NO REINO DO REI MENINO – III
Rangel Alves da Costa*
Lucius, o novo soberano do Reino de Oninem, passou toda a infância e juventude aprendendo as artes de reinar, do poder e da dominação. Antes mesmo que seu velho pai falecesse já exercia, de fato, tal mister, demonstrando grandes virtudes e qualidades.
Procurou casar cedo e escolheu tomar como esposa uma bela jovem, herdeira de um reino falido que havia sido incorporado ao do seu pai. Se chamava Lize a futura rainha. Ao contrair núpcias, numa cerimônia de grande pompa e suntuosidade, sempre procurou demonstrar um jeito meigo de ser, porém com uma altivez própria das pessoas que nascem e vivem toda uma vida em palácios e castelos.
Com o passar dos anos, cuidando somente dos seus afazeres próprios de rainha, jamais procurou interferir nos assuntos do reino nem conflitar com as decisões tomadas por seu esposo. Por isso mesmo é que o tempo lhe conservava bela, porém com um aspecto cada vez mais triste, com um semblante que denunciava a tristeza de quem ainda não havia conseguido engravidar, fecundar um menino ou menina que lhe fizesse companhia e mais tarde assumisse os destinos do reinado.
A própria população do reino vivia preocupada com a falta de um herdeiro. Depois de anos de casamento, já era tempo de a rainha presentear a todos com um forte rebento. Que fosse até mesmo menina, desde que tivesse no sangue a coragem sempre demonstrada pela família. Como conseqüência dessa constante preocupação, as preces eram muitas, as promessas eram rotineiras e a fé do povo buscava sempre uma solução rápida para o caso.
Verdade é que todos foram ouvidos pelas forças divinas. O rei Lucius anunciou a gravidez da esposa numa grande festa, onde estavam convidados todos aqueles que quisessem participar. Foram dois dias de muita cantoria, comida e bebida. Festividade maior ainda somente quando o soberano soube que o herdeiro que iria nascer era do sexo masculino, um varão para continuar a linhagem da casa de Onimem.
Quando o pequenino nasceu, numa bela manhã de primavera, todo o reino dava, cada um ao seu modo, as boas vindas ao príncipe e futuro soberano, se as forças superiores assim permitissem. No castelo e nos arredores tudo era uma festa só. Inebriado de alegria, o rei determinou que naquele mês todos estariam isentos de pagar as obrigações para com o reino, os homens poderiam se exceder na bebida e as mulheres poderiam reivindicar aquilo que quisessem perante os auxiliares do rei.
Diuturnamente sob a proteção da mãe, o pequenino divertia-se sem a mínima noção do que estava acontecendo ao redor, do seu significado para a vida do reino, de como seria a sua vida a partir dali e das muitas responsabilidades que passaria a ter para o resto de sua existência.
Não era somente um menino bonito, saudável e forte, era a encarnação da história familiar, de uma estirpe, e o suporte a ser trabalhado para mais tarde continuar dignificando o destino do reinado e daquele povo. Por tudo isso, o que se verificava era uma situação singular, onde parecia que o Reino de Onimen já estava, desde aqueles momentos, na dependência do menino. E o nome desse menino era Gustavo, e se as glórias assim permitissem, futuro rei Gustavo.
Já pelo fim das comemorações pela chegada do menino, enquanto um grupo de camponeses bebericava suas últimas forças e esse fulgor alcoólico fazia da boca de cada um festim de frases e palavras desconexas, porém todas no sentido de tentar reafirmar sobre o espetacular desenvolvimento do reino e as muitas conquistas que seriam obtidas dali por diante, um sóbrio senhor com muitas marcas da idade que estava nas proximidades observando e ouvindo tudo, aproximou-se do grupo, pediu cordial licença e disse umas palavras, que mais tarde soariam como verdadeira revelação:
- Nunca esperem demais daquilo que acham que tem demais, pois quando for o momento da necessidade só a um caberá a fartura, que é ao próprio rei. O rei nos abandonará e fugirá com o que tem assim que um reino mais audacioso nos ataque. Ele sabe que um reino não vive só de festas e de bebedeiras, mas sim e principalmente de soldados e guerreiros que o defendam até a morte, se for preciso. E ele também sabe que não conta mais com a força militar que tinha antes, com as estratégias que tinha antes, com toda aquela preponderância que tinha antes. E quando o reino cair, cairemos todos escravizados, a menos que uma velha profecia se cumpra, que é aquela que diz que somente um rei menino nos salvará.
continua...
Advogado e poeta
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