Rangel Alves da Costa*
Flertes, traições, trocas de carinhos e carícias, sussurros de alcovas, encontros adulterinos, bilhetinhos suspeitos, janelas entreabertas para depois serem puladas, bigamias, lascívias, sentimentos dilacerados e corrompidos, corações apaixonados. E tanta paixão, tanta devoção, para depois experimentar o amargor do esquecimento.
Tudo muito parecido com as descrições obscenas de Henry Miller; os relatos feitos por Flaubert sobre a devassidão da burguesia palaciana francesa; as aberrações prazerosas relatadas por Sade e Masoch; as imposições sexuais dos coronéis amadianos. Minha doce Messalina, fichinha és diante do fato novo.
Falo do que está pensando mesmo, mas não revelo, ao menos por enquanto, os nomes dos envolvidos e nem as situações em que as promiscuidades se revelam. Poderia ser num bordel, num fundo de quintal, numa alcova, em quartinhos escondidos. Mas os traídos e traidores, os amantes e abandonados todos conhecem, pois acostumados em bater sua porta.
Parece enredo de filme, mas não. Nélson Rodrigues esboçaria uma trilogia cômico-erótica daquilo que chamaria o devasso mundo das inclinações sexuais da política, contando a história de uma decente jovem que, envolvida por promessas, acabou sendo deflorada na sua inocência. Hoje mundana, sem honra nem caráter, vive sendo manipulada pelos cafetões do poder.
Ora, é sabido por todos que a política surgiu no meio social acobertada das maiores virtudes e como voz em defesa da população. Do seu seio vislumbrava-se a participação popular, as lutas pelos direitos, a prevalência do justo perante as tantas injustiças. Contudo, bonita demais no seu jeito de ser, logo foi sendo disputada por partidarismos e transformada no que se tem hoje por política partidária. Uma promíscua, infelizmente.
E foi o começo de sua derrocada, de sua desonra, de sua devassidão, da perda das grandes virtudes que muitos ainda confiavam existentes. Por mais que fingisse continuar merecedora de respeito e acatamento, tudo era desfeito assim que corria boca a boca o que os pleiteantes faziam em seu nome. Assim, pelas mãos de políticos astutos, interesseiros e ardilosos é que se viu jogada na lama.
Ao transformar-se em política partidária, forçosamente viu-se denegrida na sua imagem, desacreditada por grande parte da população. E, o que foi pior, usada e abusada como objeto de volúpia pelos que dela dependem para dar azo às suas inclinações impuras, corruptivas, promíscuas. Sem perceber já estava objeto de qualquer um, passada de mãos em mãos, na meretrização partidária.
E como no jogo de interesses não respeitam nem a si mesmos, transferiram o de mais abjeto e promíscuo para o seu nome. Por isso mesmo que muitos - pessoas decentes ainda existentes - torcem o nariz, sentem náuseas, avermelham de enraivecimento quando ouvem sua menção: política partidária. Inegavelmente alcançando sinônimo de vulgaridade, de objeto de deleite de qualquer um e de ninguém, pois nada querem senão o gozo das benesses eletivas.
Sua feição de hoje ainda é de uma jovem muito atraente, cheia de qualidades convidativas e apaixonantes. Contudo, desrespeitada nos seus princípios, sempre usada para a prática de interesses escusos, tida como meio para mais facilmente se chegar às portas da corrupção, da improbidade, das roubalheiras e enriquecimentos ilícitos. Coitada, inofensiva enquanto vítima do próprio poder, nada pode fazer para expulsar do seu leito tantos vermes com suas voracidades.
Igualmente quem faz do comércio do próprio corpo algo com normalidade na vida, sem mais se importar com críticas, olhares e palavras preconceituosas e de discriminação, a política parece ter chegado ao ápice da petrificação da desonra. Nada mais lhe atinge, afeta, incomoda ou faça repensar seu modo de ser e agir. Calada, submetida, apenas deixa ser possuída por aqueles que dela precisam para satisfazer seus desvios.
Impossível não ter como portador de grave desvio moral, ético e comportamental, todo aquele que depois de transformar a inocência da política na maior das devassidões, ainda continue amorosamente deitado no seu leito e dividindo os seus prazeres com tantos outros promíscuos.
Dizem que vive num bordel luxuoso. Mas poucos sabem quanto lhe custa a escravização nas mãos daqueles que usam o seu leito para esconder volumosas quantias debaixo do seu colchão.
Poeta e cronista
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