*Rangel Alves da Costa
Sertão é
mundo diferente. Não é todo mundo que suportaria ser sertanejo não. Precisaria
ser de pedra, de grão, de todo de pau, de espinho de xiquexique, de destemor.
Sertanejo
como terra seca, dura, petrificada. Sertanejo feito gente e bicho, feito
sorriso e tristeza numa só feição. Nem tudo mundo suportaria isso não. De sol e
de chuva, de morte e de vida.
Quanto
sofre o sertanejo! Muito já ouvi falar. E sofre mesmo, e muito mesmo. Só Deus
sabe o que esse povo - que é o meu povo - padece na sobrevivência do seu meio.
O homem da
cidade não entende nem o tiquinho do que realmente passa o homem das distâncias
matutas. Quando a seca vem braba, faminta, esturricando tudo, então tudo
desanda num desalento danado.
E não é
sofrimento pela terra seca, mas por toda a sequidão que passa a existir. O
corpo em magreza, o menino faminto, o bicho berrando, o entrar dia e sair dia
sem que nada chega como alento.
Mas então
as esperanças surgem como verdadeiro milagre ou como forma de suportar as dores
da vida. Quando o sertanejo se apega à fé, à prece, à promessa, à oração,
enfim, à certeza que o amanhã será melhor, então tudo muda.
E tudo
muda por que a fé se torna como um remédio contra os males que tanto afligem. E
na fé a esperança. Daí que muito se diz que tudo
Pelos
campos desalentados sertões adentro, nenhuma demora das chuvas consegue afastar
as esperanças.
O olhar do
sertanejo é um rosário tomado de esperanças. As mãos do sertanejo é um oratório
de esperançoso céu.
A chuva
não veio ainda, mas chegará no tempo certo. Assim diz o sertanejo. Tudo no
tempo de Deus. Assim confirma outro sertanejo.
Mas antes
que as chuvas cheguem, os campos áridos já espelham o quanto brota de
esperanças. Tudo seco ao redor, mas a catingueira floresce bela.
A flor da
catingueira, como um brinco dourado descendo rente a face magra da plante,
demonstra o quanto de esperança viva nasce e renasce a cada instante.
Pelas
estradas, enquanto os marrons e acinzentados entristecem ainda mais a murcheza
do mato, então surge o alaranjado-avermelhado da flor e do fruto da jurubeba.
Um encanto
aos olhos, mas também a certeza de que a seiva da esperança continua viva em
cada pedaço de chão, cada tufo de mato, em cada planta que entristece por falta
d’água.
Assim
também nas flores e nos frutos das cactáceas sertanejas. A palma definhando,
secando, morrendo na fornalha do sol, mas de repente avista-se uma vida
florando sobre seus espinhos.
O
mandacaru, o facheiro, o xiquexique, tudo comprova o quanto de vida vive quando
já se acredita que tudo já esteja sem vida.
As flores
surgem, as pétalas se abrem, os frutos tomam forma e cor, os bagos se adocicam,
as polpas se avolumam, as cores espantam entre os acinzentados ao redor.
A vida
sertaneja floresce assim. A vida sertaneja floresce nas esperanças tantas e que
nunca murcham completamente nas plantas e no homem.
A planta
floresce e frutifica pela invisível gota d’água do tempo. Aquele mesmo tempo de
Deus. O homem floresce e frutifica pela fé incontida no seu coração.
A fé santa
brotada de Deus. E pela prece, pela promessa, pela oração. Até que o olhar,
logo ao abrir a porta ao alvorecer, diga que vai chover.
E os
braços, como aqueles braços sempre abertos do mandacaru em direção aos céus, se
elevem para os sagrados agradecimentos e para receber chuva boa.
Uma
esperança nunca perdida. Nada teve fim, nada morreu perante o sertanejo. A fé
sertaneja sempre resguarda a esperança de que amanhã será bem melhor.
E talvez seja por isso mesmo, pela fé incontida que brota em esperança, que a vida sofrida é suportada. E que o sofrimento seja diminuído pelo remédio sagrado da fé.
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