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A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



terça-feira, 31 de maio de 2011

AS MAL-FALADAS (Crônica)

AS MAL-FALADAS

              Rangel Alves da Costa*


Não tem pra onde correr. Mesmo aquilo que se aproxima da pureza, da inocência, da castidade, ainda assim sempre haverá alguém falando mal, inventando coisas, deturpando a honra e a imagem.
Não adianta, é instintivo na maioria das pessoas falar mal de todo mundo. Quando não há o que falar inventa, quando não tem o que inventar escolhe uma qualificação qualquer: idiota, metida a besta, só quer dar uma de santa puta...
As armas que esses donos da vida dos outros possuem são as mais inteligentes e diversificadas possíveis. Se fossem usadas para o bem talvez até fossem laureadas com o Nobel do processo de elevação do outro pela palavra.
Verdade é que possuem um verdadeiro arsenal verbal, um linguajar bélico comparável às grandes potências mentirosas. E daí surgirem as fofocas, as redes de intrigas, as falsidades, as aleivosias, os rumores e boatos, as calúnias e as tão difundidas mentiras.
Tudo para usar contra inimigo algum, pois a pessoa ultrajada muitas vezes é colocada mil vezes no lamaçal sem saber ou sentir. Todo mundo sabe e comenta que ela não presta, não vale nada, é vagabunda ou coisa parecida, mas na presença da ofendida nada é dito, nada é ao menos ventilado.
Pelo contrário, a pessoa é elevada a uma categoria de respeito e consideração sem precedentes. E isto porque a falsidade, a canalhice, o embuste, tem o máximo de cuidado para preservar suas vítimas. É como se endeusassem para depois difamar, jogar na lama, sorrir da situação.
Desse modo são tratadas uma infinidade de pessoas, das mais altas às mais baixas classes sociais, das metrópoles e dos interiores de rua e beco, dos moradores das mansões aos sobreviventes nas palhoças.
Os objetivos são sempre os mesmos, que são os desonra pura e simples, mas os meios para se alcançar os fins é que sempre se modificam, dependendo também das características próprias da pessoa que será covardemente atingida.
Dizem que Cotinha é a sonsice em pessoa. Em casa a mãe implora para se desarnar, para ser mais alegre, para sair e se divertir. E ela finge que não, que sua vida é pra religião e futura beatice. Mas quando sai é fila de homem e ainda não dá pra quem quiser. È o que dizem, sem que a pobre coitada jamais tenha arrumado um namorado.
Espalham que Dorinha saiu à mãe, não presta. Como a mãe faz com o pai, chifrando a torto e a direita, a mocinha faz o mesmo com o namorado. E o babaca parece cada vez mais apaixonado por ela. É o que espalham, sem que nem a mãe nem a filha saibam dessa história e jamais tenham dado motivo para qualquer palavra de desonra.
Não tem boca que ainda não falou nem ouvido que ainda não ouviu que Dorivalda derrubou barriga de homem casado. Engravidou e foi tirar na cidade aquilo que seria a desonra familiar. Da família, porque ela mesma não vale o que o gato enterra. É o que se comenta na cidade sobre a solteirona que até virgem é.
E Querubina? Vixe Maria, dessa aí nem se fala. Não tem ninguém que suporte ela, sua falsidade, seu jeito esnobe, sua mania da riqueza sem ter nem o que vestir. E o pior é que faz amizade com todo mundo e depois fica por trás metendo o pau, botando mau gosto em tudo. Mas seria até bom se Querubina ao menos sonhasse que falam isso dela pelas calçadas e janelas, aí neguinha ia ver o que era bom pra tosse.
E assim o povo vai preservando e espalhando sua infame cultura da desonra, do denegrir a imagem do próximo, do desqualificar até rebaixar de vez quem ainda possui moral e procura conviver com dignidade. Os caluniadores não pensam em si mesmos nem tem medo dos castigos divinos porque já foram excluídos de qualquer respeito na vida.
Aliás, o respeito mandou notícias e diz que está cada vez mais longe, distante, muito distante.



Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com





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