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quinta-feira, 5 de maio de 2011

NOVÉJIAS MERICANAS: NÃO SE VÁ, NÃO, NÃO! (Sátira)

NOVÉJIAS MERICANAS: NÃO SE VÁ, NÃO, NÃO!

Rangel Alves da Costa*


Dolores Hurtado era uma linda mulher, morena jambo de feições indígenas, cabelos negros escorridos sobre as costas, passo e requebro de mulher que chamava atenção dos homens assim que passava.
Contudo, essa encantadora mulher não era livre para as paixões, para o amor. Era casada, ainda que não tivesse filhos, com Rafael Miguel, também muito simpático, um pouco mais jovem do que a esposa, fazendo sempre o tipo sedutor por onde passava.
Na verdade, Rafael Miguel somente casou com Dolores Hurtado por interesse, sem ao menos considerar a beleza excitante de sua companheira. Eis que a família dela, na pessoa do patriarca Don Benvindo Hurtado y Hurtado, era uma das mais ricas da província.
Talvez tenha sido o jeito sedutor do jovem que tenha despertado o amor de Dolores, pois outra motivação seria difícil encontrar. Rafael era desempregado, tendo reprovável convívio social, chegando mesmo a ser reconhecido como incorrigível mulherengo.
Amando aquele rapaz, Dolores Hurtado praticamente cegou para os seus defeitos, incutiu na família o acerto na escolha do homem de sua vida e acabaram casando em grandiosa festa.
Mesmo não deixando que nada faltasse à filha, o patriarca Don Benvindo Hurtado y Hurtado fazia constantes cobranças sobre os modos de vida do genro. Após dois anos de casamento e continuava sem trabalhar, apenas usufruindo do que para esposa era colocado à disposição para viverem com dignidade.
Mas a verdade é que Rafael Miguel começou a se comportar de maneira ainda mais reprovável. Exigia que a Dolores lhe desse dinheiro e passava dois, três dias, sem colocar os pés em casa, vivendo diuturnamente em jogatinas e dormindo com mulheres baratas. Até mantinha uma amante vulgar.
Ainda completamente apaixonada, mesmo com os atos deploráveis do esposo, todas as vezes que retornava ela o enchia de beijos, carícias e abraços e implorava pelos prazeres sexuais. E chegou um dia que ele afirmou que só faria sexo se ela aumentasse sua mesada.
Não durou muito, reclamando que aquela quantia que ela lhe entregava não dava para continuar salvando a vida de uma velha tia sua que estava muito doente, mentindo logicamente.
Então passou a cobrar por cada relação sexual que manteria com a esposa. E cada vez aumentava mais o preço, exigia mais e ainda assim acabava recebendo aquilo que desejava.
Pouco tempo passou e Rafael Miguel começou a chantagear Dolores Hurtado de uma forma diferente. Eis que arrumava a mala e dizia que estava abandonando a casa. E em prantos, cheia de comoção, ela corria para os seus braços e dizia: Não se vá, não, não!
Aproveitando-se da paixão e fragilidade da esposa, conseguia uma quantia ainda maior de dinheiro e depois sumia por uns dias. Ao retornar, dizendo que estava cuidando da pobre e moribunda parenta, chegava a chorar, lamentando não ter nem mais um tostão para comprar os medicamentos caríssimos que ela tanto precisava. E conseguia o que queria.
Outro dia resolveu mandar um emissário buscar sua mala e Dolores disse que só entregaria ao próprio Rafael. Este chegou em instantes e encontrou-a aos prantos, porém ele disse que realmente havia chegado a hora de se despedir. Então ela se ajoelhou a seus pés e implorou: Não se vá, não, não! E perguntou o que ele queria ouvir, que era de quanto precisava.
Passados uns cinco dias ele bateu à porta e ninguém abriu. Esperou um instante e chamou bem alto, tocou a companhia diversas vezes, mas quando ia tentar derrubá-la, eis que um rapaz musculoso, suado, descamisado, surge e pergunta o que ele queria para lhe tirar de momentos de prazer.
Sem entender nada, Rafael Miguel argumentou que aquela casa era dele, ali morava sua esposa e que apenas estava retornando. Olhou adiante e avistou a esposa descabelada saindo do quarto, coberta apenas por uma toalha de banho. Ao vê-lo na porta querendo entrar, Dolores apenas disse que o amante entregasse aquela mala que estava ali ao lado.
E foi a vez de Rafael Miguel dizer: Não se vá meu amor, não, não! Mas já era tarde demais.
FIM



Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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