Rangel Alves da Costa*
Inquestionavelmente, a insanidade é o estado psicológico mais oportunista que há. Mesmo não se comprovando a loucura, a demência, a doidice, a maluquice ou coisa que o valha, ainda assim a insanidade será utilizada como justificativa para quase tudo. Que seja doidice mesmo ou gesto de esperteza.
Os sintomas e as atitudes próprias dos insanos são mais que conhecidos. Atirar pedras é apenas um gesto. E dos mais sublimes. Fazer careta e dar a língua são quase como cordiais cumprimentos. Ademais, o ser humano dito normal vive fazendo tantas maluquices que é até difícil discernir as atitudes de um doido varrido de um estouvado social.
Contudo, pautar-se pelos delírios, ir de encontro à lógica do mundo e daí em diante passar a viver praticamente fora da realidade – por causa da outra imaginária realidade -, já pode ser visto como sintomas de outro tipo de insanidade. E esta pode ser descrita como maluquice intencionalmente provocada. Ou doidice premeditada.
Contudo, o problema é que este tipo de insanidade, onde o indivíduo parece agir para ser reconhecido como louco, acaba realmente provocando alienação. Quer dizer, de tanto provocar situações insanas, o sujeito acaba tendo a insanidade como normalidade. Tudo continua normal para o mesmo, age como estivesse com juízo perfeito. Mas outras pessoas já não o veem assim.
Nos Estados Unidos existem muitos malucos assim. De vez em quando os canais pagos mostram reportagens com pessoas que outra coisa não fazem senão se preparar para o fim do mundo. Então se danam a estocar alimentos liofilizados, enchem a casa de armas e medicamentos, constroem abrigos subterrâneos, armazenam tudo que supostamente possa deixá-los em segurança assim que desponte a catástrofe.
E cada maluco desses se prepara de um jeito diferente para o fim do mundo. E isto porque o tal fim, segundo imagina, não virá, por exemplo, como uma catástrofe apocalíptica, mas sim pela ação humana. Então afirma que o mundo certamente acabará, e dentro de pouco tempo, por uma guerra nuclear, pela escassez de alimentação ou de água no planeta ou pelo colapso total das economias mundiais, dentre outros palpites sinistros.
Como afirmado, o problema é que uma suposição de fim do mundo acaba tomando totalmente a vida dessas pessoas, ou desses malucos. De repente começam a acreditar que o fim está próximo mesmo, que uma guerra nuclear ou uma epidemia incontrolável vai devastar tudo. E para se salvar somente preparando antecipadamente seu refúgio. Nada mais fazem do que deixar tudo preparado para o inevitável momento.
Verdade é que mentalizam tanta certeza que o mundo está chegando ao fim que vão realmente enlouquecendo. E morrem loucos e sem o mundo acabar. Muitos acabam praticando suicídio - até mesmo coletivo, incentivados que são por alguns líderes espirituais megalomaníacos - diante da impossibilidade de se confirmar o tão realisticamente anunciado.
O que surge como pensamento, medo ou mera sugestão, de repente vai se firmando de tal modo na mente dessas pessoas que não há mais como voltar atrás, desacreditar. E uma vez a crença se tornando verdade absoluta, então nada mais conseguirá demover das mentes as situação que chamaram para si como verdadeira. Já estarão completamente loucos.
E por louco será tido todo aquele que ousar dizer que a história de fim do mundo não passa de maluquice. Para se ter uma ideia, em dezembro do ano passado, quando corria solta a história de que o mundo acabaria no dia 21, milhares de pessoas tidas como absolutamente normais procuraram abrigos, centros espirituais, locais em meio à natureza, com a certeza de que a profecia maia realmente aconteceria.
Mas o mundo não acabou. Ao menos ainda, ao menos para os que continuam vivos. E o que dizem a respeito as pessoas que se desfizeram de todos os bens, que doaram seus pertences ou simplesmente renegaram todos as suas conquistas para alcançarem a passagem de modo puro e liberto?
Afirmam simplesmente que o fim do mundo apenas foi adiado, mas que a mesma profecia logo acontecerá. E fazem isto porque internalizaram de tal modo a ideia de fim, de destruição, de ruína, que outra coisa já não fazem na vida senão desejar que algo catastrófico realmente aconteça.
Se tais doidos tivessem o dom da profecia logo perceberiam que o mundo não precisa de um evento extraordinário e repentino para chegar ao fim. Todo bom profeta sabe que o mundo já está acabando aos poucos. Primeiro morreram as boas virtudes humanas, depois sucumbiram as esperanças de fraternidade. E assim, passo a passo, o mundo se finda.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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