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sexta-feira, 8 de julho de 2011

O TEMPO DO TEMPO (Crônica)

O TEMPO DO TEMPO

                    Rangel Alves da Costa*


Ora, se o tempo nasceu, surgiu, apareceu; se o tempo é novo ou é velho, possui muito tempo ou pouco tempo, já possui duração, então é porque tem idade. Mas qual a idade do tempo, onde e quando ele nasceu e qual a data do seu aniversário?
Tem tempo que é preguiçoso que só, bicho que não dá um passo que é para não se cansar. Pra ele tanto faz como tanto fez que os outros se apressem ou não, pois sabe que tudo só acontece quando ele quiser. E aí é o pior, vez que quando mais querem do tempo mais ele se esconde que ninguém avista mais ele passar.
Tem tempo que é gente fina, gente boa mesmo. Se você se atrasar ele dá um jeitinho e tudo pode ser resolvido sem demora e sem problemas; sem a pessoa dorme no ponto ele tem o cuidado de acordar pra dizer que se apresse em fazer o que tem de ser feito; se alguém tem coisa demais pra fazer em pouco tempo ele se desdobra em muitos e ainda dá tempo pra fazer aquilo que ia sendo esquecido; se o indivíduo não teve culpa por algum esquecimento ele até volta no tempo sem que ninguém sinta que voltou ao passado.
Tem tempo que é de lascar, de pegar no pé de qualquer um e deixar a pessoa sem saber o que fazer, sem ter tempo pra fazer nada. È do tipo de tempo que faz a pessoa esquecer a panela no fogo, perder o ponto da feitura do creme, esquecer o horário de tomar remédio, só lembrar de colocar o lixo na calçada quando o caminhão já passou. Se alguém reclamar que não tem mais tempo pra nada aí é que ele arruma mais coisas para a pessoa se perder de vez.
Tem tempo que age de outros modos, de outras maneiras, de forma a deixar em pé o cabelo de qualquer um ou esvoaçar qualquer pouca telha. Porque tem tempo que é tempo de tempestade, tempo de temporal, temporal de vendaval, tempo de ira, de fúria, de rancor, sem perdão, sem tempo pra perdoar. Tempo de inverno e de invernada, tempo de águas de março e de todas as águas, num tempo que vai escorrendo pelos canteiros ou destruindo velozmente tudo que possa encontrar pela frente.
Tem tempo que ninguém quer viver esse tempo. E quanto dói o tempo da saudade, da lembrança, da recordação; quanto machuca o tempo da despedida, do adeus, do aceno na curva da estrada, da espera que parece infinita sem que o outro tenha tempo de chegar; quanto faz doer e sofrer o tempo da eternidade pela morte de alguém que se ama e se quer, ou de quem ainda vive, mas há a certeza de quem não haverá mais tempo de ver pela última vez, dar o último abraço, dizer carinhosamente ao ouvido que sempre amou de verdade.
Quanto tempo falta para a felicidade, para os sonhos se realizarem, para que aconteçam as grandes conquistas, para que um tão sonhado dia enfim aconteça? Quanto tempo falta para a formatura, para a viagem de férias, para o passeio com os amigos pelas montanhas, para o enlace matrimonial, para o batizado do filho, para o nascimento do primeiro bebê?
Quanto tempo falta para acabar o mês porque o dinheiro já acabou, para chegar a aposentadoria, para que telefonem e digam que o currículo foi aprovado, para avisarem que pode começar a trabalhar no dia seguinte, para receber o primeiro salário, para comprar aquilo que tanto deseja? Quanto tempo falta para acordar e correr para pegar o trem, para chegar ao emprego, para assinar o ponto, para almoçar, para ter saudade da família, pra retornar, para adormecer e tudo acontecer novamente?
E não adianta, pois tudo é no tempo e ao seu tempo. Por mais que a pessoa queira fugir, mas por todo lugar estará o calendário, a data, o dia, o ontem, o amanhã, o passado, o futuro, o segundo, a hora, o mês, a semana, o ano, o agora, o depois, o relógio, o sol, a noite, a madrugada, tudo marcando, tudo passando, tudo passado, tudo num tempo que está, que volta e que vai, que nasce e morre.
Mas já ia esquecendo a idade do tempo. Qual será mesmo a idade do tempo? A resposta está em cada um enquanto viver, por quanto tempo viver.



Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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