DANDINHA, A MATADORA
Rangel Alves da Costa*
Casado com Dandinha e enlouquecido de paixão pela tal, tudo o que ocorria em casa o esposo logo mais ia contar a uma velha conhecida.
Então ele chegava e dizia:
“Você soube que Dandinha quer me matar?”.
“Mas que conversa é essa homem?”.
“Pois é, mas matar de beijos, de abraços, de amor, daquelas coisas que a gente faz quando finge que vai dormir...”.
“Ainda bem, ainda bem...”.
Então ele chegava de novo:
“Você soube que Dandinha quer me matar?”.
“Mas de novo com essa conversa homem, que tanto morrer é esse?”.
“Pois é, mas matar de susto. Ela me disse pra não chegar sem bater primeiro na porta de casa, mas ontem cheguei lá sem avisar e tomei até um susto quando ela apareceu toda suada e ofegante na porta do quarto, e de lençol encobrindo aquele corpo só meu...”.
“Ainda bem que você tem certeza, ainda bem...”.
Então ele aparecia novamente:
“Você soube que Dandinha quer me matar?”.
“Pelo jeito você é gato, tem sete vidas. Mas como foi essa história homem?”
“Pois é, mas matar de prazer. Só pode ser de prazer, pelo jeito é. Imagine que ela agora inventou da gente nem dormir junto por uns tempos, deixando também de fazer aquilo. Ela dorme no quarto e eu durmo trancado no quartinho dos fundos. Diz ela que é pra quando for daqui há alguns dias a gente tá pegando fogo, com vontade de não acabar mais. Espie se ela não quer me matar?”
“Matar não sei não, mas coisa boa não é não, disso já tá mais que bem claro e entendido. Abra o olho homem, abra esse olho pontudo!”.
Então ele aparecia apressado e dizia:
“Você soube que Dandinha quer me matar?”.
“Não sei como você ainda tá vivo. Certa vez um homem se enganchou na porta e morreu porque a mulher não ajudou ele a tirar as galhas presas na madeira. Mas por que ela quer lhe matar novamente?”
“Pois é, mas matar de satisfação. Quantos homens têm uma mulher como a minha, que faz comidas e mais comidas gostosas, tudo saboroso demais, e depois ainda guarda um pouquinho pra mim? Tem amigo que até está indo experimentar direto a comida de minha mulher. Não me importo não, pois sei que o tempero dela é dos melhores mesmo. Então, quem tá com fome que coma um pouquinho, não é mesmo?”.
“Comida boa é pra se lambuzar mesmo, ainda mais como a de sua mulher. Aliás, sua mulher sabe fazer um mexido como ninguém. A panelada dela é famosa há muito tempo, só não sei por que você veio perceber somente agora. Não sei nem como ainda sobra um tantinho pra você, já que tem tanta gente comendo”.
Então ele aparecia quase correndo:
“Você soube que Dandinha quer me matar?”
“De tiro ou de peixeira? Homem, já disse que deixe dessa história dela querer lhe matar com isso ou aquilo, assim ou assado. Acho melhor você ficar de olho é em outras coisas, pois se ela for matar alguém, e com outras armas poderosas que ela possui, certamente não será você, disso tenho certeza. Homem, se ajuíze homem, faça o teste da porta”.
“Pois é, mas matar de alegria. Até milagre tá acontecendo lá em casa, pois há mais de seis meses que a gente não faz aquilo bem bom e agora ela veio e me deu a notícia mais maravilhosa do mundo, dizendo que está grávida de um nenenzinho nosso. Não é um verdadeiro milagre, não é pra me matar de alegria?”
“Bote milagre nisso. Pode ter certeza que sua Dandinha vai ser beatificada com bucho, macho e tudo. Homem, já disse, se ajuíze, faça o teste do chapéu”.
Noutra vez ele chegou todo nervoso:
“Já descobri tudo. E quem vai matar ela sou eu...”.
“Já descobriu tarde demais. Mas não mate ela não, apenas deixe a safada”.
“Mas não é nada disso não, Deus me livre. Descobri que ela tem medo de dormir só durante a gravidez e permiti que uns amigos meus se revezem vigiando ela enquanto tenta cochilar. Mas ela não sabe ainda disso não. Quando eu disser, quem vai matar ela de prazer sou eu”.
“Você? Se ajuíze homem, faça o teste da testa suada. Passe a mão nela pra ver uma coisa...”.
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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