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terça-feira, 13 de outubro de 2009

O cangaço na vida de Poço Redondo

Texto: Alcino Alves Costa (O caipira de Poço Redondo).

Ao contrário dos que garantem e afirmam ser o cangaço um flagelo que teve seu início por volta de 1870, pode-se afirmar com segurança que ele surgiu nos campos do sertão nordestino desde os idos do Brasil Colonial.

O cangaço e as secas foram os grandes flagelos dos povos sertanejos. Todo o nordeste se rendeu aos horrores daquela tenebrosa sociedade do crime. A seca dizimava os campos e a vida pastoril. O cangaço fazia nascer e florescer brutais criminosos, mestres do bacamarte e do clavinote. Alguns desses sanguinários matadores se tornaram célebres personagens da história sertaneja. Estão nos livros as aventuras de Inocêncio Vermelho, João Calango, Jesuíno Brilhante, Né Dadu, Sinhô Pereira, Luiz Padre e aquele que foi a sua maior e mais luminosa estrela: Virgulino Ferreira da Silva – Lampião.

Em se estudando o cangaço não se pode desconhecer uma verdade pura e cristalina que é aquela de se verificar que essa epopéia nordestina legou o seu povo a um terrível sofrimento, uma provação sem precedente e que varou anos e mais anos, só vindo ter fim na histórica chacina de Angico, no Riacho do Tamanduá, conhecido famosamente como Riacho do Angico, em Poço Redondo, local onde morreram Lampião, Maria Bonita, e ainda, nove de seus companheiros.

Pode-se atestar, com toda convicção, que o cangaço, através da sanha perversa e homicida do cangaceiro, e até das volantes do governo, eram pestes que só traziam dores e sofrimentos para os povos catingueiros.

Nada neste mundo se compara ao sofrimento e agonia que viveu a nossa indefesa gente cabocla, vivendo, por tão longos anos, a mercê daquela turba sanguinolenta que sentia especial prazer em judiar, esfolar e matar as pobres, desvalidas e desafortunadas famílias caipiras.

Cangaceiro e soldado achavam-se os senhores da vida e da morte dos que habitavam as terras dos cafundós dos sertões.

Positivamente, cangaço e volante foram desgraças que enlutaram o povo sertanejo. Que os digam as 83 mortes acontecidas no Estado de Sergipe, sendo 69 delas acontecidas no Sertão do São Francisco. Infelizmente, o nosso sofrido e heróico Poço Redondo teve a desventura de ver suas terras empapadas pelo sangue de 55 pessoas assassinadas pelas armas bandoleiras e pelos soldados de volante.

Os tempos de Lampião causaram estragos irreparáveis na vida do homem do campo. O flagelo do cangaço foi o responsável pela perda total da tranqüilidade e paz do simplório campônio que viu estupefato e indefeso o seu mundo sertanejo preso, dominado, oprimido e torturado pelos senhores do crime e pelos senhores da lei, tão ferozes como aqueles.

O sangue sertanejo embebeu a terra cabocla de Poço Redondo. Desesperada e indefesa, a população do lugarzinho de China deixou suas casas e se jogou pelo mundo, não ficando uma só família, um só morador naquela abandonada e triste povoação. O êxodo foi total. Por duas vezes – 1932 e 1937 – essa diáspora do povo de Poço Redondo aconteceu. As ruas e praças ficaram abandonadas, nelas não se via um ser humano. As taperinhas com suas portas e janelas abertas e os animais silvestres descansando em seus telheiros, sem nenhum receio de serem atacados pelos caçadores. Os pebas e tatus faziam suas moradias nas salas, varandas, quartos e cozinhas das casas desertas. Quem visse Poço Redondo estava vendo um cenário de dor e infinita tristeza.

Fugindo da maldição daqueles terríveis tempos, os tempos do cangaceiro e das volantes, os habitantes de Poço Redondo deixaram o seu mundo amado e foram viver em outros lugares, principalmente Canhoba, Telha, Propriá e a então Serra Negra do tenente João Maria de Carvalho.

Essa comovente aventura conhecida como “As carreiras” é um marco glorioso na história de Poço Redondo que após a morte de Lampião viu seu povo retornar e refazer o seu lugarzinho tornando-o com o andejar dos anos um lugar de respeito e destaque em todo Sertão do São Francisco.

Filho do sofrimento e da pobreza, mesmo assim, a coragem e a fé dos filhos e habitantes de Poço Redondo fizeram-no um grande e considerado município que é um dos fortes pilares do Sertão do São Francisco e de Sergipe.

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