*Rangel Alves da Costa
Vasculhando baús antigos, rebuscando na
poeira dos tempos algum conhecimento escondido, eis que encontro um retrato
ilustrando uma notícia que me chamou bastante atenção. Retrato antigo, em preto
e branco, com uma senhora e seus dois filhos, um menino uma menina. Pelas
vestes, gente importante, de relevo social. Contudo, o mais instigante está na
inscrição baixo da fotografia, onde se lê:
“Nos bolsos de ‘Lampeão’, depois do combate
de Angicos, foi encontrado um maço de fotografias, entre elas um retrato do
tenente João Bezerra, cuja tropa o abateria. A fotografia acima estava em meio
aqueles documentos e é de pessoas que não foram identificadas por nenhum dos
oficiais ou civis que a viram detidamente. A divulgação provavelmente resultará
nessa identificação”.
Acaso seja verdadeira tal informação, ou
seja, que Lampião levava consigo um maço de retratos e dentre os quais o de
João Bezerra, fato que, desde já, pessoalmente reputo como duvidosa, muita
indagação ainda há de surgir daquelas antigas veredas.
Por que Lampião levaria consigo um retrato de
seu algoz, do comandante responsável pela sua morte? E ainda: Qual o interesse
de Lampião em levar consigo fotografias de pessoas inusitadas ao contexto
histórico? Por que logo uma fotografia de seu perseguidor? Por que um retrato
dessa mulher com seus dois filhos?
Antes de me permitir algumas possíveis
respostas, atento para uma reportagem divulgada à época do massacre de Angico,
onde o Jornal O Povo, de 3 de agosto de 1938, relata acerca dos objetos conhecidos,
mas que não foram encontrados com o Capitão Virgulino. Eis a manchete:
“Desapareceu um anel de alto custo roubado por Lampeão”, e no subtítulo:
“Também não foi encontrado o colar que o bandido trazia ao pescoço”.
Quer dizer, o jornal menciona acerca do roubo
dos objetos pessoais de Lampião, porém em nenhum momento se refere ao achado
tão importante e historicamente significativo nos seus bolsos ou no seu
embornal. E tais fotografias certamente logo despertariam a atenção dos
jornalistas. Então surgiria uma manchete do tipo: “Ao ser morto, Lampeão levava
no bolso fotografia de seu algoz”.
Mas se tais fotos existiram mesmo, então
outras perguntas logo surgirão, por exemplo: Lampião mantinha consigo o retrato
do tenente Bezerra para reconhecê-lo melhor assim que o encontrasse? A
confirmação de tal hipótese logo refuta a ideia de que eram conhecidos, até
amigos, já tendo se encontrado diversas vezes.
Ora, se eram amigos, se se conheciam, não
havia motivação alguma para que o líder cangaceiro carregasse no seu bolso ou
embornal um retrato de um comandante da polícia volante que vivia em seu
encalço. Certamente não seria por recordação de amizade ou por que alguém o
teria presenteado com aquela foto.
Mas por quê? Não me recordo ter lido nada
neste sentido. Comumente, quando um inimigo está no encalço de outro e não o
conhece, é normal que leve um retrato. E assim será mais fácil confirmar quando
do encontro. Mas se, como alguns ainda insistem em dizer, Lampião e Bezerra
mantinham conluios, então por que o saudoso retrato junto ao Capitão?
E sobre o retrato daquela mulher e seus
filhos? Será que Lampião estava na intenção de, como fizera em 1922 com a
Baronesa de Água Branca, tomar de assalto a residência de tão proeminente
figura? Ou mantinha o retrato consigo por ser uma recordação familiar ou de uma
amizade distante? Nada disso pode ser confirmar.
Também muito difícil de confirmar a
veracidade dos fatos envolvendo a presença de tais retratos junto ao Capitão
Lampião. Acaso se confirme, há muito mais mistérios envolvendo Lampião e João
Bezerra do que imagina nossa matuta filosofia.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com