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terça-feira, 18 de janeiro de 2011

INUTILIDADES E ESPERTEZAS (Crônica)

INUTILIDADES E ESPERTEZAS

Rangel Alves da Costa*


Qualquer pessoa que encontre numa estante de casa ou numa biblioteca um desses livros bonitos, grossos, de capa dura e vistosos, com um título assim “O Livro de Ouro das Palavras Sábias”, “As Frases Mais Sábias do Mundo” ou “Gotas da Sábia Sabedoria”, certamente logo demonstrará a maior reverência, segurando-o cuidadosamente e folheando-o como se fosse orvalho.
Da mesma forma o espanto admirativo que surge no olhar ao se deparar com obras vetustas de títulos mais que intuitivos. Mas quem não demonstrará imediata admiração e curiosidade ao ter à sua frente títulos como “A Oratória do Enriquecimento”, “Duas Palavras Para Conquistar o Mundo”, “Sua Riqueza na Sua Boca”, “A Arte de Falar Pouco e Ganhar Muito”?
Noutras estantes e cabeceiras certamente não há de faltar os ditos livros de auto-ajuda, que são aqueles que ajudam somente a enriquecer o escrevinhador astuto ou o psicólogo fracassado. E os títulos são de uma inteligência incrível, de engenhosidade tamanha, como forma de apelar descaradamente para a inocência de certos incautos. E quantos existem por aí!
Realmente satisfaz o olhar quando ele, de repente, vê que diante de si está o remédio absoluto, a cura imediata e comprovada de todos os problemas. E as capas já indicam que tal best-seller já vendeu não sei quantos milhões, já está na centésima edição e coisa e tal. E vai estar lá: “Aprenda a Ser Você Mesmo e Seja Outro Sendo Você”, “Se Você Não Morreu é Porque Existe, Então Se Torne Rico Agora Mesmo”, “A Dieta do Enriquecimento”, “A Dieta Que Cura Tudo e Emagrece no mesmo Dia”, “Você é Ouro, Se Penhore!”.
Até aí tudo bem, pois os títulos são como chaves esperando mãos para que abram as portas. Quanto mais chamativos e apelativos mais o povo se reconhece na sua fragilidade e precisão. Por outras palavras, quanto mais iludir, mentir e abusar da inocência dos psicologicamente desajustados, mais chances possuirão de receber aceitação. E quantos aceitam esses falsos supra-sumos que surgem a cada instante.
Dependendo do milagre que o livro pretenda fazer, logo adiante o desesperado, angustiado e privado de qualquer senso crítico, poderá ler capítulos e mais capítulos de caldeirões de feitiçarias, de magias comportamentais, das lições e métodos mais esdrúxulos para tudo na vida. E é preciso ler com cuidado, pois as palavras parecem ter sido escritas como sentenças incontestes e dogmas absolutos.
“Até ontem você era um fracassado porque pensava que era qualquer um. Vivia no meio do povo comum e compartilhava com este os mesmos sofrimentos e desesperanças. Mas agora que você vai dar novo rumo à sua vida, procure viver entre os bons, os escolhidos e os iluminados, que são os ricos e endinheirados. Faça tudo que eles fazem e a eles se igualará em tudo. Se eles roubarem, roube também; se eles viverem de falcatruas, faça o mesmo”.
“Não adianta você querer emagrecer gastando o seu dinheiro com comida. Gaste o que tem com psicanalistas e adquirindo livros que elevam sua moral e sua estima. Ficando sem nenhum tostão, você nem vai poder lanchar e ainda por cima ficará angustiada e triste. E tudo isso ajuda a emagrecer”.
“Um grande sábio um dia disse que o amor é o amor. E veja que palavras mais profundas: o amor é o amor! Faça de sua vida uma extensão da lição do grande sábio, aceitando sorrindo e demonstrando prazer em todo o mal que lhe fizerem, pois o amor é o amor”.
“Não trate os outros como se fossem bichos. Lembre sempre que o bicho é você. E porque os outros respeitam e protegem os animais, então todos viverão em plena felicidade”.
E quantas palavras sábias, quantas lições de ouro. E quanta gente inocente nessa vida!



Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

Um comentário:

Caca disse...

Oi, Rangel! Eu comecei a ter uma repulsa com esse tipo de literatura já na adolescência. Há mais ou menos uns trinta anos, quando era morador de república estudantil, apareceu por lá um oportunista que não tirava de sob as axilas um livro chamado COMO FAZER AMIGOS E INFLUENCIAR PESSOAS. O cara era uma das pessoas mais abomináveis que conheci. Eu associei aquilo com o tal livro e comecei a desconfiar dos propósitos de quem faz este tipo de literatura. Não posso generalizar, mas de tudo o que já vi e li até hoje, não tenho um sequer digno de nota. Abraços. Paz e bem.