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sexta-feira, 25 de março de 2011

DESCONHECIDOS - 63 (Conto)

DESCONHECIDOS – 63

Rangel Alves da Costa*


Arremessados de um lado para o outro, mas sem se desprenderem das cadeiras por causa dos cintos de segurança que a viúva exigia que todos usassem, quando o veículo parou restou o pânico, o medo, a indagação em cada face sobre o que poderia ter ocorrido.
A primeira coisa que fizeram foi se apressarem para ver como estava Dona Doranice. Contudo, ela já ia fazer o mesmo. Já estava levantando para ver como estavam os seus acompanhantes e procurar saber o que realmente tinha acontecido.
Alguns homens da comitiva reconheceram imediatamente aquele barulho como sendo de tiros, e disparos feitos com armas pesadas. Contudo, tal fato nem havia passado pela imaginação do restante, principalmente a viúva e os rapazinhos. A jornalista logo desconfiou, por isso mostrava-se como a mais nervosa e temente do que poderia acontecer agora.
Fortes barulhos surgiram nas laterais do veículo e em seguida vozes arrogantes mandaram que todos descessem com as mãos para cima. Como exigiram, um a um foi descendo e deitando no mato rasteiro. Era ordem da sob ameaça de armas de grosso calibre.
Eram três os indivíduos que perpetravam tais ações aterrorizantes. Cada um mais alto e mais forte do que o outro, todos usavam toucas descendo da cabeça até o rosto para não serem reconhecidos. A cada um que ia descendo tremendo, assustado, quase perdendo os sentidos diante daquelas armas apontadas, iam dizendo “Deita aí, deita aí!”.
Na vez da viúva descer eles tomaram por surpresa quando ela se negou colocar as mãos na cabeça e a não mostrar qualquer reação de medo ou espanto. Estava apenas assustada com o fato, e somente isso. Quando um deles apontou a arma mais de perto e exigiu que ela levantasse as mãos ouviu um pedido de respeito e algo que talvez não estivesse esperando ouvir naquele instante: “Coisa mais feia. Três homens desse tamanho, vão trabalhar!”.
Sabendo o que poderia acontecer diante dessas palavras, imediatamente o chefe dos bandidos disse que o outro nem pensasse em fazer o que estava pensando. Exigiu que se afastasse dela e baixasse a arma, contudo mandou que ela também deitasse no chão ao lado dos outros. O que ela se negou a fazer e ainda disse calmamente: “Pode atirar na avó dos seus filhos”.
Verdade é que os bandidos não entenderam nada e apenas se olharam por debaixo das toucas, pelas frestas abertas para que enxergassem. E ela prosseguiu:
“O que é que vocês querem, digam? Deram esses tiros para furar os pneus do ônibus para nos assaltar, foi? Digam afinal o que é que vocês querem, pois aqui não tem nenhum marginal nem inimigo que vocês estejam procurando não, viu! Estão vendo essas pessoas que estão aí nessa situação, todas estão rodando cada pedaço de chão para ajudar pessoas necessitadas, pessoas carentes, famílias que os governantes, os políticos e os prefeitinhos dessa região querem fazer de conta que não existem. Vocês sabem quantas casas caindo eu já mandei levantar, quantas cestas de alimentos eu já fiz doação, quantos milheiros de tijolos, sacos de cimento, sacos de cal, latas de tinta e tudo o mais eu já doei para esse povo pobre e honesto? Talvez até eu tenha ajudado algum parente de vocês, talvez até que vocês precisem de mim mais adiante. Eu não estou cortando as estradas dessa região para fazer o mal não, como estou vendo vocês fazendo agora, mas muito pelo contrário. Minha missão aqui é de caridade, de bondade, de ajuda aos meus conterrâneos mais necessitados. E se vocês estão necessitados também podem dizer. O que é que vocês querem?”.
A essa altura os bandidos haviam perdido totalmente aquele ímpeto arrogante e de violência inicial. O chefe mandou que as pessoas levantassem do chão e começou a falar, agora não mais com arma voltada para elas, mas apenas com o dedo em riste na direção da viúva.
“Não sei nem quero saber quem a senhora é ou que anda fazendo por aqui, Só sei que o que anda fazendo por aqui não está agradando nem um tiquinho a muita gente. Só quem é político é quem deve lidar com esse povo, quem tem que dar ou não a esmola que ele merece. O que a senhora tá fazendo é envergonhar as liderança política, que é quem manda na política daqui. A senhora tá é querendo botar o povo contra os prefeito, os vereador, contra toda gente que manda politicamente nessa região. E saiba que eles não tão gostando nem um pouquinho da senhora. Mandaram a gente fazer o que devia ser feito, que era matar todo mundo, mas vamo poupar dessa vez. Mas se a senhora continuar com essa história de ajudar eleitor dos outro, então não respondo mais por mim e vou fazer o que me pagam pra fazer. Tá avisada então. Dêm um jeito de sair dessa região e vão pra onde quiser, pois se quiser continuar aqui atrapalhando a política dos outros vão se ver...”.
Resoluta, a viúva imediatamente procurou argumentar: “Mas o coronel Demundo Apogeu não me falou que...”. Foi interrompida pelo chefe dos bandidos que já ia em direção ao veículo: “Quem a senhora falou, disse o nome do coronel Apogeu foi? A senhora conhece ele?”.
“Não só o conheço como vou telefonar para ele agora mesmo...”, mentiu astutamente Dona Doranice. “Não, não, não faça isso pelo amor de Deus. Se o coronel descobre quem mandou a gente fazer isso e principalmente quem é a gente vai ser uma desgraceira...”
“Alô, coronel Demundo? Aconteceu um probleminha...”, continuava mentindo porque discou um número qualquer, mas falava com uma seriedade de amedrontar. E amedrontava mesmo, pois os homens deixaram o carro onde estava e se danaram a correr enlouquecidos pela estrada.
Mesmo com a correria toda, parecendo que o mundo ia acabar pelo medo que o coronel ficasse sabendo quem eles eram, um incidente notável acabou acontecendo com aquele chefe dos bandidos. Eis que um pássaro de olhos vermelhos em brasa surgiu do nada e, com uma velocidade estonteante, alcançou o homem e acertou-lhe com o bico bem na parte de trás do pescoço. Quem visse depois, diria que ele havia sido atingido por uma bala.



continua...





Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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