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segunda-feira, 30 de maio de 2011

QUANDO OS LOBOS UIVAM (Crônica)

QUANDO OS LOBOS UIVAM

                 Rangel Alves da Costa*


Os lobos, esses canídeos selvagens, predadores e solitários por natureza, são romanticamente lembrados pelos seus longos e tristes uivos nas montanhas enegrecidas, debaixo da lua cheia.
Todas as vezes que se fala nos gritos silenciosos em noites de solidão sempre se toma o lobo solitário como referência. E até se torna fácil mentalizá-los por cima dos montes, com a cabeça volta pra lua, seus dentes afiados sobressaindo e os uivos, os longos e tristes uivos.
Mas por que os lobos uivam tanto e sempre procuram lugares bem altos, geralmente rochedos e montanhas, para expressar sua solidão. Não seriam de tristeza, aflição, angústia, desespero, dor do abandono, os uivos dos lobos?
Dizem que os lobos uivam para dizer que estão presentes naquele lugar, que existem, mas que estão solitários, em busca de uma resposta, à procura de outro animal. Mas dizem também que esse ruído peculiar nada mais é do que o mais angustiante e doloroso grito de um coração que não mais tem por quem chamar.
Mas outros, talvez pretendendo negar o poder sentimental dos lobos, dizem apenas que o uivo é o meio através do qual eles mantêm contato entre si. Contudo, não negam que esses sons, muitas vezes assustadores aos ouvidos humanos, são emitidos por lobos muito solitários e, provavelmente, para manifestar o desejo de uma companhia.
Diante do que foi dito acerca dos lobos selvagens e seus uivos, urge perguntar: Por que tantas pessoas sobem nas montanhas, em noites do mais cortante entristecimento? Por que parece se ouvir gritos, ruídos, lamentos, chamados aflitos, verdadeiros uivos de lobos solitários? Por que parece que faces se voltam pra lua e corpos de braços abertos querem encontrar significados para suas noites, seus instantes de solidão, suas vidas solitárias?
Não possuem caninos afiados, não assustam, não são apavorantes como os lobisomens nem selvagens quanto os lobos, mas verdadeiras matilhas vagam pelos ares da noite procurando aquilo que não conseguiram encontrar durante o dia. O dia inteiro na esperança de uma lembrança ao anoitecer, um telefonema, um encontro marcado, um toque na porta e nada.
Ora, pessoas tão normais, tão alegres, amigueiras, parecendo sempre felizes e contentes e basta se aproximar o anoitecer e vão se transformando totalmente. Mas também todo mundo sabe que as angústias, as dores da solidão e outros sentimentos não andam tão visíveis assim pelos rostos.
Talvez seja por isso que todas as feições exteriores de determinadas pessoas, inclusive suas roupas, seus pertences e seus luxos nada mais são do que falsas couraças encobrindo ou tentando esconder verdadeiros lobos que não vêem a hora da noite chegar, a lua descer suas cores de abandono, para subirem nas suas montanhas para os uivos de sempre.
Talvez nem fechem bem as portas atrás de si para se transformarem em lobos. Ali à frente, logo ao primeiro olhar, na montanha mais alta do quarto, da sala ou da varanda, estará sempre a lua repousando sobre a fotografia, sobre a carta esquecida em cima da escrivaninha, sobre os restos de um amor que nunca foi esquecido. E então vão surgindo os uivos, os tristes uivos de lobos tão solitários.
E as matilhas vão vivendo os seus dilemas, buscando suas explicações, como se aqueles uivos molhados de uísque, cheios de fumo dos cigarros, molhados pelos lenços que se espalham ao redor, fossem trazer respostas.
Nunca trazem porque as montanhas sempre estarão no mesmo lugar à espera de seus lobos e estes animais indomáveis parecem não querer conhecer outras paisagens que transformem seus gritos em leves cantos nem passear pelos trigais que tão belamente brilham ao anoitecer.
Por isso que há muito decidi descer da montanha. Ser lobo jamais. Basta-me ser ostra imersa nas águas profundas por baixo dos travesseiros. As lágrimas inundam, silenciosamente, e gritam, mas somente eu posso ouvir.



Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com 

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