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quinta-feira, 21 de julho de 2011

QUEM AMA... (Crônica)

QUEM AMA...

                            Rangel Alves da Costa*


De início, é preciso que se diga que a grande maioria das coisas que se diga sobre o amor é mentira, deslavada mentira. Para a maioria dos que dizem amar, o amor sempre foi e será uma mentira. Essas pessoas também são uma mentira. Quase tudo é mentira, até a verdade é mentirosa, às vezes.
Quem ama não fica abrindo a boca e espalhando para os quatro ventos e o mundo que está tomado por tal sentimento. Amar, enquanto sentimento inexplicável através de palavras é algo que se sente e não que se expressa verbalmente. Então, mostrar ao mundo que ama é porque ama menos do que deveria, ou não ama, que é muito mais verdadeiro do que a palavra dita por dizer.
Quem ama não diz que está apaixonada e nem vive fazendo as besteiras próprias dos apaixonados para dar provas que ama demais. Paixão é tão diferente do amor, como a navalha da pedra de amolar. A veia cortada pelo sangue da paixão jamais será por culpa da pedra que moldou e afiou o amor para cortar as arestas das dificuldades que surgem sempre.
Quem ama não precisa sustentar o amor que sente com presentes, promessas, dando além do que deve e pode, fazendo aquilo que o outro exija como prova. O amor de quem ama é tão consciente que conhece todos os limites e não ultrapassa nada além se não for para fortalecer o sentimento entre os dois.
Quem ama não precisa mandar fortalecer sua relação em mesa de cartomante, em centros de macumba, através de videntes ou trabalhos ciganos, jogando nas encruzilhadas todo o destino e querer. O amor possui suas próprias cartas, signos e amuletos, e somente os enamorados têm o poder de fazer dessa sublime magia um livro amargo que nasceu aberto e esperando ser preenchido com as melhores lições.
Quem ama não fica esperando e torcendo que o outro chegue com flores, joias e perfumes, chocolates e outras guloseimas, o carro mais caro da praça, o apartamento ou a viagem dos sonhos. A simples presença do outro já é o maior presente, o indescritível contentamento de estar ao lado de quem se ama já traduz tudo o que deve brindar o amor.
Quem ama vê nos gestos e nas coisas simples a melhor oportunidade para demonstrar o amor, ainda que o outro não tenha necessariamente de compartilhar. Eis que um poema de amor e de saudade, um verso traduzindo os sentimentos, um desenho representado algo esperado para os dois, a fotografia que é deixada sempre visível aos olhos da própria pessoa, fazer a relação de quem ama com os mais belos momentos da vida, com os encantos da natureza, com os sonhos bons em noites de sol.
Quem ama, ao lado do ser amado, experimenta a tâmara que ele oferece e compartilha o jiló que tanto gosta; fica de braços abertos no frio em cima de uma montanha e o chama para experimentar o calor na noite mais quente do ano; continua vestida quando ele tirar a roupa e se despe da vergonha e temor quando já está despida; inventa motivos, medos e assombros para acordar no meio da madrugada e tem sono quando estão sozinhos tomando vinho ao entardecer.
Quem ama é católico e protestante, evangélico e agnóstico, ateu e cristão, judeu e muçulmano, conservador e liberal, democrata e ditador, pacífico e belicista, aberto e fundamentalista, namorada e esposa, amante e amigo, água e óleo, vinho e vinagre, manhã e noite, a própria pessoa e o outro. É a soma de tudo para ser apenas um em nome dos dois.
Quem ama tenta fingir o fingimento que não pode esconder, pois é aquilo que não quer ser, e acaba sendo tudo aquilo que realmente é. Então é louco de gritar pelos montes o nome da mulher amada, é doido de jogar pedra na vidraça para chamar atenção, é insano porque inventa uma paixão que nada mais é do que o verdadeiro amor.
E quem ama sabe muito mais do que eu o que é o amor.



Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com     

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