*Rangel Alves da Costa
Quando chove, ah quando chove! Eu sou nuvem
prenhe, nuvem cuspindo longe, nuvem em alvoroço, um rio que corre, um mar que
transborda. Quando chove eu sinto o livro revirar a página, jogar longe os
escritos ressequidos e encharcar de esperanças as suas folhas. Quando chove eu
leio na vidraça o que jamais consigo em tempos de sol. E tudo me diz da
nostalgia, da saudade, do desejo de ter novamente. Quando chove eu me torno
criança novamente, afloram-me os desejos de nudez e de sair correndo por aí por
cima das poças d’água. Quando chove eu me deixo molhar por dentro e por fora.
As nascentes da alma logo se tornam em leitos correntes, ávidos, impulsivos, em
busca de novos destinos. Meu corpo banhado, inteiramente respingando o
instante, deixa-se ser apenas ele na fria e gelidez que tanto me faz querer ser
abraçado e protegido. Quando chove eu sempre choro e entristeço, eu sempre
silencio e esmoreço. Não que a chuva seja ruim ou que causa aflição, mas por
que as águas se derramam sobre velhos baús e então tenho que reler as velhas
cartas de um passado. Da janela entreaberta eu olho cada pingo que vai caindo.
Abro a porta e me deixo levar na correnteza. Não sei se durmo ou se sonho. Só
sei que lá fora a chuva cai.
Escritor
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