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domingo, 18 de dezembro de 2011

OUTONO NA PLANTA DE PLÁSTICO (Crônica)

OUTONO NA PLANTA DE PLÁSTICO

                                 Rangel Alves da Costa*


Não gosto que duvidem daquilo que digo que é verdade. Passa uma ideia de invencionista, de loroteiro ou coisa mais feia de se dizer. Ademais, não é nem nunca foi do meio feitio falar sobre coisas que não existem. Às vezes exagero um pouco, mas apenas no sentido de proporcionar maior veracidade aos fatos.
Por essa e outras que já decidi cortar relações verbais com muita gente, e exatamente porque ouviam sem querer acreditar. Disse a um que já tinha visto nego d’água e fogo-corredor e ele não acreditou; a outro confirmei ter ouvido o canto de uma sereia; e ainda outro asseverei que os bichos tinham a mania de falar comigo. Todos duvidaram e tive que tomar providências, ficando logicamente de mal.
Problema maior surgiu quando eu disse, confirmei, jurei por tudo na vida, que umas plantas de plástico que enfeitam minha casa sofrem as mesmas conseqüências que as plantas normais, aquelas que estão fincadas na natureza, quando chegam ao outono. O amigo me olhou desconfiado, pigarreou, ficou meio sem saber o que dizer, mas depois procurou ser gentil e se informar melhor sobre essa história.
E deu um trabalho danado pra explicar e convencer o homem. Comecei dizendo que bastava olhar para a paisagem outonal e para o semblante das minhas plantas para se certificar da coincidência, das mesmas feições entristecidas, emagrecimento e total desbotamento. Quem olhar pra um pé de roseira da minha sala vai encontrar a mesma coisa no roseiral do jardim.
Verdade é que no outono a natureza fica triste, acinzentada, num desfalecimento que faz cortar coração. Nessa estação tudo parece morrer para ir renascendo aos poucos, na estação seguinte. E dizem que isto ocorre porque nessa época os dias ficam mais curtos, os raios solares diminuem e as plantas quase não produzem mais clorofila.
Com a falta dessa substância as folhas começam a perder sua cor verdejante, tornando-se ocres, amareladas, cinzas, marrons. E com a diminuição de nutrientes, hormônios se instalam na região fragilizada e fazem com que as folhas se rompam e caiam. E muitas vezes nem precisam se desprender, pois basta o vento mais forte do entardecer para encher o chão de folhas mortas.
Nas plantas e folhas da minha casa acontece o mesmo fenômeno, parecendo mesmo que estou em meio à natureza, numa praça, num lugar onde antes era tudo alegre e vicejante. Já no mês de março, com o fim do verão e o início da nova estação, já sinto as dependências mais calorentas, mais abafadas.
Verdade é que chega a assustar quando vejo os caqueiros esturricados, os vasos de barro criando fendas; o plástico verde que forma os troncos ressecando, rachando, perdendo a cor; os amarelados, vermelhos e lilases das flores perdendo a viscosidade, o brilho, a intensidade, e se tornando todas numa cor pálida e terrosa.
As flores caem antes que as muitas folhas deixem os galhos totalmente despidos. E se esqueço as janelas abertas e a ventania invade a casa então encontro o chão, o tapete e tudo que for lugar tomado de resto da natureza sintética. Se descuido e saiu andando por cima desses restos caídos ouço o gemido do plástico esvaído sendo esmagado pelos meus sapatos, num gemido de dor numa vida que não custou mais de que alguns trocados, mas era encantadora natureza ao olhar.
Desse modo, disse ao meu amigo, que não sabia se acontecia o mesmo com as plantas e flores da casa dele, mas que na minha causava uma angústia muito grande todas as vezes que chegava o outono. Até que ele parecia convencido com minhas explicações. E o inesperado aconteceu, pois em seguida me perguntou se com a primavera aquela mesma natureza de plástico ganhava nova vida, rejuvenescia.
Tive que responder que sim, que tudo voltava ao normal e até parecendo que um novo jardim havia surgido em minha casa, principalmente porque comprava tudo de novo, tudo numa loja especializada em enfeites de plástico. E sempre colocando uma avenca ou uma orquídea nova, uma flor diferente na minha cesta de primavera.




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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