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A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



quarta-feira, 6 de março de 2019

Palavra Solta – sobre os bichos da quaresma



*Rangel Alves da Costa


A quaresma, ou os quarenta dias que antecedem a sexta-feira santa, sempre é lembrada como um período onde os bichos estranhos começam a ser avistados nas estradas, nos labirintos escurecidos, nos quintais, nas curvas e nos tufos de mato. Não se sabe bem o motivo de aparecerem assim é maior profusão, mas dizem que muito tem a ver com pecadores, com padres que tiveram filhos, com filhos que batiam nos pais, com adultérios escandalosos, com amaldiçoamentos. Seja como for, a verdade é que a partir da quarta-feira santa os bichos se soltam na noite, para assustar, para atacar, para amedrontar. São lobisomens, fogos-corredor, mulas-sem-cabeça, fantasmas arrastando correntes, assombrações de todo jeito. Nos sertões, após a boca da noite muita gente fecha janela e porta. De vez em quando aparece uma galinha destripada no quintal. Ninguém é doido pegar estrada em noite fechada, muito menos onde haja curva. Nem crucifixo e rosário os bichos respeitam, muito menos arma de fogo. Não adianta atirar em coisa do outro mundo. Nem o sangue escorre nem ele deixa de avançar. Somente a luz para fazê-los fugir. Uma boa lanterna na mão é a arma mais potente em noites assim. Ou, ao invés de chamar bicho feio chamar bicho lindo. Nenhum bicho feio quer ser chamado de lindo. Então foge em busca de um espelho para se enfeiar mais ainda.


Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

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