informado sobre o que vem acontecendo, de modo a instaurar os procedimentos necessários à apuração das responsabilidades. E devidamente punir.


Escritor
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sábado, 20 de julho de 2019

APENAS SER O QUE SOU



*Rangel Alves da Costa


Eu bem que poderia estar pisando no asfalto, passeando pelos shoppings ou pelos calçadões, mas eu estou aqui.
Eu bem que poderia ser adorador do terno e da gravata, devoto do anel no dedo, abnegado ao termo “doutor”, mas eu estou aqui do jeito que você é e como você está.
Eu bem que poderia chegar, fazer o que eu tenho a fazer, e depois simplesmente partir, mas eu vou onde você está.
Eu bem que poderia simplesmente passar por você, fazer que nem lhe reconheço mais e seguir adiante, mas eu lhe conheço sim, falo sim, abraço sim.
Eu bem que poderia caminhar pelas rodas de um carro, avistar o mundo atrás de um vidro fumê, sequer buzinar perante sua presença, mas eu vou caminhando e sorridente até onde você estiver.
Eu bem que poderia não me esforçar para lembrar o seu nome, mas sinto necessidade de lhe chamar como é conhecido e relembrar sobre tudo o que sei.
Eu bem que poderia não ir além do centro da cidade, não adentrar em ruelas, não visitar o chão batido, não avistar a pobreza, mas de nada disso eu sou distante.
Eu bem que poderia dizer além do que sou, subir estrelas em pedestais, mas bem sei que à escada sobe-se através do chão.
Eu bem que poderia ser egoísta, boçal, demagogo, e me adornar de ilusões para simplesmente querer ser mais que o mundo, mas todo dourado enfeia minha cor de couro e minha tez de areia.
Eu bem que poderia não bater em sua porta, não levar sorriso no olhar nem palavra boa comigo, mas eu sei o quanto deseja e precisa do olhar e da palavra.
Eu bem que poderia não aceitar seu café quentinho, não beber água em caneca, não querer sentar em sua mesa, mas agindo assim eu seria muito diferente do que realmente sou.
Eu bem que poderia não ser como sou e forjar ser outro, mas outro eu não sei ser. Eu bem que poderia negar minhas origens, omitir minhas raízes, ocultar de onde vem e por onde escorre o meu sangue, mas meu orgulho é ser sertanejo.
Eu bem que poderia aprender a dizer sempre não, mas não sei, mas não sei fazer assim, e tudo faço para dizer sempre sim.
Eu bem que poderia não estender minha mão à mão calejada de luta, fingir que não conheço o de roupa rasgada ou de pés descalço, fazer de conta que não é do meu mundo aquele mais desvalido, mas eu já não seria eu, e em mim eu já não estaria.
Eu bem que poderia ser diferente. Mas eu sou apenas eu. E um igual a você.


Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

Lá no meu sertão...


Presente de luxo (e de gostosura)



Essência (Poesia)



Essência


Amo-te
quero-te
és meu amor
dizer assim
sem nada
dizer

o amor
é silêncio
é sensação
é sentir
e sentido
sem palavra

a palavra
dizendo ama
ecoa
a essência
que somente
o coração
pode expressar.

Rangel Alves da Costa