*Rangel Alves da Costa
Concebo os períodos natalinos e de passagem
de ano como dias de alegrias tristonhas. Mesmo os abraços, as
confraternizações, os desejos de melhores dias, sempre ocultam laivos de
nostalgias, de tristezas e angústias.
Nunca o sol está totalmente aberto nestes
dias. Tudo parece nublado, esmaecido, com cores outonais e paisagens ocres.
Flores tristes, folhas tristes, sopros vagamente aflitivos da ventania. Uma
valsa tão bela quanto cheia de tormento e dor. Entardeceres de luzes opacas
pelas tormentas.
Ora, o que deveria ser tão belo e sublime,
eis que se transforma em instantes de aflição e angústia. Parece até que os
abraços são fingidos, os sorrisos são forçados, as palavras dadivosas não
passam de teatralizações verbais. O exterior esconde muito do que está
interiorizado com outra feição.
Por que assim? Mesmo que os natais simbolizem
nascimentos, renascimentos e esperanças, e a passagem de ano se traduza em
recomeço, em caminhada e busca de dias melhores, não há como apagar o passado
em dias assim. É o não esquecimento do que persistir na recordação que chama a
tristeza e a nostalgia.
Muito bom seria se o tempo novo e o recomeço
estivessem acompanhados do esquecimento de todas as angústias passadas. Mas
assim não ocorre. O pensamento sempre vai atrás daquilo que já faz falta,
daquilo que ficou para trás e que talvez não volte mais. As perdas não são
esquecidas, os adeuses e as despedidas também não.
O contexto do final do ano deveria ser – como
de fato o é – um período de reflexão, de meditação, de reencontro da pessoa
consigo mesma. Uma prestação de contas do que foi feito ao longo do ano. Os
erros e os acertos, as tentativas não concretizadas, o que foi relegado, o que
não existiu pela impossibilidade. Tudo isso na mente, na memória. E tudo isso
trazendo alegrias e tristezas.
E de repente, em meio às alegrias das
festividades e confraternizações, as lembranças surgidas. Um ano de perdas, de
tristezas pelas partidas, de ausências de pessoas que naquele mesmo instante
deveriam estar compartilhando das bebidas e comidas. E também de adeuses já
distantes, pois um período que sempre reabre velhos livros, baús e álbuns de
dolorosos reencontros.
Mas assim o período natalino e de passagem de
ano. Certamente que muitos sequer imaginam o que passou, se o ano foi bom ou
ruim, se acertou mais que errou. Muitos querem e vivem apenas o instante, como
se nada mais tivesse importância. O que passou, passou, e o dali em diante é o
que vale a pena. Ainda assim, impossível que os seus íntimos não sofram calados
os gritos que desejam aflorar.
Não há, contudo, que fingir. Que a alegria
seja plena, que a felicidade seja sentida, mas que a tristeza não permaneça
oculta. Há tempo de tudo, como diz o Eclesiastes, e por isso mesmo não se pode
fingir que tudo será de uma forma. Que as lágrimas desçam, que o pranto
desague, pois o verdadeiro sorriso haverá de logo surgir.
Mas que tenha dias de paz, com mais alegrias
que aborrecimentos. E que os sorrisos sejam sempre mais verdadeiros e pujantes
que os instantes de tristeza e melancolia. Feliz ano novo!
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com