COMO DIGO QUE TE AMO
Rangel Alves da Costa*
Nunca espere ouvir sempre de minha boca palavras adocicadas, poemas decorados de um livro qualquer de poesias ou frases feitas cheias de ternura, coisas assim fictícias demais para dizer que te amo.
Talvez o meu silêncio tenha maior expressão do que um monte de coisas que possa ser dito. Se no silêncio eu te olhar meio amante, te olhar meio carente, te olhar meio pidão, precisa dizer mais alguma coisa?
Se no silêncio eu olhar nos teus olhos, me aproximar do seu corpo, beijar tua face, acariciar o teu rosto, beijar teu cabelo, enlaçá-la com um abraço, trazê-la completa e inteira aos meus braços, depois dar um beijo profundo e incontido, terei que dizer mais alguma coisa?
Se no silêncio eu colocar uma bela canção na vitrola, abaixar o volume da luz, buscar um vinho de uma antiga safra e dois cálices especiais guardados lá no fundo da cristaleira, e depois sentar no tapete da sala, sem camisa e com água na boca, acenando levemente para que venha também repousar, será que precisarei dizer mais alguma coisa?
Em tudo isso estarei expressando o que sinto, o amor que tenho, a ansiedade amorosa que me possui, sem dizer uma palavra sequer. Talvez até eu tenha que falar, dizer que te amo, repetir que te amo, e mais uma vez dizer que te amo, mas certamente não haverá como falar se o outro lábio me cala e me diz coisas que o corpo agradece.
Já que decido não falar nada para expressar tão grande amor, então de repente me vejo em busca daquilo que seja verdadeiro grito sem nenhum ruído. E penso que talvez valha a pena te dar um grandioso presente que seja do tamanho do meu sentimento. Alguma coisa assim que diga tudo através da visão.
Caminhando ao entardecer, tomo da tua mão e seguimos em direção às paisagens que nunca mais visitamos porque achávamos que o mundo lá fora já era suficiente bom para nós. Pensávamos que as vitrines, os calçadões, os brilhos e as luzes, as mil ilusões que o cotidiano nos mostra tentando nos afastar das coisas realmente importantes, significavam felicidade.
Agora subindo a montanha, silenciosamente trilhando os caminhos do entardecer, quando chegar lá em cima, debaixo da árvore sagrada onde nossos nomes continuam riscados e perto da pedra que chora pela solidão que sente, levantarei apenas uma mão e através dela mostrarei tudo que exista à nossa frente e que os olhos prontamente agradecerão a Deus.
Adiante, meu amor, pois estou escrevendo e não falando, há um rio que singra azul, tantas vezes turquesa outras vezes céu, trazendo no seu leito a saudade de sua aldeia. Não é o Tejo, mas é o rio mais bonito que passa naquela aldeia porque é o rio que passa por aquela aldeia, como diria o poeta.
Ela passa diante de nós e nos convida a navegar seu destino por trás das montanhas verdejantes e das curvas e dobras até chegar noutra aldeia onde pessoas também se amam.
Dizem que nessa aldeia, que também é a mais bela que existe, ninguém abre a boca para dizer te amo, para dizer te quero, para dizer te desejo. Simplesmente chega, dá de presente um arco-íris, um céu com estrela e tudo, uma manhã, uma lua cheia e pronto, a outra pessoa agradece no coração que voa para beijar a face.
Olhe adiante meu amor, quanto presente tenho para te dar. Erga as mãos, abra os olhos, permita que o coração receba tantas dádivas, pois nele deverá caber uma revoada de passarinhos, um sol poente, uma mata ainda virgem, bichos que correm escondidos se enamorando, uma brisa e o vento de balançar o cabelo.
Mais tarde iremos descer a montanha e lá embaixo haverei de encontrar uma concha solitária na beira daquele rio. Sei que não é mar nem tem areia da praia, mas haverá uma concha que um navegante deixou ali para que encontrássemos agora. Vou erguer a concha e aproximar do teu ouvido para que ouça a minha voz enfim dizer:
“Te amo”.
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com
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