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segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

O ROUBO DO SORRISO DA MENINA – 22 (Conto)

O ROUBO DO SORRISO DA MENINA – 22

Rangel Alves da Costa*


Na noite anterior, assim que deixou o jardim e entregou Lucinha aos cuidados da mãe, o médico foi imediatamente procurar o pai da menina, que já o aguardava cheio de ansiedades. Contudo, a chegada de um rapaz sorridente e sem demonstrar qualquer tipo de apreensão, o fez mais confiante e até confortado.
"Mas afinal, doutor, conseguiu algum progresso lá no jardim?", foi a pergunta necessária, ao que o rapaz respondeu calmamente:
"Nossa menina está realmente com um problema grave, posso até dizer que muito sério. Contudo, não precisa se preocupar porque não diz nenhum respeito a problemas de saúde ou qualquer sintoma de doença que possa lhe causar qualquer risco. Quando digo que o problema é grave o faça no sentido de afirmar que nenhum médico, de qualquer especialidade que seja, não tem capacidade nem habilidade para resolver o problema existente em Lucinha...".
O pai da menina interrompeu para perguntar, definitivamente, qual o problema que afligia a menina. E o médico procurou responder ainda dentro de sua linha de raciocínio:
"Calma que chegaremos lá, calma. Como eu já disse, há sim um problema grave, mas nada de assustador e que não possa ser resolvido. Porém repito que não será resolvido por nenhum médico, vez que o problema dela só tem um remédio, e este está ali no jardim...".
"O senhor quer dizer que ela precisa tomar algum chá, alguma infusão ou alguma coisa que envolva ervas medicinais que podem ser colhidas no jardim?", perguntou o pai, interrompendo mais uma vez as explicações do outro.
"Mas nada disso doutor Paulo, nada disso. Não tem nada a ver nem com chás nem com ervas medicinais do jardim. A verdade é que alguma coisa existente ali no jardim está interferindo psicologicamente na menina e no momento que este fator de interferência for descoberto imediatamente ela voltará a ter uma vida normal como antes, brincando e sorrindo como sempre. Ela me contou uma história que pode ajudar muito nessa descoberta. Segundo ela, aconteceu alguma coisa com umas rosas que havia ali e depois disso essas flores ficaram lhe atormentando, pedindo para que destrua as outras flores. Assim, doutor Paulo, quando o problema dessas flores for resolvido tudo também estará resolvido com Lucinha. Agora, nem me pergunte como esse caso entre as flores possa ser resolvido que não poderei responder, pois totalmente fora da esfera dos meus conhecimentos acadêmicos. Isso talvez seja da competência do jardineiro, de algum paisagista ou de quem conheça bem de jardins e flores. O certo mesmo seria contratar um detetive de flores, mas sei também que isto não existe..."
"Existe sim, e lá no jardim já tem uma planta detetive". Quem falou foi Lucinha, surgida na sala sem que ninguém esperasse. Certamente tinha ouvido boa parte da conversa, e isso não era nada bom, segundo o médico concluiu depois. É que conhecendo o problema poderia rejeitar os meios de solução encontrados.
Apareceu ali apenas para dizer isso, pois voltou em seguida para onde estava. E quando ela saiu seu pai falou baixinho:
"Depois vou me inteirar dessa história toda de planta detetive. Não se preocupe não que vou conversar com o jardineiro sobre isso. Mas tem um ponto que foi dito que acho muito interessante. Se for verdade mesmo essa conversa de que as rosas mortas exigem que Lucinha mate também as outras flores para que ela volte a ser como antes, não seria o caso da gente acabar de vez com todas as plantas que tenham flores no jardim, só para ver se tal atitude traz algum efeito? Eu mando acabar com todas as flores que estão lá e em seguida mando o jardineiro providenciar novas plantas floridas. O que o senhor acha doutor?"
E o médico respondeu: "Já disse que não sei nada sobre essas coisas. Porém posso dizer como alguém que também é apaixonado por flores e jardins que essa atitude pode ser um baque muito grande para a menina. Assim, o que seria a solução do problema pode se transformar em algo pior e ela ficar traumatizada para sempre. Mas se pensa realmente em fazer isso, então sugiro que programe uma viagem o mais rapidamente possível e só retorne com a família quando as outras flores já estiverem instaladas. E que sejam as mais lindas do mundo, pois quando Lucinha retornar e descobrir o que foi feito ao menos não sofrerá um impacto muito grande".
"Boa ideia, doutor, excelente ideia. Vou providenciar essa viagem imediatamente".
Mas de onde estava Lucinha gritou:
"Não quero viajar pra lugar nenhum!".


continua...




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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