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quarta-feira, 3 de julho de 2013

O SILÊNCIO PROFUNDO DA LUA (Crônica)


Rangel Alves da Costa*


Ouvi dizer que na lua faz um profundo silêncio. Não há uma só voz, não há um só canto, nunca se ouve um grito. Também não há murmúrio, um sussurro de amor sequer. Mas não acredito.
Não acredito pelo que, aqui de baixo, imagino e enxergo lá em cima. Não poderia ser tão silenciosa se ali moradia de São Jorge, do dragão e de tantos mistérios existentes. Contudo, não é por isso que desacredito no silêncio da lua. Muito mais há para que eu pense assim.
Pelo significado da lua já é fácil perceber da impossibilidade de seu profundo silêncio. Lua é poesia, é romantismo, é magia, é sonho, é asa e voo, é vontade e desejo, é canto e canção, é promessa de amor, é encantamento e fascínio.
Não tão belo assim, mas a visão da lua, principalmente quando está cheia, imensa, com brilho contagiante, faz despertar no sentimento situações angustiosas e aflitivas. A saudade, a recordação, a relembrança, o passado que povoa o instante, a imagem surgida de algo tão doloroso.
O doido é a prova maior do ruído lunar. Nos dias de lua cheia, naqueles instantes em que sua mente se toma de aflições, certamente que ele ouve não só a palavra, mas o grito da lua. E num chamado tão intenso e impulsivo que procura responder a qualquer custo. Por isso quer voar, ergue as mãos naquela direção, se entrega voraz à misteriosa e atraente luminosidade.
No negrume da noite, debaixo da lua, no murmurejar da natureza pelos descampados, o ser caminhante dialoga incessantemente com a lua. Seus olhos dizem tudo, a boca também se abre de vez em quando. E surgem as perguntas, as indagações, a busca de respostas para a sua solidão, o seu desamor, o seu entristecimento, os seus sonhos e desejos ainda não realizados.
Por tudo isso, e muito mais, não posso aceitar que a lua permaneça calada, inerte em qualquer palavra, apenas existente na sua grandeza. Na sua própria dimensão é possível ouvir sons, alaridos, canções. É um imenso salão iluminado, com candelabros e abajures multicolores, acordes flamejantes que se espalham pelo universo. Ali há certamente uma valsa, um baile romântico, cujos dançarinos povoam o nosso olhar.
Talvez seja pela sua constituição física, bem como sua distância, que levem a considerá-la como silenciosa e triste. De solo inconstante e cheio de crateras, com mares e rios sem água, se alastrando num deserto quase infinito. É uma imensa massa circundante no espaço, girando e girando, mostrando suas faces tão incompreendidas pelo olho humano.
Mais provável, contudo, que o seu silêncio e aspecto entristecido sejam motivados pelas suas faces ou fases. A maioria das pessoas pouco valoriza a lua cheia, bonita, imensa, cheia de poesia; do mesmo modo dão pouca importância ao quarto crescente e ao quarto minguante. Mas se volta para o alto precisamente quando a lua está oculta no céu, na sua fase nova.
Na lua nova, com ela escondida, sua face oculta passa a representar a própria pessoa e seu olhar. A alma cadente, o espírito fragilizado, a angústia e outros sentimentos pesarosos, tudo passa a se amoldar ao aspecto da lua que não é encontrada lá em cima. A lua triste, escondida, silenciosa, perdida no breu dos tempos, passa a espelhar o ser humano na sua noite espiritual, no seu tormento.
Daí o silêncio profundo da lua. Não que ele exista, pois sempre vivacidade e luz no outro lado de sua face, mas pela simbologia melancólica que passa a representar. Daí que a fragilidade íntima impede de ouvir sua voz, o seu canto, o seu grito. No mesmo silêncio profundo vivenciado pelo ser.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com  

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