Rangel Alves da
Costa*
A voz do
silêncio silenciosamente chega. Quase num sussurro, quase num murmúrio, numa
ideia de voz, na imaginação.
Mas também
pode chegar como brado, como ruído, com estridência íntima. Mesmo que não seja
ecoada, seu som é tão compreensível como o desejo que se quer ouvir.
A voz do
silêncio possui muitas vozes e muitas feições. Chega de muitas formas, através
de diversos caminhos, por inusitadas situações.
A qualquer
instante do dia ou da noite, e eis o silêncio se tornando palavra. Uma mudez
que ecoa, um eco com nome, um nome com feição, e uma face dialogando com o
coração.
Leve pluma
é a voz do silêncio. Imperceptível plumagem
que passa pela janela, segue adiante e some de vez com a ventania mais
forte.
A brisa tem
a voz do silêncio. Do jeito que sopra e corta os montes, avança com destino
certeiro e sempre traz um segredo na boca perfumada de jardins distantes.
Eis que a
voz do silêncio é ouvida a todo instante e em todo lugar, bastando que o
coração esteja desejoso de escutá-la e dialogar com seus mistérios. O ouvido
não ouve, mas no coração ressoa toda silenciosa palavra.
Há voz do
silêncio na fotografia antiga, esquecida em baús, abandonada nos porta-retratos
escondidos, pendurados em paredes velhas e empoeirados. É uma voz tristonha,
saudosa, angustiante, que vai chegando como bem distante.
Há voz do
silêncio na simples imaginação. A mente dialoga com a ideia, com a imagem, com
a feição, e logo há uma interlocução entre os seres que se distanciam pelas
circunstâncias.
Há voz do
silêncio no pensamento premeditado, na busca visual do outro ou de uma situação
ou momento que sempre se traduz num grito, num clamor dolorido e entristecido.
Ora, não
há silêncio que permaneça em silêncio diante do passado gratificante ou melancólico,
diante de uma recordação dilacerante, diante de uma lembrança que faça sorrir
ou chorar, perante uma imagem no espelho do tempo ido.
Não há
silêncio que insista em silenciar diante da voz saudosa do coração, da vontade
de ver, de ouvir, abraçar, se jogar perante o outro corpo para sentir sua
presença e seu calor.
Não há
silêncio que suporte permanecer calado quando vem à mente uma canção antiga,
uma velha música onde cada verso parece uma fotografia de dois e seus
inesquecíveis momentos.
Não há
silêncio que sufoque o grito ao ter em mãos e reler uma carta de amor
casualmente encontrada, uma fotografia singela de alguém tão importante, uma
poesia sem nome e escrita para alguém, uma simples lembrancinha trazida pelo
vento.
Não há
silêncio que não se transforme em voz sobressaltada, aflita, angustiada, assim
que a imaginação traga a possibilidade de novamente encontrar quem tanto se
deseja avistar. E tudo dizer do silêncio que se fez sofrimento por tanto tempo.
Todos
ouvem a voz do silêncio. Todos são capazes de ouvir essa voz. E não há como
fugir desse som que chega até mesmo entre paredes impenetráveis. E isto porque
a voz não vem de fora, mas do íntimo de cada um.
A voz do
silêncio é, assim, a ressonância do indivíduo perante os seus pensamentos, suas
saudades, suas relembranças, suas recordações. Tudo que vem à mente se
transforma em imagem, e esta sempre provoca uma voz.
E fato
inusitado pode acontecer. Muitas vezes as gritarias e algazarras de uma
multidão deixam de ser ouvidas porque o íntimo deseja silêncio. Simplesmente a
pessoa se distancia da realidade presente para se voltar apenas para o seu
silêncio íntimo.
Então o
silêncio da alma traz a voz que bem desejar. E a pessoa jamais deixará de ouvir
essa voz.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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