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A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

E HAVIA UMA JANELA E UM HORIZONTE (Crônica)

E HAVIA UMA JANELA E UM HORIZONTE

Rangel Alves da Costa*


Não há desculpa para fazer da solidão o fim do mundo. O fim do mundo existe, mas somente para quem pensa que é muito feliz, para quem se ilude com a felicidade. Quem vive de aparência não suporta um pingo de chuva que caia e então o mundo acaba de vez.
A realidade está diante de todos é para ser, senão vivida, ao menos assumida. Não adianta fugir da angústia do tempo, do calendário que vai passando e do relógio que parece inimigo. Se o trem está nos trilhos é mais proveitoso estar sentado numa de suas janelas apreciando as paisagens do que ficar em frente ao primeiro vagão de braços abertos.
Procurar o pior para viver se alimentando de pessimismos também não adianta. As coisas nunca são como as pessoas desejam, daí que muitas vezes a arma sangra e quebra o espelho sem acabar com a vida daquele que não quer se vê. E do mesmo não adianta se jogar do penhasco porque lá embaixo há um rio.
Contudo, se a pessoa decidiu se fechar para a vida, buscou por conta própria a reclusão nos labirintos medonhos do seu inconsciente e tanto faz como tanto fez para tudo que ocorre ao redor, porque pensa que não há mais amor, família, amizade nem nada, é melhor realmente seguir o caminho apropriado. Talvez fazer como fez a outra um dia.
Essa outra, que aqui vou chamar de alguém, tinha mais que motivos para viver fechada na sua solidão, pois rejeitada por todos porque não queria acompanhar os modismos mais banais existentes; para se enclausurar com sua tristeza infinita, vez que jamais conheceu um rapazinho que não tivesse falado em sexo antes de saber o seu nome; para viver desesperançada e cheia de angústia, pois sentia que para conseguir qualquer coisa da vida tinha que ferir seus princípios morais e sua consciência.
Sem fazer disso um espetáculo, uma encenação teatral para que os outros sentissem pena de sua situação e de vez em quando a procurassem para magicamente ensinar os caminhos da alegria, do sorriso e da felicidade, ela simplesmente procurava se comportar como o relógio solitário: se consumindo a cada batida silenciosa do coração.
Assim, se trancava no quarto, abria a janela, ficava vivenciando o seu torturante mundo e de vez quando dialogava com o seu eu ainda não padecente, não afetado por tanta dor e sofrimento. Esse outro eu persistente jamais deixava que as luzes fossem totalmente apagadas na escuridão, não aceitava que a janela ficava trancada em qualquer instante, não deixava que ela abaixasse a cabeça para fazer desaguar rios de lágrimas.
Esse outro eu que ainda procurava vencer as barreiras e dificuldades existentes, diferentemente do que se possa imaginar, não confrontava de vez com a outra parte dilacerada. Pelo contrário, muitas vezes adentrava no seu cerne e tudo se transformava em verdadeira aflição, mas apenas como forma de conhecer os limites daquela angústia e sofrimento e assim procurar reverter a situação.
E depois esse eu persistente, essa alma e espírito de força e luz que nunca desampara os desalentados, não só abria ainda mais a janela, fazendo as forças positivas da natureza adentrarem com todo o brilho e encanto, como chamava as forças mágicas existentes nos seres das florestas, no canto dos pássaros e na força do vento, para a festa do renascimento.
E segurava na mão do eu solitário e triste e o conduzia bem diante da janela aberta, enorme, iluminada, cheia de bons fluídos e forças positivas, e mandava que abrisse bem os olhos e mirasse o horizonte, perguntando depois se conseguia enxergar alguma coisa que justificasse a tristeza e essa vida angustiante de solidão.
O outro nada respondia, apenas sorria. E o vento passava para levar pra bem longe as angústias que não faziam mais moradia ali.



Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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