O SERMÃO DO AMOR (AINDA QUE NA MONTANHA)
Rangel Alves da Costa*
Sentindo-se angustiado pela solidão, porém tomado por um imenso e verdadeiro amor, ele subiu à montanha para expressar, talvez ao vento, tudo aquilo que gostaria que não somente ela, sua amada, mas que todos os enamorados ouvissem.
Então, abriu os braços, ergueu-os para o alto, e com a força que encontrou, disse:
Bem-aventurados os que amam, porque é no amor que se dá significado à vida e se busca a felicidade.
Bem-aventurados os que choram por amor, porque serão compreendidos e consolados por quem as lágrimas vertem.
Bem-aventurados os que não desesperam pelo amor que não está ao alcance do corpo, porque tudo será alcançado diretamente no coração.
Bem-aventurados os que não negam que têm sede e fome de amar, amor sincero e verdadeiro, porque serão saciados.
Bem-aventurados os que sofrem zombarias e achincalhes por causa de sua solidão, porque para eles o destino reserva a eternidade do verdadeiro amor enquanto a vida durar.
Bem-aventurados sereis quando dizem que têm sentimentos falsos e passageiros, porque a certeza de amar nunca será compreendida por aqueles que não sabem o que é ter amor no coração.
Cantai, regozijai, porque será grande a sua recompensa no amor, pois as mesmas descrenças e desilusões sofreram aqueles que souberam esperar pelo olhar do outro.
Vós sois a semente do amor, quem faz brotar a semente do amor sobre a terra. Se o amor não for semeado, como será a colheita do coração que quer amar?
Vós sois a luz do amor. Não haverá escuridão onde passar mansamente aquele que está corajosamente em busca de ser amado.
Assim, façam brilhar o amor que sentem diante de todos, de tudo, dos homens e do ser amado, para que vejam o amor que irradiam e também sigam essa luz na busca da comunhão, do encontro com o outro para a felicidade da vida.
Não permitam que pensem que pregam qualquer amor, um amor meramente carnal, um desenfreado amor. Mostrem que não é este nem aquele amor, mas apenas uma forma de amar sempre em busca da perfeição.
Aquele que violar as leis do amor, por menor que seja a transgressão, e tudo fizer para que o seu erro seja esquecido, será declarado indigno de encontrar alguém que possa amá-lo, senão amando-o com o mesmo erro cometido.
Ouvistes o que foi dito aos solitários um dia: Amarás, encontrarás verdadeiramente o outro lado do teu ser que ama, mas somente se ao tentar sair da solidão não caminhares por qualquer caminho do querer barato, do querer vazio, do querer apenas para dizer que encontrou o amor.
E vos digo ainda: todo aquele que brincar com os sentimentos, que fizer das promessas do amor meios de iludir, que tente perpassar as fronteiras do coração, ora para um lado, ora para o outro, num desalinho que não sabe o que quer, será castigado pela solidão quando mais precisar de alguém que lhe ame.
E não posso esquecer de vos dizer: todo aquele que lançar um olhar para o outro que deseja compartilhar o amor, já firmou compromisso no coração. E se houver aceitação da outra parte, que este compromisso se torne um verdadeiro contrato entre os dois, onde a cláusula principal diga: No amor haverá sempre mútua confiança!
Que sirva de exemplo o que um dia foi ensinado aos volúveis: Não amarás falsamente, pois a falsidade no amor é como ser e não ser, e quando procurar para ter não haverá de reclamar se não encontrar.
Por não poder amar falsamente, não jures por nada que não seja verdadeiro, não queira fazer do amor um alicerce tão frágil que não suporte a menor mentira ou a mínima falsidade. Acontecerá que todo mal e toda mentira serão descobertos, e mesmo causando dor deverá ser motivo para o fim daquilo que já não existia.
Dizei ao outro que quer compartilhar do seu amor: Sim, se verdadeiramente for sim; não, se tiveres a certeza que não. Tudo o que é dito além disto ressoa como falsidade ao coração.
Se alguém, que está ao teu lado e te ama, beijar-te na face direita, oferece-lhe também a outra. Faça tua boca encontrar a dele como se o lábio estivesse doce para ser apenas sentido.
Se te chamares para caminhar de mãos dadas pelos campos, também sobe às montanhas, conhece os vales e depois repousa sobre a relva, lado a lado, como se o momento de descanso fosse também de satisfação.
No teu silêncio, com a lembrança do teu amor em mente, eis como deveis meditar em poesia:
Amor nosso, que se espalha sobre a terra, santificado seja o que for feito em vosso nome; venha a nós a vossa paz; seja feita a nossa vontade, sempre abençoada e guiada pelo céu. O amor nosso de cada dia nos daí sempre; perdoemos os nossos deslizes, assim como prometemos não mais errar. E não nos deixai cair nas tentações da paixão, pois que se baste no compreensivo amor tanto querer.
E disse muitas outras coisas, espalhou pelos ares as mais belas lições de amor. Depois desceu da montanha e foi orar aos pés do altar, pedindo perdão a Deus se estava amando demais.
E ouviu a voz do Senhor dizendo: Não só de pão vive o homem, de amor também!
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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