O sertão possui outro retrato do que
geralmente se retrato. Quem não conhece o sertão, nele só reconhece a miséria,
a pobreza, a desvalia sertaneja. Mas o verdadeiro retrato do sertão é muito
diferente.
O sertão é histórica, geográfica e
humanamente belo. O sertão é meigo, doce e cativante. O bucolismo sertanejo
traduz sempre uma sensação de humanismo, de companheirismo e afeição de um povo.
Suas cores e seus sabores, suas paisagens e
seus segredos, tudo se revela em inigualável pujança. Vaqueiros, rendeiras,
aboiadores, mateiros, pescadores, cordelistas, cantoras de roda, uma infinidade
de belezas e tradições.
Mas nada igual ao luar sertanejo e suas
noites de mistérios e encantamentos, de amores e descobertas, de estrelas e
vaga-lumes. As noites do sertão sempre chegam como véus iluminados perante as
durezas da vida.
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As noites do sertão são lindas, grandes,
imensas, poéticas, nostálgicas, orantes, pedintes. São portas que se abrem ao
alto para, em direção ao luar, buscar os encantamentos da noite e da vida.
Quando as noites chegam e seu manto vai
encobrindo a terra com suas cores sombreadas e escurecidas, logo as chamas do
candeeiro da lua se acendem para tudo recobrir com seu dourado de paz e
encanto.
A muitos, que apenas tratam a noite como
parte escurecida do dia e a lua como o oposto do sol, tanto faz que após o
entardecer os horizontes se encham de fogo e magia, e que os encantamentos
surjam em cada raio de luar e em cada estrela que vagueia brilhosa pelos
espaços.
Nada entendem de noite, de lua, e muito menos
de luar sertanejo. Certamente não sabem que a lua carrega em si o dom da
transformação e em cada dourado que espalha há um descortinar de sentimentos
sem fim.
Igualmente não sabem de quanta simbologia há
num clarão de luar sertanejo. No sertão, o luar não é de lua qualquer, não é
apenas um astro noturno que brilha, não se contenta em ser somente uma luz
clareando na noite.
O luar do sertão é sentimento aceso em fogo e
brasa, é chama que reacende saudades, reencontros e recordações. O luar
sertanejo crepita por dentro como tição e fagulha, como labareda e faísca. E
tanto queima que é preciso cuidado ante sua luz.
Somente a luz do luar sertanejo para afastar
as medonhices da noite e os medos dos esquecimentos. Impossível não abrir
janelas, não reabrir velhos álbuns, não buscar fotografias, não reencontrar
imagens de faces e feições, perante a luz que brilha lá em cima.
Nas noites do meu sertão, nada mais preciso
que a luz do luar. Nas noites do meu sertão, meu coração só quer luar. E no luar
o retrato vivo daquilo que sinto saudade, que amo, que merece ser recordado.
Nas noites do meu sertão, quando a lua se
abre em flor, então os jardins da memória começam a brotar suas pétalas. Olhar
para o alto e se encantar com o amarelado da lua, avistar a luz imensa perante
a escuridão, tudo isso conforta a alma e o espírito.
Nas noites do meu sertão, quando os silêncios
chamam à reflexão, nada melhor que compartilhar da voz interior com a auréola
iluminada que desce do alto e a tudo envolve. Uma lua tão bela e sertaneja, tão
cheia de palavras e vozes, que o silêncio se transforma em poesia e
encantamento.
![](https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh-SDOEUnfR23nJxpxFt72V99rgiEj7sidAmZvc_1Ae07VC1HYO4UO5MfylJigD95wVoo1O34tfYUL_tJowWxXhRkjBHQ5B9z7gBQVXt6h4hrs4_HHt_ftahDUj39RGWdtBuZRXl6Bg9oYW/w400-h229/680b5d3e-89e5-43e0-820d-b1496f354889.jpg)
Bem disse o poeta: “Não há, oh gente, oh não,
luar como esse do sertão...”. E digo mais: Uma luz que pacifica a alma, uma cor
que enobrece o ser, um brilho que envolve todo o coração.
Na noite, nos altos e nas alturas da noite, é
como se as recordações chegassem com a luz do luar. Um cheiro de café torrado,
um cheiro de fogão de lenha. Vagantes vaga-lumes, réstias de candeeiros,
fagulhas ainda vivas das fogueiras do tempo.
E uma canção no vento. Um vento que vem das
montanhas, lá detrás dos montes enluarados, trazendo a cor da lua e o brilho
das estrelas e para, perante o meu silêncio noturno, ecoar uma linda canção de
amor.
De amor ao sertão. De amor à sua lua, ao seu luar.