Quando estive lá...
Rangel Alves da Costa*
No final de novembro de 2008, por uma dessas circunstâncias em que a morte fica atentando contra a vida, comecei a me sentir indisposto, fui buscar atendimento médico numa unidade emergencial de saúde e só lembro que estava com dificuldades de respirar em cima de uma maca, rodeado por enfermeiros e médicos, e depois apaguei de vez. De lá fui transferido com urgência para a UTI do Hospital João Alves Filho, onde fiquei durante treze dias em estado de coma induzido.
Nessa época eu tinha 45 anos e esse ano irei completar 47. Tudo isso ocorreu bem próximo ao período natalino e quando recebi alta pude acompanhar ainda a vida festiva que é o final de ano, entre o natal e a virada. E nesse último final de ano, quando completou um ano dessa experiência que me foi imposta pelo destino, não me permiti exagerar comemorações por estar vivo, não fiquei mais triste por recordar o que passei e o que alguns sofreram comigo, não fiquei mais pensativo e reflexivo porque os momentos a isto convida. Apenas pautei minhas tardes de solidão para buscar respostas para uma simples indagação: Por que Deus me permitiu continuar aqui?
Sou agraciado por Deus, sou; a mão divina estava sob o meu leito, sei; Ele não deixou que eu partisse, sim. Mas por que meu Deus? Ele bem sabe que a minha religião mora somente em mim, que a minha fé se expressa somente através da igreja no meu coração, que não preciso de outras religiões, outras igrejas e as muitas fé que se compra barato. Ele sabe e conhece a minha bíblia, vê quando minhas rudes mãos procuram o Salmo 23, quando meus olhos leem Josué, se encantam com Enclesiastes, prolongam-se fixamente na oração que o Senhor nos ensinou.
Por tudo que me fizeste, desde a minha raiz sertaneja até o momento presente, é que preciso Te encontrar para agradecer, para Te dar um abraço, para Te convidar a morar eternamente ao meu lado, dentro da minha igreja, e é por isso mesmo que vivo trilhando os caminhos da minha inabalável religião em meu ser, da minha fé própria, da minha igreja/coração cada vez mais persistentemente. Continuo cada vez mais procurando, mas sinto na alma Tua presença cada vez mais forte, mais próximo e dentro de mim. Estás aqui, sei, ao meu lado, e é por isso mesmo que irei Te procurar ainda, cada vez mais, sempre, porque também sei que minha vida se tornará vã sem essa contínua busca.
Minha amizade contigo talvez tenha se fortalecido naqueles treze dias em que eu estava viajando, em coma, pelas brumas da indecisão entre o voltar ou caminhar para cada vez mais longe. Não tenho certeza, não sei, não pude ver, mas a intuição me diz que me chamastes a sentar embaixo duma árvore frondosa, onde conversamos por todos aqueles dias e me ensinastes um monte de coisas que não posso nomear com palavras. Me chamava de filho, me falou sobre a vida e, para que eu não pudesse esquecer daquelas lições, me ordenou novamente a viver.
Quem dera todo irmão sertanejo ser tudo que eu sou e ter tudo que eu tenho. Fui moleque correndo pelos campos, caçando passarinho, jogando bola de gude, soltando pião. Fui e continuo estudante da vida, trilhando pelos caminhos da História e do Jornalismo e hoje atuando como advogado. Sou poeta, pintor, sonhador, tenho livro publicado e outros ainda a serem. Tenho os meus, tenho quem amo, tenho precisão de ter mais. Mas também tenho aqueles dias na minha vida que são mais do que tudo. Neles é que Viestes a mim e Dissestes: Dou-te ainda a vida para que mereças tê-la.
E diria mais: “Enquanto viveres, ninguém te poderá resistir; estarei contigo como estive com Moisés; não te deixarei nem te abandonarei”, pois “Isto é uma ordem: Sê firme e corajoso. Não te atemorizes, não tenhas medo, porque o Senhor está contigo em qualquer parte para onde vás.” E diria muito mais, sei, porque Ele é meu amigo.
Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com
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