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terça-feira, 22 de março de 2011

O SILÊNCIO DO GRITO (Crônica)

O SILÊNCIO DO GRITO

Rangel Alves da Costa*


Após o grito, o silêncio ensurdecedor que surge é sinal de que tudo está na iminência de acontecer.
O grito foi aterrorizante, desesperador, única forma de pedir socorro diante do pânico, do medo, do ataque, da dor.
O grito não surgiu ao acaso, não foi ensaio para evento futuro, não saiu da garganta como brincadeira ou como gesto imotivado.
O grito nasceu, se fez e ecoou porque se fez necessário, porque os olhos não acreditaram, o corpo temeu e a própria vida correu perigo.
E quem ouve o grito ao longe conhece o que ele representa, sabe bem o seu significado, tem a certeza de que algo pesaroso está acontecendo.
Esteja onde estiver e sabe as causas e as consequencias de um grito, se for de bom sentimento, se tiver coragem ou se fizer valer o senso humanitário quer logo saber de onde ele surgiu.
Conhecida a direção de onde o gritou partiu, pode surgir outro grito, um aviso dizendo que já está indo ajudar, uma correria desenfreada para chegar.
Quanto mais se aproxima mais quer ouvir outros sinais do grito, que saber se está na direção certa e se a pessoa ainda corre perigo.
Quanto mais se aproxima mais há força e encorajamento, há uma vontade cega de enfrentar o desconhecido, há uma necessidade arrebatadora de sufocar o grito e a sua causa.
Não há mais um só sinal do grito, qualquer som, qualquer eco, mas ele partiu daquela direção, ele só poderia ter surgido dali.
E corre e avança, e vai para um lado e outro, olha pra perto e mais distante, por cima e por baixo e por todos os lugares, e somente encontra uma possibilidade de ter encontrado a boca de onde saiu o grito.
A pessoa está em pé, como quem apalermada, com olhar vazio e distante, rosto sem cor, parecendo ter o corpo estremecido, sem ação alguma, sem palavra alguma, apenas demonstrando as consequencias de haver gritado.
O silêncio agora toma conta de tudo, a boca está fechada, apenas o vento balança as folhagens. Talvez tenha tudo sumido com medo do grito ou do motivo deste.
Quem foi ajudar, quem se desesperou para socorrer, agora se vê diante do dono da boca que gritou e só pensa em perguntar o que foi, o que houve, qual o motivo daquele gesto desesperado.
Mas a pessoa parece não ouvir nada, não fala nada, não gesticula, não aponta pra qualquer direção nem demonstra se está sentindo alguma coisa.
De repente a pessoa, sem prestar a menor atenção à outra que veio lhe socorrer, simplesmente começa a se movimentar, olha para uma estrada ao redor e segue naquela direção.
Vai caminhando calmamente, tranquilamente, olhando para trás apenas uma vez e depois começa a entrar numa curva e sumir.
Tomando o lugar da pessoa que saiu, agora quem não sabe o que pensar nem o que fazer é a que chegou até ali desesperada, buscando respostas para um grito medonho ouvido.
Mas só um grito há dois minutos atrás e agora tudo como se não tivesse ocorrido nada, apenas o silêncio, o mais profundo silêncio. O que teria acontecido, então?
A pessoa ali em pé não sabe o que fazer, não sabe o que pensar de si mesma, não sabe mais de nada. E de repente pensa e se pergunta: Será que estou enlouquecendo?
E dá um grito ainda mais pavoroso!




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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