SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



quinta-feira, 31 de outubro de 2013

CAVALOS CONTRA CANHÕES


Rangel Alves da Costa*


Quando saiu ileso da chacina de Angico em 38, episódio que pôs fim ao cangaço e custou a vida de Lampião, Maria Bonita e mais nove bandoleiros, o cangaceiro Cajazeira começou a cimentar uma carreira pessoal tão própria dos jovens rebeldes e sonhadores. Certamente não sabia que dali em diante viveria acossado e perseguido e cerca de quinze anos depois teria que colocar cavalos para enfrentar canhões.
Apelidado no bando de Lampião como Cajazeira, caminho trilhado ainda jovem e acompanhado de sua bela esposa Enedina, o seu nome de batismo era José Francisco do Nascimento, também conhecido por Zé de Julião. Era filho, pois, de Julião do Nascimento e Constância do Nascimento, família das mais abastadas da povoação sertaneja de Poço Redondo, então distrito de Porto da Folha.
De tanto presenciar a polícia volante maltratando pobres sertanejos, violentando inocentes para que dissessem acerca do paradeiro do bando cangaceiro e extorquindo impiedosamente os pequenos e grandes proprietários de terras e rebanhos, o filho de Seu Julião tomou uma drástica decisão: iria entrar no bando de Lampião precisamente para dar o troco àquela volante injusta e desumana. E cumpriu com o prometido.
Estava presente na Gruta do Angico na madrugada de 28 de julho de 38. Conseguiu fugir, mas não conseguiu livrar sua esposa das balas famintas. Após a chacina, cangaceiros foram presos e os fugitivos se viram rastreados pela polícia, e por muito tempo. Cajazeira, ou Zé de Julião, desolado pela perda da esposa, decide não se entregar e foge para o sul da Bahia. Contudo, não demora muito e toma o caminho de volta para o seu Poço Redondo. Não sabia que o sanguinário sargento Deluz, perseguidor voraz de ex-cangaceiros, está à sua espera.
O desalmado militar, contudo, não consegue colocar as mãos no filho de Seu Julião. Mas era perigoso demais continuar se escondendo. Seu destino foi o Rio de janeiro, onde foi de servente a empreiteiro em pouco tempo. Contudo, recebe a notícia da morte do pai e tem de retornar para resolver problemas de herança e dar um basta naquela mania de perseguição do sargento Deluz. Dizem que “molhou a mão” do malvado e resolveu a questão.
Retornou aos negócios no Rio, mas já com a intenção de logo fazer o caminho de volta e colocar em prática um sonho antigo: ser prefeito de sua terra natal. Mas isto só seria possível quando a povoação fosse desmembrada das terras buraqueiras, o que ocorreu em 1953. Portanto, já havia se passado cerca de quinze anos do fim do cangaço quando Poço Redondo foi emancipado e Zé de Julião decidiu disputar a primeira eleição para prefeito.
Bastou que essa decisão fosse tomada para que as cinzas do cangaço crepitassem novamente e as perseguições irrompessem com toda voracidade. Ora, um ex-cangaceiro não podia afrontar as forças políticas regionais, segundo diziam as principais lideranças interessadas na administração do novo município. Resoluto, o moço de Poço Redondo não abriu mão de sua pretensão. Então os canhões adversários começaram a abrir fogo.
O candidato das forças políticas regionais era Artur Moreira de Sá, de Porto da Folha. E a primeira estratégia de campanha foi espalhar o boato que Zé de Julião não poderia ser candidato porque era um ex cabra de Lampião, perigoso e malfeitor, um reles bandido, e ninguém podia aceitar um cangaceiro como prefeito. Mas o ex-cangaceiro não se intimidou e enfrentou o candidato do poder. Deu empate: 134 votos para cada candidato. Mais velho, Artur Moreira acabou sendo proclamado vitorioso.
Sentindo-se cada vez mais forte, o poço-redondense resolveu disputar as eleições seguintes. O prefeito já havia se bandeado para as hostes de Leandro Maciel, que havia assumido o poder estadual. E a política leandrista era também conhecida pela implacável perseguição aos inimigos. E Zé de Julião era seu inimigo político. E como chegaria ao poder municipal um ex-cangaceiro, perseguido e inimigo do poder estadual, quando todos sabiam que as mentiras e intimidações se repetiriam? Com efeito, não só se repetiram como foram de imoralidade e desonestidade sem precedentes.
Foi então que Zé de Julião colocou cavalos contra canhões, e estes representados pela força governamental que utilizava todo o aparato existente para derrotar as pretensões dos oponentes. Desse modo, assim que souberam que o ex-cangaceiro disputaria o pleito, logo cuidaram de não entregar os títulos a seus eleitores, além de perpetrarem as maiores vilezas possíveis para barrar de vez seu favoritismo.
Sabendo que não teria qualquer chance de vitória diante da corrupção, da fraude, do suborno e outras infâmias eleitorais, o ex-cangaceiro arregimentou alguns amigos leais e juntos invadiram seções eleitorais na sede e no povoado Bonsucesso. E roubaram as urnas montados em cavalos afoitos e corredores. Era a única forma de mostrar a indignação contra a podridão do poder. E foi assim que os cavalos enfrentaram os canhões.


Poeta e cronista
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O beijo e o queijo (Poesia)


O beijo e o queijo


Dê-me um beijo
que dou um queijo
beijo molhado
é queijo coalhado
beijo apressado
é queijo ralado
beijo com paixão
vale um parmesão
metade de beijo
é pedaço de queijo
beijo safado
é queijo assado
beijo com devoção
merece um requeijão

mas se quiser
o queijo e o pão
além do beijo
quero o coração.


Rangel Alves da Costa

PALAVRAS SILENCIOSAS – 422


Rangel Alves da Costa*


“O tempo pode fazer o que quiser comigo...”.
“Inevitável que seja assim...”.
“Afinal ele transforma tudo...”.
“Comanda a vida e o destino...”.
“Traz o desalento e o cansaço...”.
“Os reumatismos e outras doenças...”.
“Recurva corpo e diminui o passo...”.
“Torna-nos mais solenes e tristes...”.
“Enche as paredes de fotografias...”.
“Faz esquecer os modismos...”.
“E nos coloca entristecidos diante do espelho...”.
“Eis que surgem as rugas e os cabelos brancos...”.
“As marcas passadas e a distância do olhar...”.
“Assim é o inevitável tempo...”.
“Contudo, jamais permitirei...”.
“Que ele entre na minha esfera sentimental...”.
“No meu íntimo mais íntimo...”.
“Lá onde guardo o melhor que possuo...”.
“Para me fazer esquecer daquilo...”.
“Vivenciado entre flores e espinhos...”.
“Por isso mesmo tempo...”.
“Não se atreva a mexer na minha memória...”.
“A esconder minha bola de gude...”.
“Não esconda meu cavalo de pau...”.
“Não dê sumiço à minha bola de meia...”.
“Deixe em paz minhas noites de antigamente...”.
“Os meus dias ensolarados de brincadeiras...”.
“Minhas carreiras e tropeços pelos descampados...”.
“Nem pense em destruir meu papagaio enfeitado...”.
“Em desfazer de minha peteca baleadeira...”.
“Em sumir com minhas pontas de vaca...”.
“Em esvaziar minha bola de espuma...”.
“Por mais que você, tempo...”.
“Possa tudo fazer...”.
“Comigo há de se ver...”.
“Se esconder as velhas fotografias...”.
“Minha nudez infantil...”.
“Correndo pelas ruas em dias de chuva...”.
“Haverá de prestar contas...”.
“Se esconder meus brinquedos...”.
“Se rasgar meus primeiros versos...”.
“Se riscar do caderno o nome de minha namoradinha...”.
“Se me fizer esquecer o primeiro beijo...”.
“Se murchar aquela flor que ainda guardo...”.
“Se me tirar da memória...”.
“Os cafunés de minha avó...”.
“O bolo de macaxeira...”.
“O doce de leite de bolas...”.
“As estórias tantas que ouvi um dia...”.
“Não afaste de mim meu bicho-papão...”.
“Os seres encantados da mata...”.
“Nada disso tente afastar de minha vida...”.
“Pois tudo o meu verdadeiro ser...”.
“Que envelhece...”.
“Mas continua menino sertanejo...”.
“Traquina, rebuliçoso...”.
“Tão sertanejo...”.


Poeta e cronista
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quarta-feira, 30 de outubro de 2013

TRÊS DOIDOS


Rangel Alves da Costa*


Pode faltar tudo numa cidade, desde parteira ao sacristão, desde carteiro ao entregador de leite, mas doido não pode faltar de jeito nenhum. Aliás, o doido é a própria simbologia da insanidade urbana, pois sempre haverá de ter um escolhido diante de tantos.
O doido se torna tão característico e próprio do lugar que ninguém acostuma viver sem suas graças, seus destrambelhamentos, suas maluquices. E também seus enfurecimentos, suas transformações e perigosas atitudes. Ainda assim, mesmo doido que cause perigo e temor, sempre fará falta no cotidiano citadino.
Por isso mesmo que em todo lugar há um doido símbolo, outros tantos doidos de gesto e ação, e muito mais nos escondidos da falsa sanidade. Ademais, absolutamente ninguém pode ser tido e havido como mentalmente sadio. E viver normalmente não significa muita coisa, bastando lembrar os tresloucamentos do pai da teoria da relatividade. Aquela língua de Einstein é coisa de gente sadia?
Verdade é que há doido de todo tipo e todo jeito; mais e menos doido; doido de lua e de sol; de pedra na mão ou sorriso na face. Tem doido que já nasce assim, mentalmente afetado; outros que vão sendo chamados pela loucura; e ainda outros que se mantêm na perigosa fronteira. E estes sãos os mais perigosos que possam existir, pois sempre na feição comum do povo. Na minha e na sua loucura em estado latente.
Afirmo que nós, os ditos normais, somos os doidos mais perigosos porque reputamos como loucura a ação do mentalmente afetado e fingimos não perceber que de repente agimos de forma até mesmo inaceitável para um doido varrido. Quantas vezes, mesmo tendo plena consciência da gravidade do erro, simplesmente abrimos a cancela dos piores impulsos?
Mas os doidos são eles, são os outros, continuamos dizendo. Numa fragilíssima tese de defesa, continuamos afirmando que os doidos são aqueles que jogam pedras nos passantes, que ameaçam com paus e o que tiver adiante, que conversam sozinhos, que vivem no mundo da lua. Dizemos que os doidos enlouquecem ainda mais nas noites de lua cheia, em determinadas estações do ano, em determinados momentos do dia.
Tudo isso imputamos a eles, mas fazemos loucuras o dia inteiro. Fazemos muito mais, e muito pior. E ninguém me pretenda dizer que é normal do ser humano praticar o mal premeditadamente; agir contrariamente à lógica da vida, ao senso de responsabilidade, ao dever para consigo mesmo. Ninguém me venha dizendo que é próprio do instinto humano a propensão assassina, a sanha destruidora, a inversão da racionalidade.
É reconhecida loucura experimentar o que vicia, transforma, humilha e destrói; será sempre insano fingir que não enxerga as dolorosas realidades e não sente o quanto é degradante se entregar aos fictícios prazeres; não passa de absoluta insanidade enxergar apenas nos outros os erros costumeira e gravosamente cometidos.
Ora, diante dos ditos normais, os tidos como doidos são seres inofensivos, são borboletas em jardins, são colibris matinais. Doce é a loucura do querer voar em direção à lua, de se apaixonar pelo seu clarão e disso fazer uma razão de viver; compreensível é o olhar amedrontado, desconfiado, rápido, querendo encontrar o desconhecido; aceitável é a manifestação afoita, exacerbada, incomum, pois diferente apenas para quem não compreende a loucura. E não se aceita como ser também transtornado.
Queiram aceitar ou não, mas em cada ser humano tido como normal não há apenas um louco, um doido, um insano, mas três. Isso mesmo, cada pessoa normal é doida três vezes. Por consequência, há três doidos dentro de mim e de você. O primeiro é o doido reconhecível na atitude insana levada a efeito de vez em quando; o segundo é o doido interior, interno, intimista, aquele reconhecível pela própria pessoa, porém temendo revelar aos demais; e o terceiro é o doido instalado no hospício chamado mundo.
Dos três doidos existentes em nós, os dois primeiros podem conviver conosco sem qualquer problema, bastando que reconheçamos nossas loucuras e que compreendamos nossas propensões íntimas. Mas a terceira forma de loucura afeta o homem de tal modo que este se vê sem saída. E o pior é que os seus sintomas são crescentes e tendem a explodir a qualquer instante. E tudo porque ninguém suporta mais viver num mundo de loucos, de atitudes tão alucinadas, sem ter de agir na conformidade do que se pede. Ou seja, ser também absolutamente psicótico.
Loucuras no trânsito, nas relações pessoais, nas ações e atitudes, em tudo. Impossível, pois, viver num mundo completamente louco, ao redor de maníacos e alucinados,  e fora dos muros de seu hospício.


Poeta e cronista
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Depois de tudo (Poesia)


Depois de tudo


Quem amou fui eu
quem sofreu fui eu
quem chorou fui eu
quem partiu foi você

a solidão fui eu
a tristeza fui eu
a angústia fui eu
nada sei de você

quem vencerá sou eu
quem sorrirá sou eu
quem renascerá sou eu
e nada sei de você

quem perdoa sou eu
quem silencia sou eu
mas sei que não sou eu
quem pedirá pra voltar.


Rangel Alves da Costa

PALAVRAS SILENCIOSAS – 421


Rangel Alves da Costa*


“O menino do conto de fada...”.
“Espalhou pedacinhos de pão pela estrada...”.
“Para marcar o caminho...”.
“E mais tarde poder retornar...”.
“Os pássaros atrapalharam os planos...”.
“Ficou perdido na mata...”.
“Mas ele não foi negligente...”.
“Com o seu futuro...”.
“E você, está fazendo o que?”.
“Também está espalhando grãos...”.
“Marcas visíveis pela sua estrada?”.
“É melhor que comece a pensar nisso...”.
“Mesmo que não precise retornar...”.
“Sua estrada já ficou marcada...”.
“E o exemplo serve para tudo que se faça...”.
“Para retornar algum dia...”.
“Ou para viver eternamente...”.
“Na memória que foi construída...”.
“Nos grãos espalhadas pelas realizações...”.
“Se o ser humano desejar não ser esquecido...”.
“Não ser visto apenas como mais um que se foi...”.
“É bom começar a fazer hoje...”.
“O que lhe dê a eterna feição...”.
“É preciso saber que ninguém...”.
“Vai sentir saudades ou recordar...”.
“Daquele que nada fez de dignificante...”.
“Que nada realizou...”.
“Apenas passou pela vida e não viveu...”.
“Diferentemente ocorrerá...”.
“Com aquele que faz...”.
“Que constrói e realiza...”.
“Que é reconhecido pelo caráter benfeitor...”.
“Pelos gestos humanitários que possui...”.
“Pelas amizades e compartilhamentos...”.
“Pelo jeito bondoso de ser...”.
“Eis que certamente...”.
“Não só as pessoas, amigos e familiares...”.
“Mas também o livro dos tempos...”.
“Irá escrever para a posteridade...”.
“Sobre aquele que um dia...”.
“Foi bom amigo...”.
“Foi bom pai...”.
“Bom companheiro...”.
“Que doou...”.
“Que compartilhou...”.
“Que acolheu...”.
“Que sofreu com...”.
“E pelo outro...”.
“Que dividiu sua felicidade...”.
“Com a necessidade do outro...”.
“Que dignificou sua existência...”.
“E por isso mesmo será eterno...”.
“Pois seus feitos terrenos...”.
“São os grãos imorredouros de agora...”.
“E todo o sempre...”.


Poeta e cronista
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terça-feira, 29 de outubro de 2013

PROFESSOR VILDER SANTOS, SE TODOS FOSSEM IGUAIS A VOCÊ...


Rangel Alves da Costa*


Igual peregrino em busca da montanha para alongar sua visão de mundo, tal qual o sábio que espera um discípulo para as boas palavras, como o viajante que na humildade e simplicidade dialoga com pássaros e outros seres, eis a caminhada de Vilder Santos. Ou alguém que anda por aí envolto de luz e sabedoria.
Tarefa difícil qualificá-lo nos seus afazeres, diferentemente de delineá-lo no seu jeito de ser. Professor, radialista, poeta do triverso, pesquisador incansável, é uma verdadeira biblioteca ambulante. Das páginas de sua memória surgirão respostas para todo tipo de questionamento, pois homem culto sem ter a intelectualidade pedante dos especialistas. Folheia mentalmente desde impensáveis manuscritos aos conhecimentos mais atualizados.
Por isso mesmo também reconhecido como verdadeiro baú de antigas curiosidades, de fatos pitorescos de outros cotidianos, de histórias e mais histórias desde que era Aracaju era terra de cajueiros e papagaios. Traz sempre consigo fatos, datas, números, contextos; enfim, o passado na acessibilidade da informação mais confiável. Mas lhe dói recordar o parque Carrossel do Tobias, pertencente a seus pais e tão importante nas tardes natalinas do Aracaju de outros tempos.
Vez por outra o jornalista Luiz Eduardo Costa faz constar de sua página dominical no Jornal do Dia alguma importante relembrança trazida pelo Professor Vilder. Um dado histórico sobre o futebol, o exsurgir das cinzas de um acontecimento já desprezado pelas transitoriedades da vida, precisamente aquilo que não pode ser relegado pelos anais da história sergipana. Acessível a todos, terá sempre como honra ser abordado nas ruas para uma indagação.
De muitos já ouvi que quem não conhecer o Professor Vilder o acaba tomando por um simples caminhante que passa apressado para comprar o pão e o leite; de outros ouvi que dificilmente o passante imaginaria quanta potencialidade intelectual e tamanha grandeza humana acompanha aquele homem de baixa estatura, magro, cabelo baixo, de tez amorenada e sorriso sempre aguardando um chamado. Realmente, Vilder Santos contrasta a primeira visão, pois pequenino e imenso, silencioso e gritante, pacato demais e tão importante.
Importante sim, e de uma importância fundamental para a vida cultural, educacional, histórica e humana de Sergipe. Nascido em família com longas raízes políticas, filho de político atuante, pois seu pai, o saudoso Milton Santos, teve assento garantido na câmara municipal em sete legislaturas e foi figura das mais prestigiadas na política aracajuana, ainda assim Vilder reservou para si outro destino. Frequentou com avidez os bancos escolares, foi estudar em outras cidades, procurou se aprofundar em lições da religiosidade no Curso de Teologia Pedagógica e talvez até tivesse pensado no sacerdócio.
Porém, como dito, seu destino era outro. Abraçou os livros como abraça a vida, fez da busca do conhecimento toda sede e fome que possam existir num homem, percorreu seu caminho como alguém que precisava urgentemente chegar. Mas chegar aonde? Ao berço sólido do conhecimento, à indestrutível seara da formação acadêmica e humana. Daí ter se formado em Letras e Direito pela UFS, além de haver percorrido muitos outros caminhos do saber. E certamente não quis permanecer nas lides jurídicas porque sua concepção humanista e educacional lhe mostrava outro caminho.
Enveredou de vez pelos caminhos da educação, ensinando e aprendendo para ensinar, e se tornou conhecido como Professor Vilder. Seu percurso no magistério é dos mais profícuos. Ensinou no Ginásio Municipal Belém de Maria (em Pernambuco), no Atheneu, no Colégio 15 de Outubro, no Instituto de Educação Rio Barbosa, no Colégio Alcebíades Melo Vilas Boas e em outros centros educacionais. Pela sua cátedra passaram disciplinas como Português, Linguistica, OSPB e Moral e Cívica. Colocado à disposição da UFS durante 15 anos, lecionou Estudos de Problemas Brasileiros e depois Psicologia Geral e Português Instrumental.
É também radialista profissional e verdadeiramente apaixonado pelo rádio. Sua paixão é tanta por tudo que aconteça no rádio que atualmente ruboriza emocionado, como num idílio juvenil, ao falar numa locutora de uma emissora paulista que, segundo diz, possui a voz de despertar corações. Já manteve programa radiofônico regular, mas hoje parece gostar mais de participar como ouvinte ou dando pequenas entrevistas. Por isso que não é difícil encontrá-lo ouvindo um radinho de pilha.
Encontro-o sempre pelas ruas com seu caminhado de cabeça baixa, pensativo, reflexivo, ou no mercadinho pelos lados da seção de frutas e verduras. Parece ser adepto apenas da horta e do pomar. Solteiro, não fuma nem bebe, mas convive e se embriaga com a imensidão de livros que se avolumam e se espalham na sua moradia. Dorme com os livros, sonha com os livros. Sua vida são páginas de todos os livros num só livro pequenino e singelo. E quanta sabedoria em cada página.
Assim é o Professor Vilder. Alguém que anda por aí carregando uma pastinha com poucos escritos. Mas a pujança de sua bagagem está na mente, na inteligência, no conhecimento. Quem dera professor, quem dera amigo Vilder, que todos fossem iguais a você.


Poeta e cronista
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Lágrimas renascidas (Poesia)


Lágrimas renascidas


Não posso esquecer
do mar no olhar
do rio nos olhos
da feroz enxurrada
descendo no rosto
molhando a alma
inundando tudo
e foi assim um dia

mas com as lágrimas
aprendi a navegar
voltar à beira do cais
e nas areias firmes
caminhar decidido
a chorar somente
quando meu peito
transbordar alegria.


Rangel Alves da Costa

PALAVRAS SILENCIOSAS – 420


Rangel Alves da Costa*


“Sou o que sou...”.
“Pedra ou gota de orvalho...”.
“Espinho ou pétala de flor...”.
“Sou como sou...”.
“Sol radiante ou tenebrosa noite...”.
“Larva ou lagarta...”.
“Aragem ou ventania...”.
“Frio ou calor...”.
“Sou como sou...”.
“Porta fechada ou janela aberta...”.
“Livro fechado ou aberto...”.
“Promessa ou pecado...”.
“Mentira ou verdade...”.
“Paz ou dissabor...”.
“Sou o que sou...”.
“Cantiga ou lamento...”.
“Madeira torta ou faca afiada...”.
“Vereda ou estrada...”.
“Carcará ou colibri...”.
“Veneno ou hidromel...”.
“A calma ou o torpor...”.
“Sou como sou...”.
“Silêncio ou gritaria...”.
“Solidão ou companhia...”.
“Tristeza ou alegria...”.
“Tempestade ou chuvisco...”.
“Ilha ou continente...”.
“Cor negra ou sem cor...”.
“Sou como sou...”.
“Relógio ou calendário...”.
“Infância ou a velhice...”.
“Resto ou abundância...”.
“Sede ou oceano...”.
“Presença ou saudade...”.
“Vinho ou vinagre...”.
“Marasmo ou ardor...”.
“Sou o que sou...”.
“Rio ou mar imenso...”.
“Primavera ou outono...”.
“Inocência ou torpeza...”.
“Gente ou bicho...”.
“Agora ou nunca...”.
“Chama ardente ou cinzas...”.
“Verso ou prosa...”.
“Amor ou desamor...”.
“Sou como sou...”.
“Guaraná ou aguardente...”.
“Açúcar ou sal...”.
“Amigo ou desconhecido...”.
“Que está ou já partiu...”.
“Lágrima ou insensibilidade...”.
“Alma ou espírito...”.
“Ladainha ou sermão...”.
“Glória ou lamento...”.
“Se ou nada...”.
“Completo ou apenas...”.
“O que foi e o que ficou...”.
“É o que sou...”.


Poeta e cronista
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segunda-feira, 28 de outubro de 2013

CONVITE






A IMPORTÂNCIA DESSE ALGUÉM SEM NOME


Rangel Alves da Costa*


Segundo o Gênesis bíblico, no sexto dia Deus criou o homem e a mulher. Distinguiu, pois, as espécies segundo o sexo. Contudo, o passar dos anos, e para efeito de indicação do ser ou espécie humana, os sexos feminino e masculino deram lugar apenas aos termos homem, sujeito, pessoa ou indivíduo. Tanto é assim que o substantivo homem, dentro de determinado contexto, serve para indicar tanto o homem propriamente dito como a mulher.
Pois bem. Tal introito tornou-se essencial no sentido de reconhecer o poder humano de transformar o dado em algo desejado. Desejou que o termo homem passasse a designar o ser humano em geral, bem como criou outras nomenclaturas para designar a existência de seres humanos espalhados mundo afora. Daí se falar em agrupamento, em coletividade, em sociedade.
Contudo, os novos conceitos, nomenclaturas e designações, bem como a tendência cada vez maior de ver os seres humanos como uma totalidade, no amplo contexto social, não tiveram o condão de ofuscar a importância do ser individual, daquele ser nele mesmo, com suas aptidões. Um ser sem nome, pois apenas em ser em sua plenitude. E a todo instante cresce a importância desse alguém sem nome. Aquele alguém existente em cada um.
Esse alguém sem nome, que é o próprio homem em sua plenitude, está evidenciado em cada ser humano existente na face da terra. E sem nome porque apenas pessoa, e pessoa humana, podendo ser homem ou mulher, menino ou velho, pobre ou rico, de qualquer raça ou cor, habitante de qualquer lugar. Eis que nesse contexto o que importa e merece ser valorizado é a pessoa em si, aquele alguém sem nome identificável, porém tão reconhecível pela sua existência.
Esse alguém sem nome forma a sociedade, está nas regiões mais distantes, nos centros urbanos, nos subúrbios e arredores. Trabalha para o progresso, labuta para sobreviver, se esforça para subsistir. Acorda na madrugada, se sacrifica para chegar ao trabalho, bate o ponto, anseia para ouvir o apito sinalizando o fim da jornada do dia. Também se entrega ao trabalho no campo desde o amanhecer, planta, colhe, e esperançoso suporta os sacrifícios da vida.
Esse alguém sem nome também está nas esferas de poder, nos governos, nos órgãos de mando, mas do mesmo modo encontrado nos barracos das favelas, nos submundos dos lixões, embaixo de marquises, pelas esquinas e ao relento. De família nobre ou apenas mais um de uma origem qualquer, nada disso importa, pois no contexto social todos devem ser reconhecidos na igualdade do ser humano. Por isso apenas pessoa, gente, ser humano, ou um alguém sem nome.
Esse alguém sem nome sou eu e é você. Somos nós. Esse alguém sem nome é aquele que lhe diz não e outro que lhe diz sim; é o amigo e o desafeto; é o parente ou o desconhecido. Não precisa sequer saber da existência do outro, pois sabendo que existe em algum lugar, pois cada um que agora está no seu afazer, na sua lida. E é preciso acreditar que todos, enquanto seres humanos, são igualmente importantes, ainda que apenas um indivíduo vivendo na solidão de uma ilha.
E esse alguém sem nome possui tamanha importância que poucos já tiveram a capacidade de analisar e reconhecer. Eis que ninguém sozinho faz importantes transformações, impulsiona uma revolução, faz uma manifestação para mostrar indignações, ou mesmo modifica qualquer coisa de forma duradoura. Sempre necessitará de apoio, da ajuda do outro, ainda que apenas como agente passivo da ação.
Esse alguém sem nome estava em cada um que já fez a guerra; estava nas lutas renhidas pelos processos de independência das nações; estava segredando revoltas nas escuridões dos porões. E também está, neste momento, traçando alianças, discutindo os destinos dos povos, agindo em nome do poder e em nome do futuro dos todos. Daí que o alguém sem nome pode ser um general, um governante, um líder, uma pessoa qualquer. E sem nome porque qualquer pessoa poderá um dia estar incumbido da tomada de decisões.
Daí a importância desse alguém sem nome, que é a importância de cada ser humano existente na terra. E por isso mesmo não se deve subjugar, discriminar ou desvalorizar quem quer que seja. Todos são importantes naquilo que fazem. Mas principalmente porque ser vivente.


Poeta e cronista
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Colheita (Poesia)


Colheita


Quero amor pomar
quero amor araçá
um beijo na fruta
um lábio vermelho
uma cor de goiaba
um gosto de amora
e a vida inteira
saboreando a presença
e querer sempre mais
dessa doce felicidade
de te amar assim
fruta meiga e jasmim

ai meu amor escute
temo o vento e a estação
o outono e a desolação
e é preciso todo amor
para vencer vendavais
para persistir o pomar
e frutificar ainda mais
para a colheita de amar.


Rangel Alves da Costa

PALAVRAS SILENCIOSAS – 419


Rangel Alves da Costa*


“Faço assim no sertão...”.
“E tanta festa no meu coração...”.
“Dou a benção aos mais velhos...”.
“Levanto ao alvorecer...”.
“Ouço a passarada em festa...”.
“Sinto o cheiro da natureza...”.
“Passeio pelo silêncio das horas...”.
“Sinto o cheiro do café torrado...”.
“Café negro e borbulhante na velha chaleira...”.
“Tomo um gole de café e agradeço ao deus da sabedoria matuta...”.
“Ouço calçadas sendo varridas...”.
“Ouço o cumprimento de vizinhas...”.
“Proseio com um e com outro...”.
“Vejo alguém passando com uma gaiola de passarinho...”.
“Vou adiante da cidade...”.
“Caminho pelas matarias...”.
“Ouço os bichos correndo...”.
“Sinto os silenciosos mistérios...”.
“Cato a fruta doce do mato...”.
“Fico encantado com tudo ao redor...”.
“Passa um boi...”.
“Passa um cavalo...”.
“Um vaqueiro passa...”.
“Tudo passa no sertão...”.
“Vejo o sol despontar...”.
“Vejo o sol imenso e ameaçador...”.
“Mas a aragem ainda persiste...”.
“E logo dará lugar ao calor devorador...”.
“Ouço o sino da igrejinha tocar...”.
“A beata passa toda solene...”.
“Vai estremecendo os lábios em oração...”.
“Vejo uma porta aberta...”.
“Vejo uma janela aberta...”
“Vejo um papagaio falador...”.
“Vejo um menino traquina...”.
“(Ah, quanta saudade dá!)”.
“Vejo um papagaio subindo no ar”.
“Vejo outro menino correndo...”.
“(Saudade, triste saudade!)”.
“E um pião sendo arremessado...”.
“O leiteiro passa...”.
“Sinto um cheiro bom de cuscuz da terra...”.
“O som de um rádio ecoa...”.
“Uma música oferecida a alguém que está distante...”.
“A lavadeira passa com suas roupas...”.
“A fateira segue em direção ao riachinho...”.
“Me dá uma sede danada...”.
“E a fome do amanhecer...”.
“Uma caneca de água de moringa...”.
“Um pedaço de bolo de macaxeira...”.
“Melhor seria o café com cuscuz...”.
“Mas é assim...”.
“Na terra sertaneja o ter qualquer coisa é riqueza...”.
“Um bolo de macaxeira é joia preciosa...”.
“Eis que nessas manhãs...”.
“Os choros meninos também ecoam...”.
“Nos casebres sem nada para oferecer...”.
“Ou ao menos iludir a fome...”.
“Mas fome é bicho difícil demais de enganar...”.


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domingo, 27 de outubro de 2013

BARAÚNA SERTANEJA


Rangel Alves da Costa*


Tipicamente nordestina, com moradia e chão pelos esturricados caboclos, a baraúna simboliza a grandiosidade da natureza sertaneja. Mas não somente isso, pois seu tronco, sua raiz, suas galhagens e seu sombreado, representam o convívio cordial entre o homem e o meio mais inóspito.
Imponente, grandiosa e robusta, a baraúna é uma das mais belas filhas da caatinga. Certamente vaidosa, faceira demais, solene, porém solitária. Sozinha no meio do tempo, mas dizem que prefere que assim aconteça. Sozinha na imensidão catingueira, assim amanhece e anoitece com a certeza que será visitada pelo viajante e por qualquer um que passe pelos arredores.
Conhece histórias de arrepiar, mas também de alegria e encantamento. Já avistou o impossível de ser avistado, já foi soprada pelo vento mais feroz que podia existir. Presenciou instantes de paz e de guerra, foi cama e alento da luta cansada; foi berço e quietude depois da refrega. Foi respingada de sangue de incontáveis emboscadas; ouviu o jagunço chorar por não poder fugir de sua sina sanguinária.
É filha de outro tempo, de um tempo onde o sertão ainda era só mataria, vereda, espinho e bicho por todo lugar. Viu quando os primeiros aventureiros chegaram de facão na mão, cortando tudo, derrubando tudo, abrindo caminhos e tirando de vez a paz do lugar. Sentiu a lâmina na sua pele, sangrou, mas era forte demais para ser derrubada por qualquer um. E lá permaneceu para viver e fazer parte da própria história do sertão.
Entristeceu de chorar ao sentir as grandes transformações que a cada dia iam surgindo. Amiga do frescor do vento, dos animais, dos seres encantados, foi percebendo tudo ficar mais escasso e diferente. Crescida e vivendo ao lado de aroeiras, angicos, cedros, craibeiras, jatobás, bonomes, além de infinidade de catingueiras e gameleiras, aos poucos viu a mataria fechada sendo descoberta, mostrando uma triste e desoladora nudez. E o sumiço angustiante de suas irmãs de mataria.
O tempo passou, quase tudo foi sendo arrancado, derrubado, destruído, e somente ela permaneceu em pé na sua moradia. Hoje já se sente envelhecida, com marcas profundas na sua alma, quase apenas uma sombra do muito que já foi um dia. Diferentemente do que ocorria antes, quando os caminhantes a procuravam aflitos para o descanso, hoje é ela que tanto precisa ser visitada, se sentir ainda capaz de dar conforto e servir de repouso.
Por isso sorri quando avista alguém ao longe e chora demais em cada despedida. A cada um dá um adeus como se não fosse mais avistá-lo; a cada um acena o lenço na folhagem e silenciosamente grita que tenha sorte na estrada. E estrada sertaneja que ficará mais triste e desolada quando não mais restar nenhuma grande árvore no seu percurso. E tudo pela mão da sanha cruel e devoradora do progresso.
Após cada partida, depois de enxugar as lágrimas que escorrem pelo tronco, se põe a pensar no seu percurso de vida, na sua história. E recorda que não só dava sombra e cama aos viajantes cansados como servia de quarto de repouso também para os animais. Os bichos ficavam tão contentes debaixo dela que nem precisavam ser amarrados para não fugir. Os viajantes deitavam ali cansados, mas sempre com tempo de sonhar sonhos bons e todos eles como se a baraúna estivesse falando com eles. Siga adiante, mas faça isso e não faça aquilo se quiser me ver novamente. Era o que a danada dizia a todo mundo.
Mas não era só isso não, pois o seu tronco passou a servir também como espécie de oratório, como uma igrejinha a céu aberto aonde todo viajante se ajoelhava para rezar, fazer suas promessas ou simplesmente conversar com Deus, com os anjos e os santos. Um dia quiseram cavar sepultura ao seu redor, mas não deixaram, afirmando ser árvore da vida e não da morte. Porém mais de vez velaram pessoas debaixo dela, choraram a dor da partida e da saudade. E sem esquecer que muitos tombaram sem vida diante do seu olhar.
Eis que a baraúna conheceu Lampião e seu bando, mas também a volante raivosa e desregrada. Gostava quando o Capitão do sertão chegava por ali porque ele sempre guardava um tempinho para um segredo ao pé do seu ouvido. E quase sempre dizia que haveria um tempo que até os mais destemidos, como ele e a baraúna, se dobrariam ao destino. Pois tudo haveria de ser assim. Porque tudo assim naquele imenso sertão.

Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com 

A palavra (Poesia)


A palavra


Por enquanto não
nem beijo nem abraço
apenas a palavra

por enquanto não
nem nudez nem volúpia
apenas a palavra

por enquanto não
nem cama nem sexo
apenas a palavra

quando a palavra conhecer
a pessoa, o corpo e a mente
então tudo pode acontecer

mas por enquanto não
precisamos merecer
o dizer te amo.


Rangel Alves da Costa

PALAVRAS SILENCIOSAS – 418


Rangel Alves da Costa*


“Sou sertanejo...”.
“Sou da terra árida...”.
“Sou áspero e destemido...”.
“Mas também sou fraco e triste...”.
“Tenho um sol na cabeça...”.
“Tenho uma lua no olhar...”.
“Tenho tanta fé...”.
“Tenho tanta religiosidade...”.
“Tenho uma vela acesa no meu coração...”.
“Caminho descalço...”.
“Caminho sozinho...”.
“Sigo ladeando flores...”.
“E experimentando espinhos...”.
“Sou amigo da pedra bruta...”.
“E do preá corredor...”.
“Tenho moradia na mata...”.
“Sou filho da catingueira...”.
“Parente do angico, da baraúna...”.
“Sou primo da umburana e do angico...”.
“Minha família é grade, sim senhor...”.
“Tenho parente em todo lugar...”.
“Nos campos devastados pelas estiagens...”.
“Nas coivaras enfumaçadas...”.
“Debaixo das locas misteriosas...”.
“No barro seco do tanque...”.
“Boi e cavalo falam comigo...”.
“E respondo satisfeito...”.
“Carcará e nambu também me cumprimentam...”.
“E abraço todos eles...”.
“Até com fogo-corredor eu converso...”.
“Mas gosto mesmo de prosear...”.
“Com meus conterrâneos...”.
“Meus irmão de sangue e chão...”.
“Aquele que é matuto...”.
“Aquele que é caipira...”.
“Aquele que é caboclo...”.
“Ou simplesmente sertanejo...”.
“Tudo como eu sou...”.
“Um cristão filho da aridez...”.
“Um cristão perfumado de flor...”.
“E um apaixonado pela minha terra...”.
“Pelos seus santos e mártires...”.
“Seus beatos e milagreiros...”.
“Seus valentes e cangaceiros...”.
“Seus coronéis e jagunços...”.
“Que família grande, seu moço...”.
“Tem Lampião, o Capitão do Sertão...”.
“Tem Padre Ciço, o Santo do Sertão...”.
“Tem Antônio, o Beato Conselheiro do Sertão...”.
“Tem Frei Damião, o Missionário Milagreiro do Sertão...”.
“E também tem eu...”.
“E quem eu sou...”.
“Um sertanejo...”.
“Só isso...”.
“E não queria ser mais...”.
“Apenas sertanejo...”.
“Só isso...”.
“E que felicidade de ser tudo isso...”.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

sábado, 26 de outubro de 2013

ADQUIRA A BIOGRAFIA DE ALCINO ALVES COSTA


Escrita por Rangel Alves da Costa, seu filho, e intitulada “TODO O SERTÃO NUM SÓ CORAÇÃO - VIDA E OBRA DE ALCINO ALVES COSTA”, a biografia do saudoso Caipira de Poço Redondo já pode ser adquirida por seus amigos e admiradores.


Com 288 páginas, a biografia cuida de todo percurso de vida daquele que foi verdadeiro guardião da história sertaneja. O livro é dividido em tópicos específicos, cuidando dos diversos aspectos de sua vida. Do nascimento ao adeus, tudo é descrito de forma verdadeira e abrangente.
O livro, pois, está assim dividido: Prefácio (por Júlio César Ischiara); Introdução (por Archimedes Marques); Em 1940...; O homem; O político; Poeta, compositor, radialista, pesquisador do cangaço...; A obra; Prefácios que dizem tudo; Escritor sobre escritor: Paulo Gastão no mundo de Alcino; Dias de Agonia; O legado de Alcino para a cultura nacional; As homenagens.
 O livro está à venda ao preço de R$ 50,00 (postagem incluída). Para adquiri-lo proceda do seguinte modo: Efetue depósito bancário identificado na conta abaixo identificada, a seguir envie e-mail para o autor com o endereço para a postagem.
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Banco do Brasil; Conta Poupança nº 69.544-0; Agência 2961-0; Variação 51.

E-mail para envio do endereço: rac3478@hotmail.com


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PALAVRAS DE AMOR PARA UM OUTONO QUALQUER


Rangel Alves da Costa*


Há instantes em que a grandeza do amor passa a se afeiçoar com a paisagem do outono. O coração florido, o contentamento do ser, a alegria da comunhão, tudo se transforma na fragilidade da folha que agoniza seus últimos instantes.
Eis que o amor também perde a seiva; eis que o querer também se indaga sobre sua razão de ser; eis que a sequidão também chega ao beijo e a aspereza enlaça o abraço. E todo aroma e perfume da alma que ama tende ser levado pela ventania antes que exale para fortalecer a relação.
E tudo fica tão difícil e triste, tudo tão doloroso e angustiante. O outono se vai com a esperança de renascimento em outra estação, de ressurgir para o ciclo da existência, mas nem sempre assim ocorre com o amor. De repente se vai e completamente se esvai, pois a ventania da incompreensão pode seguir por curvas indesejadas.
Mas sempre haverá esperança para os que compreendem o outono e nele folheia um livro ensinando superar as ameaças e dificuldades do amor. E livro que fala em adeuses e despedidas, em tristezas e melancolias, em solidão e padecimento, mas também em renascimento.
E no folhear das horas entristecidas de saudades tantas, ali encontrará verdadeiras lições para superar as angústias e aflições:
Mire-se na folha seca, na folha frágil, na folha apenas fim. Perdeu a seiva como o amor perde o viço e o encanto. A folha espera a ventania e sabe que vai partir. Não há nada que possa fazer naquela estação. Mas o amor pode superar ventanias e vendavais, tempestades e ameaças, bastando que queira renascer sem ter de morrer.
Mire-se nas folhas mortas, nas folhas caindo, no chão tomado de cores frágeis, de levezas sem vida. Tudo ali sequer sabendo que será juntado e incinerado, transformado em fuligem para esvoaçar pelo tempo. Mas o amor, ainda que caído e ferido pelas circunstâncias, não se deixa levar para o esquecimento. Espera o vento e alça voo para, lá em cima, voar como pássaro que vai em busca do seu ninho.
Mire-se nas tardes tristes, nas cores cinzentas do entardecer, no jardim abandonado, nos bancos encimados por folhas mortas, no silvar lúgubre da ventania, na tela triste esquecida pelo pintor solitário. Que paisagem e cenários terríveis, dolorosos, angustiantes. O amor tem essa mesma feição todas as vezes que é tratado como um outono qualquer. Caberá aos dois renovar o jardim e prepará-lo para a nova estação.
Mire-se nos ninhos ocos, vazios, abandonados, nos galhos cinzentos e secos, nos troncos retorcidos e quebradiços, na feição tristonha da natureza e tudo ao redor. Tome como exemplo a solidão ali existente, a falta de canto passarinheiro, as cores mornas do entardecer. Desse jeito é o coração vazio, o sentimento fragilizado, a desesperança amorosa, a dor pelo distanciamento. E o amor não obedece a um ciclo inevitável, e por isso mesmo pode ser renovado a qualquer instante.
Mire-se na ideia que as pessoas fazem do outono, como elas fogem do outono, como elas falam de forma tão entristecidas sobre essa estação. E sequer consideram que é apenas um ciclo natural que inevitavelmente acontece. Por que acontece assim? Ora, simplesmente porque possuem outonos escondidos na alma e lhes amedrontada o simples pensamento sobre sua existência. Daí que a relação amorosa deve também reconhecer a inevitabilidade de seus outonos.
Mire-se no calendário, nas suas folhas, nos dias que vão passando, no tempo. Mire-se nas horas se preciso for. Mas procure entender que nada é contínuo ou eterno, que tudo passa. Algumas coisas morrem, outras se transformam para continuar existindo. E a vida do amor precisa saber o qual futuro lhe é desejado. Ser o último outono, ou ser este e mais outros, e no percurso as flores vivas e perfumadas para alimentar o querer?


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

Pássaro, pássaro... (Poesia)


Pássaro, pássaro...


Pássaro, pássaro
quem sou eu para voar contigo?

pássaro, pássaro
quem sou eu para tão belo ninho?

pássaro, pássaro
quem sou eu para cantar assim?

mas pássaro, pássaro
quem é aquele esquecido na revoada?

será pássaro que ficou sozinho
ou será eu passarinho?


Rangel Alves da Costa

PALAVRAS SILENCIOSAS – 417


Rangel Alves da Costa*


“Alguém disse...”.
“Que a noite desperta sua luz...”.
“Que o vento sente falta da brisa...”.
“Que a memória é feita em cada instante...”.
“Que a realidade é a verdade refletida adiante...”.
“Que as nuvens são olhos imensos...”.
“Que as lágrimas caminham por um rio imenso...”.
“Alguém disse que...”.
“O amor é uma ilusão do sentimento...”.
“O frio é a ausência do outro...”.
“A canção canta sozinha ao coração...”.
“O silêncio fala pelo pensamento...”.
“A solidão na pessoa que sai de si mesma...”.
“A saudade sempre viaja voando...”.
“Alguém disse...”.
“Que o sofrimento é um troco pelo que foi feito...”.
“O amanhã já está rabiscado no hoje...”.
“A morte é um limite de guerra...”.
“O voo sem asas tem ninho no pensamento...”.
“O livro fechado é uma dolorosa prisão...”.
“A folha seca é caderno ao poeta...”.
“O doido não é tão maluco quanto o sadio...”.
“Diante da sede o vinho será água...”.
“O céu da boca é moradia de um anjo que fala...”.
“A beleza nunca se aperfeiçoa aos olhos da inveja...”.
“Há um nó em nós que precisamos desfazer para viver...”.
“O pássaro chora o seu ninho além...”.
“Os moinhos de vento voaram na estação...”.
“Alguém disse...”.
“Eu te amo por falta de outra palavra mais verdadeira...”.
“Eu retornarei, porém sem passagem de volta...”.
“Partirei no trem de qualquer estação...”.
“Sou apenas uma sombra esperando um sol...”.
“A vela se acende sozinha pela fé...”.
“Anjos não podem ser aprisionados em gaiolas...”.
“Conjuga-se o verbo perante a situação...”.
“Escrevi com a boca e falei com as mãos...”.
“Como um pedaço de poesia e me farto de amor...”.
“Considero seriamente em considerar mais a vida...”.
“Sou e estou muito além do lugar em que me colocam...”.
“Sinto paixão e me vejo com coroa de espinhos...”.
“A falta de álcool me faz ébrio pelas capacidades...”.
“Um dia virá que não estarei mais aqui...”.
“Pois alguém disse...”.
“Alguém disse que...”.
“Além da janela há uma porta para tudo...”.
“Não deixe o diário contar segredos...”.
“Depois de chorar vou me perfumar e sair...”.
“As curvas da estrada fazem voltar ao mesmo lugar...”.
“Amor-perfeito é apenas uma flor...”.
“O adeus deveria ser dito na volta...”.
“A fumaça do trem desenha um rosto chorando...”.
“Todo o futuro nas mãos de um segundo...”.
“Agora ou mais tarde...”.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com