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terça-feira, 11 de outubro de 2011

PESSOAS DE VAGIDOS, LATIDOS E GRUNHIDOS (Crônica)

PESSOAS DE VAGIDOS, LATIDOS E GRUNHIDOS

                                  Rangel Alves da Costa*


Tal fato não é muito comentado, mas pessoas existem que de ser humano, como diz o outro, só têm o jeito e o nome, ainda que em animal dito irracional também se coloque os apelidos de gente. Cachorro sicrano, cobra fulana!
Verdade seja dita, mas muitas pessoas que andam por aí no passo e compasso como gente comum, não suportam uma aproximação maior para que se descubra que estão muito mais para bichos do que para humanos. O empesteamento é o mesmo, a pegajice também, pra não falar do medonho aspecto sorrateiro peculiar aos peçonhentos.
Há que se duvidar até que tenham sido procriadas por homem e mulher, geradas num ventre, passado cerca de nove meses no conforto materno até vir à luz para a felicidade dos pais. Ora, de normalidade para haver somente isso e até se poderia indagar de outra forma.
Ao invés do ventre materno, tais pessoas parecem ter sido geradas através de animais veneníferos, bichos asquerosos, seres bestiais. Porque a barriga materna é coisa sagrada, foram sendo gerados dentro de ovos de serpentes, nos casulos dos sanguinolentos, enterrados nas imundícies mais fétidas, e quando arrebentaram a casca do ovo ou pularam da redoma apodrecida já quiseram partir pra cima e engolir quem na infâmia lhes gerou.
Verdadeiramente não nascem, são despejados no mundo; o ovo, que sempre será uma coisa pura, ao sentir aquela podridão que se forma em suas entranhas simplesmente expele as vis criaturas. E jogadas no meio de onde jamais deveriam estar, pois no mundo só trarão infelicidades e tristezas para as pessoas de bem, começam a dar seus primeiros passos e logo procurando o que destruir pela frente.
Citou-se o ovo, contudo seu leito de geração poderia ser qualquer um que não o verdadeiramente humano. Ora, já nascem piando, grunhindo, zumbindo, latindo, sibilando, soltando vagidos e estertores, se rastejando pelo chão, correndo para os cantos com os olhos abrasados como os dos seres do outro mundo. A língua partida, à moda da cobra, segue adiante por onde rasteja, farejando o calcanhar mais próximo. E fará o mesmo com todos os calcanhares daqueles que forem traindo dali em diante.
Como não tem amizade com ninguém, vez que toda aproximação com as pessoas normais é no sentido de arrebatar-lhe os bons sentimentos, tirar-lhes o sossego, anuviá-los num mundo de preocupação e sofrimento, sorrateiramente fazem isso com largos sorrisos, gestos fingidos de amizades, abraços que mais tarde se transformarão em mordidas, ataques, destruições. E olham e sorriem, falam e tecem longos elogios, se propõem a ajudar e a estarem disponíveis para qualquer necessidade.
Contudo, no simples ato de estar na presença do outro, da pessoa de bem, no seu íntimo já vão averiguando onde o bote será dado, onde a mordida fará verter mais sangue, onde o indivíduo é mais fragilizado, por onde começará de vez a tomar suas forças. E logo fica imaginando qual o lugar mais apropriado para o ataque, por onde a pessoa costuma passar, com quem costuma andar e se possui alguma coisa que possa servir de proteção à ofensa.
Quem acha que não é assim basta confiar em todo tipo de gente que está ao redor, que chega se oferecendo demais, que é desmedido em gentilezas e agraciamentos mesmo sem lhe conhecer. Acredite ou não, mas serpente também usa sapato e batom vermelho; morcegos sanguinários saem por aí de paletó e gravatá; corvos, lobos, tubarões e aranhas venenosas passeiam pelas ruas, falam ao celular, fazem compras e se divertem. O bicho-papão não é só uma ilusão de meninice.
Não ouço esses bichos com seus alaridos, grunhidos e sibilos, contudo sei que neste momento já saíram de suas tocas, buracos e fendas escurecidas e estão no meio de nós. Também não sei qual de nós ainda é completamente humano ou se porventura existirá um passarinho de revoada. Não sei nada disso, mas sei que humanos fingidos de humanos existem. Por isso quero sempre acreditar que caminho por entre e ao lado do silêncio e da invisibilidade dos anjos.




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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