SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



terça-feira, 12 de julho de 2011

SAUDADE DE MINHA TERRA (Crônica)

SAUDADE DE MINHA TERRA

                          Rangel Alves da Costa*


Pelo título consignado ao texto, bem que eu poderia falar sobre a música sertaneja maravilhosa, verdadeiro hino de amor e saudade gravado pela primeira vez pela dupla Belmonte e Amaraí, nos idos de 66, de autoria de Belmonte e Goiá, chamada “Saudade de Minha Terra”.
A canção caipira e de mundo reflete muito bem o que pretendo expressar aqui. Antecipo os versos e mais tarde saberão que estou dizendo a verdade:
“De que me adianta viver na cidade/ Se a felicidade não me acompanhar/ Adeus paulistinha do meu coração/ Lá pro meu sertão eu quero voltar/ Ver a madrugada quando a passarada/ Fazendo alvorada começa a cantar/ Com satisfação arreio o burrão/ Cortando o estradão saio a galopar/ E vou escutando o gado berrando/ O sabiá cantando o jequitibá/ Por nossa senhora, meu sertão querido/ Vivo arrependido por ter deixado/ Esta nova vida aqui na cidade/ De tanta saudade eu tenho chorado/ Aqui tem alguém, diz que me quer bem/ Mas não me convém, eu tenho pensado/ Eu digo com pena, mas esta morena/ Não sabe o sistema que eu fui criado/ Tô aqui cantando, de longe escutando/ Alguém está chorando com o rádio ligado/ Que saudade imensa do campo e do mato/ Do manso regato que corta as campinas/ Aos domingos ia passear de canoa/ Nas lindas lagoas de águas cristalinas/ Que doce lembrança daquelas festanças/ Onde tinham danças e lindas meninas/ Eu vivo hoje em dia sem ter alegria/ O mundo judia, mas também ensina/ Estou contrariado, mas não derrotado/ Eu sou bem guiado pelas mãos divinas/ Pra minha mãezinha já telegrafei/ E já me cansei de tanto sofrer/ Nesta madrugada estarei de partida/ Pra terra querida que me viu nascer/ Já ouço sonhando o galo cantando/ O inhambu piando no escurecer/ A lua prateada clareando a estrada/ A relva molhada desde o anoitecer/ Eu preciso ir pra ver tudo ali/ Foi lá que nasci, lá quero morrer”.
Como observado, é um canto/lamento, um grito de amor pela terra e um gesto de devoção ao mundo/sertão, à cidadezinha onde nasceu um dia. Mesmo ficando para trás e distante do seu filho que segue adiante em busca de dias melhores, esse mundo sertanejo jamais é esquecido e sempre faz renascer, numa comparação com as desventuras da cidade grande, a imensa vontade de retornar.
Também sempre tive essa imensa vontade de retornar, de fazer a viagem de volta com mala e cuia e, ainda nas tristes estradas sertanejas, assustadoras para quem não conhece, começar a abraçar cada pedacinho do meu berço, do meu verdadeiro mundo, do imenso lar de família infinita, na consangüinidade com cada um que é meu irmão de sol e de chão.
Abro a porta e abraço todo mundo. Os que não reencontro no mesmo instante, haverei de reencontrar debaixo dos pés de pau nas pracinhas e recantos, defronte das casas pobres e tristes, no sombreado da palavra amiga e da conversa amigueira de sempre.
Se entrar num boteco revejo um montão de amigos na talagada e no assuntar a terra e o bicho; caminhando pelas estradas é fácil encontrar caminhantes de alpercatas eternas para suas moradias mais afastadas; outros que vão carreando o seu carro de bois, adiante os vaqueiros e cavaleiros sonhando com qualquer pega-de-boi e boiada.
Certamente não encontrarei mais o sabiá cantando no jequitibá, um imenso regato cortando as campinas, o passeio de canoa nas lindas lagoas de águas cristalinas, nem o sertão bucólico e cheio de humanidade e simplicidade que tanto gostaria de compartilhar.
Mas o progresso e a destruição não puderam tirar de lá a paisagem sentimental, o queimor de sol tão conhecido e que vai entrando na pele misturando ao sangue e virando parente, o entardecer nos horizontes de relembranças e o anoitecer debaixo da imensa lua daqueles que ainda sabem enxergá-la.
E nas manhãs o café torrado inebriando tudo, ali mesmo batido no pilão, o leite vindo diretamente do peito da vaca, o cuscuz ralado na cozinha, o sabor da terra alimentando a vida. E lá fora, quando o mundo se faz da soleira da porta em diante, o cenário de felicidade se completa com a revoada, com o gado que berra, as folhagens briguentas, os sons próprios do sertão, o compadre que passa montado num cavalo magro e dá um bom dia.
“Bom dia compadre, e que Deus lhe abençoe nesse sertão adentro”. Esse é o meu sertão, aqui não fico não, e é pra Poço Redondo que quero voltar.




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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