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quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

NO REINO DO REI MENINO – VI

NO REINO DO REI MENINO – VI

Rangel Alves da Costa*


Após aquele encontro com a família real de Oninem, Bernal, que desde algum já vinha se inteirando dos fatos através dos astros e dos seus poderes mágicos e sobrenaturais, decidiu agir por conta própria para encontrar uma solução rápida para a crise que silenciosamente se abatia sobre o reino, colocando em perigo até mesmo o seu futuro.
Como já assinalado, os poderes mágicos de Bernal eram fruto de uma longa herança familiar, cujos conhecimentos ritualísticos vinham sendo repassados de geração a geração. Nessa sua condição de iniciado nos segredos ocultos, a sua presença desde muito jovem no castelo real talvez não tivesse sido obra do acaso. Errante pelo mundo, um dia simplesmente chegou às portas do castelo, foi entrando sorrateiramente até se tornar, como naqueles momentos, em elemento vital para a sobrevivência daquela famosa herdade dos povos confiáveis.
Decidido, pois, a se aprofundar na busca de uma fórmula que pacificasse as coisas, vez que boa parte do futuro do reino ele já tinha conhecimento, buscou nos elementos mágicos da natureza o seu cenário ritualístico. Assim, durante oito meses, dividindo esse período pelos quatro elementos do templo da natureza, que são o ar, o fogo, a terra e o ar, ritualizando cada dois meses com cada um destes elementos, foi construindo o mosaico onde as respostas poderiam ser visualizadas mentalmente.
Bernal, esse feiticeiro do bem, agia com a certeza de que tudo que existe no mundo só era possível com a ação de cada um destes elementos, cuja junção, abrindo a grande porta do santuário do mundo, revelaria as verdades existentes sobre o que havia sido ritualizado. Como conseqüência, o elemento água revelaria as condições de poder no sangue da família real, o fogo indicaria a ação e o movimento que davam sustentação ao reino, a terra mostraria a força existente no rei, na rainha e no seu filho, e o ar diria sobre a sobrevivência do próprio reino. No confronto, na junção e na filtragem dos quatro elementos seria possível se obter uma visão geral do reino, mesmo que confusamente, porém somente após o iniciado colocar em ordem cada uma das peças que desordenadamente viriam à sua mente.
Tais foram os procedimentos ritualísticos levados a efeito por Bernal, tendo iniciado num mês de janeiro e terminado num mês de agosto. Ao fim desse cansativo trabalho, no nono mês, setembro, preparou a última cerimônia para que os resultados que precisava pudessem ser alcançados. Em jejum de dois dias, em pé, de olhos fechados e braços abertos dentro de um riacho de água limpa e de vagarosa correnteza, esperou a resposta do que os elementos haviam interpretado e esta chegou numa rapidez impressionante. Não haviam peças desordenadas, apenas duas, uma grande e uma pequena, e nem precisou juntá-las para saber o seu significado: era a imagem turva de um reino e a figura nítida de um menino sorrindo. O menino era o pequeno Gustavo, o herdeiro do trono de Oninem. O reino sobreviveria, concluiu Bernal mais animado, porém totalmente exausto.
Sobre esse longo ritual por ele praticado, numa cerimônia que durou mais de oito meses, nem sobre o que pôde ver como desfecho, Bernal jamais disse à família real uma palavra sequer. Já estava ciente do futuro e esperando somente o surgimento de algum fato que, tragédia e dor ao mesmo tempo, fosse o ponto de partida para um novo tempo. Sobre isso, acerca do fato gerador nada sabia; suas forças mágicas sempre lhe negaram tal conhecimento. E esperou muito tempo, uns seis a sete anos, até que o trágico chegasse feito um vendaval.
O rei varou a noite numa reunião interminável com os comandantes das tropas do reino. Queria saber os motivos de as tropas guerreiras não estarem firme e constantemente guardando as fronteiras de norte a sul, principalmente quando informações chegavam dando conta de que cavalarias de uma legião inimiga foram vistas no outro lado das últimas montanhas do reino.
As alegações dos comandantes para tal situação não foram novidade alguma. Era o que já se sabia e esperava: sem receber os salários a que tinham direito, se negavam ferozmente a subir nos cavalos, preparar os canhões, entricheirar na floresta, erguer as bandeiras e as armas, enfim, se negavam a dar um passo sequer em defesa do reino.
Logo ao alvorecer, trombetas de alerta soaram. Os guerreiros de um reino inimigo avançavam nas terras de Oninem.


continua...



Advogado e poeta
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