*Rangel Alves da Costa
Muitos eventos da natureza e da ação dos
astros provocam profundas reações ao homem e à própria natureza. A lua possui
infinito poder de agir perante a mente humana, de provocar tempestades e até de
provocar grandes devastações.
Diversas enfermidades provocam sofrimentos
ainda maiores perante a lua cheia, por exemplo. Lobos uivam com mais
insistência, as marés avançam impetuosas, os loucos enlouquecem perdidamente.
Mas quando chove se tem igualmente uma
profunda transformação no espírito humano. Não a chuva de tempestade,
aterradora, devastadora, mas a chuva que apenas cai para molhar a terra e se
deixar levar pelos córregos e asfaltos.
A chuva da noite então possui uma força
indescritível, principalmente quando a pessoa está carregando sobre si um peso
terrível de diversas situações. Solidão, saudade, pesar, luto na alma,
distanciamento e abandono, tudo vai se tornando em verdadeiro temporal perante
a chuva noturna.
Quantos gemidos e lágrimas derramadas em
quartos fechados, por detrás de janelas, por cima de camas, em travesseiros
molhados. Dores e sofrimentos que parecem não acabar. Tristezas e agonias que
aumentam no compasso dos pingos caindo, da chuva lá fora.
Quantos gritos aprisionados, cabelos
destroçados, corpos lanhados, por uma saudade dentro de uma noite chuvosa. Cada
pingo caindo é como valsa triste, como sonata de solidão, como rapsódia
torturando a alma.
No quarto escuro, apenas o barulho dos pingos
caindo lá fora. Vontade de correr, desejo de gritar, descomunal vontade de
abrir a janela e abraçar a chuva. Ou deitar ao chão e espernear, ou dançar a
valsa dos loucos, ou se perder na noite atrás de qualquer sol.
Quando chove na noite há permissão de ser
lobo, de uivar, de gritar, de grunhir, de subir a montanha e clamar por um
nome. Há permissão de ser bicho subindo ao monte para rosnar e prantear todas
as dores do mundo.
Quando
chove na noite há permissão de loucura, de ensandecimento, de perder totalmente
o juízo. Há permissão de sair de si, de querer voar, de querer ser pingo caindo
em busca de um canteiro. Há permissão de conversar sozinho e de beijar a boca
que tão distante está.
Quando chove na noite, ah quando chove na
noite! O corvo negro surge em voo trazendo uma triste lembrança. Pios
arrepiantes, uivos apavorantes. Ai como dói a certeza da solidão e a
impossibilidade de voltar no tempo.
Quando chove na noite o solitário se faz
poeta e vai tecendo versos na vidraça em frente. Palavras e nomes, flechas e
corações, lágrimas caindo, tudo se derramando. E do lado de fora, perante o
amarelado da luz se espalhando no poste, a sensação de que alguém está ali. Mas
nunca está ali.
Quando chove a pessoa se molha por fora e por
dentro. A lágrima que cai nada significa perante a enxurrada que vai se
formando. E depois vem a inundação, a correnteza, um mar imenso que
furiosamente vai levando seu náufrago.
Quando chove eu logo retiro meu barco de
dentro de mim. Solto os panos, seguro o leme, e vou firmando a proa em boa
direção. Mas não tem jeito. Navego na solidão e naufrago no mar que nunca se
afasta de mim. Uma fúria chamada solidão!
Uma solidão em furiosa devastação.
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