Rangel Alves da Costa*
Esperei-te o dia inteiro; de ontem, dos dias passados, desde a despedida e da palavra que voltaria. E hoje, quando a noite chegar, lá debaixo da lua estarei antes que ela adormeça.
Os dias, com suas cores e suas luzes, seus barulhos e movimentos, não conseguem afastar tão belo pensamento, pois em você. Contudo, a grandiosa presença, ainda que na distância, se dá após as sombras da noite descerrem sobre a minha montanha.
Minha montanha está na planície do meu caminhar, chão do meu quintal, da minha janela, da minha varanda ou ao redor onde a noite me encontre. Mas é a maior e mais alta que existe, e em cujo cume posso ver todo além do mais distante.
Ao anoitecer vou logo subindo seus íngremes caminhos; quando a escuridão se completa já estou no ponto mais alto, ouvindo uma velha canção, folheando o álbum de uma só fotografia, relendo carta e bilhete. E diante da lua...
Diante da lua, debaixo da lua, olhando pra lua, falando com a lua, tocando a lua, sentindo a lua, amando a lua. Tudo na lua, e simplesmente porque nela a sua feição, o seu olhar, a sua palavra, o seu corpo, a beleza iluminada.
Noutros dias - instantes de paz espiritual e felicidade no coração -, era debaixo da lua que eu fazia promessas, ouvia cantiga de sua boca, as mãos se juntavam para o passeio, os lábios experimentavam o sabor um do outro.
Sob a luz do luar eu deitava no seu colo macio, rolava na relva molhada, catava flor escondida para embelezar meu amor. E na face molhada de luz, na pele dourada pelo brilho se derramando, tantas vezes enxerguei uma deusa, uma sílfide com sua magia.
Nas vezes que a noite chegava, a lua descia e você não estava, nos momentos assim eu adormecia ali mesmo, debaixo da escuridão brilhosa, para sonhar com o já vivido. E os braços do vento a me abraçar, o zunido da noite a cantar cantiga, e você na lua lá em cima.
Nossos instantes, nosso costume diferente de namorar, pois se aperfeiçoando na noite, na escuridão, debaixo da lua e do horizonte estrelado, terminava sempre sonhando com o alvorecer sobre o rosto.
Tantas vezes deitamos assim, adormecemos assim, sonhamos assim, sobre o leito de relva, nas folhagens do jardim, nos descampados distantes, em cima de nossa montanha. E a manhã chegava tocando suave no nosso rosto e dizendo que a próxima noite logo mais chegaria.
Depois daquele alvorecer que você partiu e esqueceu de voltar, toda manhã que encontro pergunta por que agora desperto sozinho. Respondo apenas que ainda naquela noite estaremos caminhando pelo leito enluarado da noite. E na manhã seguinte despertaremos juntinhos.
Mas ando repetindo muito a mesma coisa. Manhã nenhuma acredita mais no que digo; não há mais anoitecer que me traga o perfume do dia, não há mais escuridão que venha com espelho iluminado para refletir meu sorriso alegre. Todos já sabem que estou sozinho.
Por isso preciso que você chegue antes que a noite apareça e a lua adormeça. Como venho fazendo todos esses dias, após o sombreado chegar não consigo buscar outros caminhos senão aqueles tão conhecidos por nós dois. Caminho errante, sem mão de abraço, sigo e perco meu passo esperando você.
Solitário na escuridão, os vaga-lumes acompanham os meus passos até a montanha, até o relvado, até o leito sem flores. Sempre segui e consegui voltar na manhã seguinte. Mesmo triste, desalentado, aflito, sempre consegui voltar na manhã seguinte, logo após o alvorecer.
Mas hoje sei que vai ser diferente. Ontem a lua me disse que tinha uma lua de mel pra nós dois. Mas também disse que hoje é o dia do amor, do amar, se entregar. Só hoje, e talvez para a eternidade.
Por isso precise que você venha, que você chegue antes que a lua adormeça.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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